ARTIGO CIENTÍFICO

O café agroecológico produzido na região serrana de Baturité, Ceará

The agroecological café produced in the serrana region of Baturité, Ceará, Brazil

Sofia Regina Paiva Ribeiro1; Maria do Socorro Moura Rufino2

1Mestra em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis, Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Redenção-CE. E-mail: sofiarpr@gmail.com; 2Doutora em Fitotecnia pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido, com estágio no Exterior em Bioquímica da Nutrição no Dept. de Metabolismo e Nutrição, na Espanha; Docente Permanente do Mestrado Acadêmico em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Redenção-CE. E-mail: marisrufino@unilab.edu.br

Recebido para publicação em 23/05/2018; aprovado em 10/09/2018

Resumo: O café produzido na região serrana do Maciço de Baturité é apreciado por ser agroflorestal, arábico, livre de agrotóxicos, características estas que resultam num alimento mais nutritivo. Nesse espaço geográfico, o cafeeiro encontra-se consorciado com outras culturas, contribuindo para a fertilização do solo, a contenção de pragas e o equilíbrio ecológico. Para os agricultores familiares, utilizar a agrobiodiversidade é uma forma de trabalhar os arranjos produtivos locais respeitando as variedades e a variabilidade de animais, plantas e microrganismos da região. Nesse foco, o presente trabalho busca analisar a produção do café agroflorestal na região, mais precisamente nos municípios de Baturité, Mulungu e Guaramiranga, por meio de uma abordagem histórico-social.  O estudo contempla os critérios teórico-metodológicos da pesquisa bibliográfica exploratória, com constatações in loco através de observações participativas. O recorte temporal para análise em campo abrange o segundo semestre de 2016 e o primeiro de 2017, considerando diferentes temporalidades para o estudo bibliográfico. Pode-se inferir que a cafeicultura em sistema agroflorestal na região é praticada levando em consideração a sabedoria acumulada sobre conservação e uso dos recursos naturais, feita em área com restrições legais, favorecendo impactos positivos para o meio ambiente, através do viés extrativismo sustentável, segurança alimentar e geração de renda.

Palavras-chave: Agroecologia; Café arábica; Sustentabilidade.

Abstract: The coffee produced in the mountainous region of Maciço de Baturité is appreciated because its agroforestry, arabic and free of pesticides, characteristics that result in a more nutritious aliment.  In this geographic space, the coffee tree is consorted with other cultures, contributing to the environmental balance, the fertilization of the ground and the containment of plagues.  For local producers, to utilize agrobiodiversity is a way to work the local productive arrangements respecting the varietys and variability of regional animals, plants and microorganisms. In this focus, the present work seeks to analyze the production of agroforestry coffee in the region, more precisely in the municipalities of Baturité, Mulungu and Guaramiranga, through a historical-social approach.  The study covers the theoretical and methodological criteria of bibliographical research with findings in loco through participatory observations.  The temporal cut-off covers the second half of 2016 and the first half of 2017, whereas different temporalities for the bibliographic study. It can be inferred that coffee production in an agroforestry system in the region is practiced seeing the knowledge acumulated about conservation and use of natural resources, made in an area with legal restrictions, favoring positive impacts on the environment by the bias sustainable extractivism, food security and income generation.

Key words: Agroecology; Arabica coffee; Sustainability.

INTRODUÇÃO

No Brasil, em sua extensão territorial encontra-se a maior biodiversidade do planeta, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2010). Com terras férteis e clima favorável, a base econômica brasileira está historicamente voltada para a agricultura. Dentre os gêneros agrícolas produzidos, o café tem destaque, apresentando-se o Brasil como o maior exportador e o segundo maior consumidor do produto, culminando numa movimentação financeira de cerca de R$ 7 bilhões ao ano (ABIC, 2015). Tamanha a presença desse produto no nosso meio que o café é a segunda bebida mais consumida no país, perdendo apenas para a água (EMBRAPA, 2015).

O desenvolvimento da cultura cafeeira se entrelaça com a própria história do País, dado o seu significado histórico-social e econômico. O café chegou ao Brasil em 1727, através do Sargento Francisco de Mello Palheta, que trouxe da Guiana Francesa mudas e sementes da planta para a cidade de Belém (Pará), espalhando-se gradativamente em várias regiões.

No Ceará, foi introduzido no século XVIII, na Serra da Meruoca e, a partir de então, foi difundido para outras localidades, constituindo-se uma importante cultura para o estado (REVISTA CAFEICULTURA, 2009). Nesse contexto, a região serrana do Maciço de Baturité, localizada no sertão central cearense, destaca-se como uma importante produtora de café há quase dois séculos. As primeiras mudas da planta chegaram ao Maciço de Baturité em 1822, vindas de Pernambuco (CATÃO, 1937; GIRÃO, 2000). Devido à rentabilidade econômica e à elevada produtividade, a região veio a tornar-se, tempos depois, a maior produtora de café do Estado.

Em 1850, o “Ceará foi responsável por mais de 2% das exportações brasileiras de café, sendo esse considerado internacionalmente de excelente qualidade" (CEARÁ, 2005, p.1). Há relatos de que o produto, naquele período, era um dos mais apreciados nas cafeterias francesas (ROMERO; ROMERO, 1997).

De acordo com o contexto histórico, o café foi responsável pelo auge econômico da região, tornando-se o “ouro” do Maciço, impulsionando o crescimento da cidade e a construção dos ricos casarões e a formação do patrimônio histórico e arquitetônico local (FERREIRA, 2006). Contudo, foi introduzido em monocultura a pleno sol, com técnicas rudimentares de desmatamento e queimada, contribuindo para a retirada da mata nativa, a baixa quantidade de matéria orgânica e a disponibilidade de nutrientes do solo (DEAN, 2004; FEITOSA et al., 2013).

Os impactos negativos ao meio ambiente foram devassos, afetando a biodiversidade faunística e florística. A prática agrícola inadequada favoreceu à diminuição da matéria orgânica e interferiu na disponibilidade de nutrientes no solo, ocasionando um alto nível de degradação e, consequentemente, a queda na produção. Dessa forma, vivenciou-se o paradoxo: a atividade bem-sucedida e lucrativa e impactos negativos tanto para o meio ambiente como para a economia local. As matas foram sendo reduzidas para a cultura do café, este foi tendo sua produção também sendo diminuída por conta do envelhecimento dos cafezais e desgaste do solo (LIMA, 2000).

Paradoxalmente, o café que outrora trouxera riqueza, emprego e renda para a região serrana de Baturité, avocou também transformações na paisagem e degradação ambiental. O método predatório de produção agrícola tornou-se insustentável e foi sendo substituído, gradativamente, pela agricultura sombreada entre o final do século XIX e primeira metade do século XX.

A solução ecológica foi fruto da observação empírica dos pequenos produtores rurais ao constatarem que os cafeeiros que se encontravam sob a copa das árvores não perderam sua capacidade produtiva. Dentro dessa abordagem, pode-se destacar que os pequenos agricultores passaram a utilizar a agrobiodiversidade e a biodiversidade associada.

A primeira consiste em imitar os processos biológicos estabelecidos na natureza e pode ser compreendida como a parcela da biodiversidade utilizada pelo homem na agricultura (BRASIL, 2006). Na segunda, as abelhas e pássaros são atraídos pelas árvores e propiciam a polinização, controle de pragas e insetos indesejáveis. Para Ricketts et al. (2008), os cultivos agrícolas localizados próximos a fragmentos de mata apresentam maiores índices de visitação às flores e de diversidade de polinizadores.

Nesse contexto, a cafeicultura na região serrana vive em equilíbrio com o meio ambiente. Segundo Sérgio Parreiras Pereira, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas,

a cafeicultura no Maciço de Baturité é uma das poucas no Brasil em sistema agroflorestal tradicional e orgânico. O café é cultivado sob a sombra de árvores da Mata Atlântica contribui para melhoria da qualidade do grão e evita a ocupação e exploração desordenada dos recursos naturais (EMBRAPA, 2011, p. 1).

Com essa nova forma de plantio, surgiram benefícios ecológicos como a formação de microclimas, longevidade e sustentabilidade em decorrência da gradativa recuperação do solo, que melhorou nas suas condições físicas, químicas e biológicas. Assim, o café serrano que já era apreciado pela sua qualidade - 100% arábico (Coffea arabica L.), passou a ser mais estimado por vivenciar uma agricultura em sistemas multifuncionais eficientes e duradouros.

Conste-se que as localidades em estudo são centenárias na produção cafeeira e tem similares condições de plantio, colheita, beneficiamento e comercialização do café, que é feita de forma artesanal pelos pequenos produtores rurais.

Dessa forma, o presente estudo objetivou compreender a influência da produção do café agroflorestal para a região serrana do Maciço de Baturité tanto pelo viés ecológico como socioeconômico.

MATERIAL E MÉTODOS

O presente trabalho classifica-se como exploratório e descritivo, contempla os critérios teóricos-metodológicos da pesquisa bibliográfica exploratória, com constatações in loco e observação participante.

Localização e caracterização da área em estudo

A Serra de Baturité, na região do Maciço de Baturité, com coordenadas geométricas extremas entre 4°08’ e 4°27’ de latitude sul e 38°50’ a 30°05’ de longitude oeste (Figura 1), “representa um enclave úmido de floresta serrana no contexto semiárido do estado do Ceará (FRACALOSSI JÚNIOR, 2000).

É cediço que a vegetação é o espelho do clima e do solo. Nesse contexto, as boas condições hidroclimáticas da região justificam-se pela ação combinada da altitude e pela ação dos ventos oriundos do Oceano Atlântico. Seu relevo condiciona maior concentração de precipitações, procriando o desenvolvimento de solos mais profundos, a fixação da floresta úmida e drenagem (FREIRE; LIMA, 2014). Pondere-se, ainda, que, além das chuvas convencionais, é possível vislumbrar “precipitações ocultas” como o orvalho e o nevoeiro que mantêm a umidade e evitam a evapotranspiração. As potencialidades regionais hidroclimáticas serranas de Baturité representam um ambiente de exceção no contexto geoecológico regional.

Figura 1. Localização da Serra de Baturité, Ceará

Fonte: Luciana Martins Freire, 2018

Acredita-se que o topônimo Baturité vem do idioma tupi e significa “serra verdadeira”, uma referência ao fato da floresta ser perenifólia: “plantas que mantêm as suas folhas durante todo o ano, propiciando a proteção e umidade dos solos, promovendo a decomposição de materiais orgânicos” (FREIRE; LIMA; 2014), ao contrário da caatinga, que se trata de um conjunto vegetacional adaptado à seca, espinhoso, que perde suas folhas periodicamente (CAVALCANTE, 2005). Quanto a abrangência serrana, Nascimento et al. (2010, p. 20) ressaltam que:

O enclave úmido da Serra de Baturité contempla integralmente as áreas dos municípios de Guaramiranga (59 km2), Pacoti (112 km2), Aratuba (143 km2) e Mulungu (135 km2). Abrange também parte dos Municípios de Baturité, Capistrano, Palmácia e Redenção (NASCIMENTO et al., 2010, p. 20)

Nesse contexto geográfico, optou-se por analisar as práticas agrícolas voltadas para a cafeicultura em três regiões serranas que possuem as seguintes coordenadas geográficas: Baturité (Latitude: 04º 19' 43" S; Longitude: 38º 53' 05" W); Guaramiranga (Latitude: 04º 15' 48" S; Longitude: 38º 55' 59" W) e Mulungu (Latitude: 04º 18' 20" S; Longitude: 38º 59' 47" W) (IPECE, 2009).

Procedimento metodológico e análise de dados

O delineamento da pesquisa apoiou-se em duas fases: análise bibliográfica e visitas in loco. A primeira contempla os critérios teórico-metodológicos da pesquisa bibliográfica exploratória, fazendo-se uma seleção de material pertinente à temática. Nesse passo, dialoga-se com alguns autores e estudiosos acerca da atividade cafeeira em sistema agroflorestal na região serrana de Baturité; atenta-se para a sua relevância histórico-social e ambiental na região; levanta-se a questão da agricultura familiar em área de proteção ambiental, dentre outros. O referencial teórico apoia-se nos postulados de autores como Veiga (1995), Wanderley (2001), Alcântara (2009), Ross (2009) dentre outros.

Dentro da pesquisa documental e eletrônica foram catalogadas várias informações, com destaque para os dados obtidos no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA, no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas - SEBRAE, na Associação Brasileira da Indústria de Café – ABIC. No acervo normativo consultado, destacam-se as Leis 9.985/2000, 10.831/2003 e 11.326/2006.

No segundo momento, o estudo foi concebido através de um trabalho de campo, desenvolvido de forma intermitente, em três localidades serranas remanescentes da cafeicultura de sombra: o Sítio Caridade dos Jesuítas (Baturité), o Sítio São Roque (Mulungu) e a Fazenda Floresta (Guaramiranga). Segundo Gil (1999) e Rúdio (2002), a observação é a aplicação dos sentidos humanos para obter informações sobre determinados aspectos reais. Rúdio (2002) ainda afirma que esse método é um dos meios mais frequentes para conhecer pessoas, coisas, fenômenos e acontecimentos.

Foram realizadas excursões de campo entre o segundo semestre de 2016 e o primeiro semestre de 2017, período em que ocorreram os registros das práticas agriculturais. O contato direto com os atores sociais e seus contextos culturais permitiu compreender o modelo de produção do café agroflorestal nas dimensões produtiva, ecológica e econômica, onde o consórcio de plantas, a biodiversidade associada propiciam uma agricultura sustentável a longo prazo.

Dentre os dados catalogados, estão informações colhidas do acervo pessoal cedido pela família de alguns produtores, tais como documentos e jornais com relatos históricos e fotográficos. Nesses moldes, a pesquisa funde-se numa perspectiva histórica e socioambiental. Conhecer a produção cafeeira sombreada em sistema agroflorestal é uma forma de valorizar e disseminar a agricultura sustentável praticada pelos pequenos produtores rurais, visto que o café sombreado se tornou um marco na preservação ambiental na região.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A agricultura familiar, sustentabilidade e meio ambiente

As regiões serranas também são denominadas de brejo ou enclave e fazem referência à umidade que concentram e às baixas temperaturas presentes nessas áreas, constituindo-se fatores propícios à atividade agrícola (ANDRADE-LIMA, 1964). As informações obtidas revelam essa realidade, pois, segundo dados da Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE (2016), a principal atividade de fixação do homem na Serra de Baturité tem sido a agricultura.

De acordo com os dados do IBGE (2016) presentes no livro “A Geografia do Café”, a produção familiar de café arábica no Nordeste é pouca expressiva em termos de volume produzido, ao mesmo tempo chama atenção para a especificidade do café produzido nos microclimas da região serrana de Baturité, cujas plantas são sombreadas para protegê-las da forte insolação. Trata-se de sistema agroflorestal praticado, na grande maioria, por pequenos agricultores. Nesse cenário, a maioria das propriedades rurais serranas estão na posse de agricultores familiares (SEBRAE, 2017). Assim, além da família de ser dona da terra, ela é responsável pelo trabalho desenvolvido em sua propriedade (WANDERLEY, 2001). A Lei nº 11.326/06 (BRASIL, 2006), em seu artigo 3º, evidencia que:

Agricultor familiar e/ou empreendedor familiar rural é aquele que pratica atividades no meio rural, possui área de até quatro módulos fiscais, utilizando predominantemente mão-de-obra da própria família, renda familiar vinculada ao próprio estabelecimento e gerenciamento do estabelecimento ou empreendimento pela própria família (BRASIL, 2006).

Cabe explanar que a dimensão de um módulo fiscal varia conforme local onde está localizada a propriedade. Na região em comento, essa unidade tem a dimensão de 20 ha (INCRA, 2017). De acordo com o Censo Agropecuário realizado em 2006, dos estabelecimentos agropecuários brasileiros, 84,4% pertencem à agricultura familiar (IBGE, 2006). Esse sistema de agricultura é o locus mais indicado para a consolidação de um novo padrão de produção agrícola pautada em conhecimentos agroecológicos acumulados ao longo dos anos. É uma opção sustentável que utiliza que resgata alguns elementos da agricultura tradicional (VEIGA, 1995; ALTIERI, 1998).

Voltando-se à cultura em estudo, por situar-se num espaço geográfico de terras férteis, é possível encontrar cafeeiros centenários e produtivos em meio a vegetação serrana, Mata Atlântica (FERNANDES, 2015). Essa realidade é constatada nas localidades em estudo: Sitio São Roque, Sitio Caridade e Fazenda Floresta, locais pioneiros na prática agrícola em sistemas rurais biodiversos, compostos de vegetação nativa e lavouras comerciais.

Dessa forma, diferente da plantação em monocultura, é preciso um olhar atento para vislumbrar os cultivares de café que se encontram sob a copa de várias espécies nativas centenárias, como o camunzé (Pithecellobium polycephalum). Essa cultura permite o consórcio com outras plantações. De acordo com a SEMACE (2010), a região serrana possui condições climáticas únicas, com características gerais de floresta tropical úmida. Não obstante as condições geoambientais favoráveis, a produção do grão ocorre em pequena escala, visto que a região tem uma topografia acidentada com aclives e declives acentuados.

Entretanto, os fatores limitadores são compensados pela produção de um café que é procurado pelos consumidores em razão dos seus atributos naturais, o que implica na valorização do produto, propiciando um preço justo. “O café de sombra é aproximadamente de 30% a 40% mais caro do que o comum” (CEARÁ, 2005, p. 16).

O sistema de consórcio oferece mais segurança alimentar às famílias dos agricultores, permite o melhor aproveitamento da área, reduz a presença de plantas daninhas, controla o processo erosivo e contribui para a economia local por meio da venda do excedente. São fruteiras (bananeiras, abacateiros), feijão, milho, mandioca, chuchu, dentre outros que são cultivados em paralelo para complementar a renda do agricultor. Sem resíduos tóxicos, esses produtos agregam maior qualidade nutricional e biológica, ao passo que atendem aos princípios inerentes ao paradigma da sustentabilidade: ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável.

O café recebe um olhar especial. Em 2007, os agricultores da região foram contemplados com a primeira fábrica de torrefação de café exclusivamente ecológico do Ceará, instalada na cidade de Mulungu, uma iniciativa do Centro de Educação Popular em Defesa do Meio Ambiente - CEPEMA, através do “Projeto recuperação, conservação das florestas nativas e antropogênicas” (REVISTA CAFEICULTURA, 2007).

Segundo Carvalho (2008), os pequenos produtores, até então, tinham de vender o café in natura ou levá-lo para beneficiamento em Fortaleza, a cerca de 120 km, fato que acarretava alto custo. Agora com a fábrica, os cafeicultores passaram a beneficiar, torrar, moer e embalar o grão na própria região. Sem dúvida, houve um estímulo à agricultura familiar dentro da perspectiva da agricultura ecológica. Nair (1989) e Young (1991) relatam que as práticas agroflorestais estão relacionadas ao nível tecnológico de manejo e as características socioeconômicas e ambientais, apresentando uma dinâmica própria.

Nas localidades em estudo, o sistema agroflorestal pertence à categoria do sistema silviagrícola, que consiste na combinação de árvores e arbustos com espécies agrícolas (NAIR, 1993). Essa forma de plantio, também conhecida como “floresta produtiva”, contempla o tripé: eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica (JACOBI, 2000). Outra peculiaridade desse ambiente diversificado é a biodiversidade associada, onde abelhas e pássaros são atraídos pelas árvores e propiciam a polinização, controle de pragas e insetos indesejáveis. Os morcegos, segundo relato dos serranos, têm um papel fundamental para expandir o cafeeiro em meio a mata nativa, pois ao alimentar-se do fruto deixam cair sementes que logo germinam.

Os cafeicultores passaram a vivenciar, então, uma agricultura balizada na filosofia do uso sustentável da terra através de sistemas multifuncionais eficientes e duradouros. Segundo dados do Conselho dos Exportadores de Café (CECAFE, 2017): características como solo adequado, altitude, amplitude térmica e clima são determinantes para a qualidade da bebida que vai às xícaras.

De acordo com os dados da SEMACE (2016), essa prática produtiva alicerçada no respeito à natureza se consolidou e adequou-se ainda mais com a proteção formal da região serrana por meio legal, em decorrência da criação da Área de Proteção Ambiental.

A Área de Proteção Ambiental e a relação com a cafeicultura

De acordo com o contexto histórico, os anos de 1950 foram considerados o período áureo da cafeicultura na região do Maciço de Baturité (SOUZA, 2008). Naquela época se colhia na Serra de Baturité um café arábico reconhecido internacionalmente, que enriqueceu muitos produtores rurais. A cidade de Baturité, localizada no sopé da serra com o mesmo homônimo, a 100 Km de Fortaleza, foi uma das mais ricas do estado no período do ciclo cafeeiro. Entretanto, após a produção em massa, a cafeicultura sofre declínio em razão de medidas políticas nacionais.

Em meados dos anos 1960, boa parte do parque cafeeiro cearense foi destruído por iniciativa do Programa de Erradicação de Cafezais estabelecido pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC) com o intuito de diminuir o excesso de produção nacional. Já na década de 70, as mudanças conjunturais levaram a um novo plano governamental: o Programa de Renovação e Revigoramento de Cafezais, que impulsionou o replantio dos cafeeiros no Ceará.

Entre 1971 e 1977, 6.156.700 novos pés foram plantados na tentativa de suprir ao menos parte de seu consumo interno. O acesso aos subsídios, entretanto, estava condicionado à utilização da tecnologia proposta pelo IBC, de cultivo a pleno sol (SAES et al., 2002).

Esse fato culminou com uma malsucedida prática agrícola e, em poucos anos, já não havia praticamente mais um pé de café plantado no sistema de pleno sol na região (SAES et al., 2002). Como a região está localizada muito próximo a linha do Equador (pouca mais de 4º Latitude Sul), o sol é impiedosamente escaldante, tornando-se necessário a adoção de sombreamento para a lavoura cafeeira (REVISTA CAFEICULTURA, 2011). Esse fato geográfico não foi levado em consideração na época. Assim, em meados do século XX, a produção do café no estado representava menos do que 0,1% do total produzido pelo Brasil (IBGE, 1996).

Nesse contexto, a insustentabilidade do sistema convencional de plantio e a necessidade de expandir a produção cafeeira repercutiu na criação da Área de Proteção Ambiental (APA) de Baturité, que envolveu diretamente as políticas de erradicação de cafezais e substituição de cafezais sombreados por cafezais a pleno sol. Segundo Durán (1998):

O agravamento do quadro ambiental da serra de Baturité na década de 70, após a falência do programa de erradicação do café sombreado promovido pelo IBC, um significativo número de produtores da região, provocou a reação de um segmento dos proprietários de terras da serra. O grupo de pressão que deu início ao movimento para a criação da APA de Baturité (DURÁN, 1998).

Conforme exposto, um grupo formado por veranistas de alta renda e cafeicultores locais, que não aderiram ao programa de erradicação, como é o caso das três localidades em estudo, deram início a um movimento (em meados da década de 80), que culminou com a criação da primeira e mais extensa Área de Proteção Ambiental criada pelo Governo do Estado do Ceará, instituída através do Decreto Estadual Nº 20.956, de 18 de setembro de 1990 alterado pelo Decreto nº 27.290, de 15/12/2003, abrange uma área de 32.690 hectares e localiza-se na porção Nordeste do Estado, na região serrana do Maciço de Baturité (BRASIL, 2010).

Em consonância com o Ministério do Meio Ambiente - MMA, dentre os objetivos que nortearam a formação da APA pode-se destacar: proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (BRASIL, 2000, p. 9). Consoante os dados do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC (BRASIL, 2000), a APA é constituída por terras públicas e privadas, classificada como de uso sustentável, ou seja, é permitido o desenvolvimento de atividades econômicas, desde que sejam voltadas para produção de base ecológica.

Desta feita, junto com a prática do café sombreado, em sistemas de produção agroecológico, surgiu também a consciência ambiental, fruto da necessidade da continuidade cafeicultura em sistema orgânico de produção. Impende destacar, nesse momento, a Lei nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, que dispõe sobre o tema em foco, da qual extraímos trechos in verbis:

Art. 1o Considera-se sistema orgânico de produção agropecuária todo aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica [...] (BRASIL, 2003).

Nesse sentido, verifica-se que o conceito está em consonância, também, com os princípios básicos da permacultura, que se fundamentam no respeito as peculiaridades ambientais, propiciando a conservação e o uso racional dos recursos naturais (MOLLISON; SLAY, 1998). Conste-se que a prática agroecológica era realizada antes da região torna-se unidade de conservação. Entretanto, é notório que a criação da APA trouxe um novo “ingrediente” para o café, a preservação ambiental. É interessante esclarecer que, mesmo tornando-se a área serrana uma unidade de conservação, ela é classificada como de uso sustentável, ou seja, é possível desenvolver atividades agrícolas, desde que a produção tenha base ecológica e seja respeitada a normatização ambiental.

Agora com a execução da legislação vigente, evita-se o retorno de práticas agrícolas inadequadas que comprometam os recursos naturais, tanto no contexto atual como a longo prazo. Parafraseando Ross (2009) a humanidade para sobreviver precisa de uma base agrícola sustentável e um manejo ético no uso da terra.

A cultura cafeeira no Maciço: uma linha no tempo

A Serra de Baturité é uma das regiões com maior índice pluviométrico do Estado do Ceará, o que favorece/viabiliza a produção agrícola. Na floresta úmida, o convívio de ipês, orquídeas, samambaias, musgos e hepáticas modela uma floresta possuidora de enorme fitodiversidade (CAVALCANTE, 2005).


Figura 2. Vista aérea da Serra de Baturité, Ceará

Fonte: CEARÁ, Secretaria de Turismo do Estado do Ceará (2016).

Essas características ambientais foram essenciais para a inserção da cultura cafeeira na área serrana de Baturité e, consequentemente, para o desencadeamento dos núcleos urbanos, através do agronegócio que, sabidamente, tem uma relevância geopolítica, histórica e econômica para o país. Urge frisar que “o Brasil não reconhece o Ceará como produtor de café, no sentido de quantidade de café, porém, quando se considera o café sombreado o Ceará é referência na produção” (CEARÁ, 2005, p. 16). Para Ferreira (2006), o café foi responsável pelo auge econômico da região, tornando-se o “ouro” do Maciço, impulsionando o crescimento da cidade, a construção dos ricos casarões e a formação do patrimônio histórico e arquitetônico local. Hoje, todo esse legado é aproveitado pelo turismo.

A título de sintetizar organizadamente fatos importantes, procedeu-se a uma investigação documental, realizou-se diálogo com os produtores rurais e fez-se consulta a arquivos pessoais dos agricultores, o que trouxe à tona um relato sobre a relevância econômica, ambiental e social da cultura cafeeira para a região do Maciço após a implantação do café em sistema agroflorestal (Tabela 1).

Tabela 1. Impacto econômico, ambiental e social da cafeicultura em sistema agroflorestal na região do Maciço de Baturité, Ceará

Variáveis

Resultado

Extrativismo Sustentável

-Menor impacto ambiental


-Conservação da biodiversidade



Sistema agroflorestal


-Consórcio de plantas: bananeira, cana-de-açúcar, Milho, feijão mandioca, chuchu, dentre outros.


-Biodiversidade associada: abelhas e pássaros são atraídos pelas árvores, flores e frutos.


-Recuperação das propriedades físicas do solo.


-Diminuição de poluentes nas fontes da água.



Tratos Culturais e Manejo

-Fertilização natural: proveniente dos húmus decorrentes de resíduos vegetais.


-Controle natural de pragas/doenças e insetos indesejáveis.


-Ciclagem de nutrientes, aumento do teor de matéria orgânica e equilíbrio entre os componentes vivos e não vivos do solo.


-Poda da parte aérea das plantas: cobertura de solo e incremento da matéria orgânica.



Importância econômica



-Instalação da fábrica de café ecológico.


-Geração de emprego e renda.


-Etapas de produção e beneficiamento nas localidades.


-Turismo rural: “Rota do Café Verde”.


-Estação Ferroviária de Baturité.


-Associativismo: APEMB e COMCAFE.

Atentando ao exposto, é possível constatar que a cafeicultura sombreada na região serrana favoreceu a convivência harmoniosa entre homem e a natureza, um dos princípios da agrobiodiversidade. Para Primavesi (1988, p.) “O mineral que a planta retira do solo e transforma em substâncias orgânicas volta a ser mineral, fazendo novamente parte do solo, num ciclo misterioso de vida e morte”.

Convém evidenciar que a prática de estratégias que se apoiem em um manejo sustentável dos agroecossistemas, o respeito à sabedoria ancestral e à consciência ambiental surgiram da necessidade de manter a produção cafeeira. Como dito no intróito deste trabalho, a cultura foi introduzida inicialmente com base na cadeia produtiva em sistema monocultural, mas ao longo dos anos sofreu intervenções/adaptações nas formas de plantio e manejo, passando por instabilidades econômicas e políticas, pacotes governamentais de erradicação e renovação do plantio que culminou com a oscilação de preço e queda da produção.

As informações históricas retratam que o advento da Estação Ferroviária de Baturité foi um marco para o desenvolvimento econômico, histórico e social para região, pois o trem trouxe mobilidade e reforçou as relações comerciais entre interior e capital (MAGALÃES, 2003).

Para viabilizar o escoamento da produção de café para a capital Alencarina, que era realizado, até então, pelas precárias estradas da época, foi construída a via férrea. Segundo Magalhães (2003, p. 141), “O trem viria impulsionar mais ainda o motor da economia, representada pelas exportações de café cultivado, sobretudo, no Maciço de Baturité”.

A estação ferroviária foi desativada em 2013. Hodiernamente, as instalações são destinadas ao Museu Ferroviário de Baturité, onde se mantém um acervo que reúne peças arquitetônicas do início do século XX. O local faz parte da “Rota do Café Verde”, um programa do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), uma iniciativa com foco no turismo ecológico e sustentável, objetivando o resgate histórico-cultural do café na região, o crescimento econômico no meio rural e o desenvolvimento sustentável, com base no tripé: paisagens naturais, saberes locais e produção agroecológica (SEBRAE, 2016).

Para dar visibilidade e melhor comercializar a produção local, os agricultores uniram-se através do associativismo que, de acordo com Abdo, Valeri e Martins (2008), é uma alternativa sábia para vencer as dificuldades da cadeia produtiva, que vai desde a obtenção de sementes até a entrega do produto ao consumidor. Nesse espírito de grupo, foram criadas: a Associação dos Produtores Ecologistas do Maciço de Baturité (APEMB), em 1996 na cidade de Mulungu, e a Cooperativa dos Cafeicultores Ecológicos do Maciço do Baturité (COMCAFE), em Guaramiranga.

O associativismo propiciou, através da Fundação Cultural Educacional Popular em Defesa do Meio Ambiente (CEPEMA), a instalação da fábrica de café ecológico (em 2007), viabilizando a certificação e a exportação da produção. Referindo-se ao assunto, Alcântara (2009) assevera que a certificação permitiu agregar valor ao produto, trazendo benefícios ecológicos, econômicos e sociais para os produtores da região.

De acordo com os dados da Revista Cafeicultura (2007), com a instalação da unidade de agroprocessamento, o pequeno produtor rural pode: torrar, moer e embalar o café na região. Esse marco confere o título de primeira fábrica do Brasil a produzir somente café ecológico. Além da fábrica, várias ações foram implementadas visando resgatar a base histórica do café e fortalecer a cadeia produtiva, dentre elas, destaca-se o turismo sustentável. Nesse contexto, vale constar o papel do SEBRAE regional de Baturité que, em parceria com as prefeituras, produtores rurais e comerciantes locais, busca fortalecer o empreendedorismo não só no setor agrícola, como também na gastronomia, hotelaria e eventos culturais.

O café foi protagonista no desenvolvimento da região do Maciço de Baturité, ao passo que influenciou na construção das vias de acesso à Capital, na arquitetura e na geração empregos, agregando valores ecológicos, econômicos e sociais (EMBRAPA, 2011). É certo que, ao longo da sua história, passou por períodos áureos e críticos em reflexo às medidas políticas e econômicas adotadas pelo governo, porém superou todas essas intempéries e, ainda hoje, sobrevive, com menos expressividade, mas com sinais de uma nova ascensão.

O café da serra, como é conhecido, vem, a cada ano, destacando-se no conceito dos apreciadores e experts dessa bebida (REVISTA CAFEICULTURA, 2007). Some-se a este fato a tendência dos agricultores em revigorar os plantios. Fato constatado através dos estudos bibliográficos e visitas in loco no Sítio Caridade dos Jesuítas, Sítio São Roque e Fazenda Floresta.

Uma análise comparada permite inferir as similaridades existentes entre as culturas, as produções e as técnicas de manejo empregadas, todas elas voltadas para a questão da preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável. As particularidades ficam por conta das etapas de beneficiamento e o destino da produção, os quais são concretizados individualmente pelos proprietários, mitigando o associativismo que outrora prevaleceu fortemente e marcou com êxito a história do café serrano.

O Sítio Caridade, Sítio São Roque e Fazenda Floresta: características

Em Baturité, cidade-pólo da região do Maciço, está localizado o Mosteiro dos Jesuítas, um importante ponto turístico e religioso, que contrasta com o verde da serra, tornando-se um dos cartões postais mais conhecidos do Ceará. Trata-se de uma antiga Escola Apostólica da Companhia de Jesus, uma casa de formação para os jovens. Inaugurada em 15 de agosto de 1927, foi construída em pedra tosca e está localizada a 4 km da sede do município (LEAL, 1981).

É importante reiterar que a edificação se tornou, a partir de 1963, um ambiente de retiro religioso, hospedagens, eventos e congressos. O visitante do mosteiro passa a conhecer tanto o contexto histórico-religioso do local como a relação dos Jesuítas com o cultivo do café ecológico e a preocupação com a preservação ambiental.

A sua localização permite, em sentidos opostos, contemplar uma vista panorâmica do Maciço do Baturité e do Sítio Caridade. Este último está encravado no topo da serra e é responsável pelo fornecimento de água para a casa de repouso e toda a comunidade circunvizinha, através de tubulações que jorram o líquido apenas pela força da gravidade. Ali também se concentram os cultivares de café centenários, ora estudados, que estão inseridos em meio a vegetação nativa.

De acordo com os relatos históricos, o café foi plantado com o intuito de abastecer apenas o mosteiro. No entanto, a plantação expandiu-se de forma natural e hoje sua produção é vendida para os frequentadores do mosteiro e para a população local. Dentre outras peculiaridades do Sítio Caridade, ressalta-se a beleza singular e as limitações naturais, tais como aclives e declives acentuados, o que torna o local pouco visitado e explorado pelo homem.

Outra cidade serrana que tem sua história entrelaçada à cultura cafeeira é Mulungu, a justificar inicialmente pela nomenclatura das suas vias, como a Rua Cel Justino Café, em homenagem à tradicional Família Café, e pelos casarões históricos espalhados por várias partes do município, autênticos reflexos do período áureo da cafeicultura. O município, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2008), foi o maior produtor de café no Estado do Ceará; e em 2008 foi o responsável por cerca de 30% da produção estadual, o que representa 13.937 sacas de 60 quilos.

Dentre as localidades produtoras na região, encontra-se o Sítio São Roque, com que pertence à Família Farias desde 1913. O proprietário do sítio, um senhor com 92 anos, foi um dos fundadores APEMB e um dos pioneiros na produção do café sombreado na região. No local é produzido o Café São Roque, que teve selo de produto orgânico e foi exportado, 1996 e 1997, para Suécia. Trabalhar a agricultura de forma sustentável, respeitando o meio ambiente, é uma iniciativa também já abraçada pelos seus descendentes. Um ponto que chama atenção, de acordo com os relatos históricos dos nativos, é que boa parte das terras do sítio eram consideradas pouco produtivas. Depois da prática do sistema agroflorestal, o consórcio de plantas influenciou substancialmente no fortalecimento do solo (CEARA, 2005).

Outro local serrano dedicado ao cultivo do café é a Fazenda Floresta, localizada no distrito de Pernambuquinho, zona rural de Guaramiranga. Ali a cafeicultura está inserida há mais de um século, encontrando-se na terceira geração. O atual responsável, apesar de ter mais de 80 anos de idade, dedica-se diariamente para manter a tradição familiar do café sombreado. Viana, Dubois e Anthony (1996) ressaltam que as árvores utilizadas em associação com cultivos agrícolas, de maneira simultânea, favorecem a preservação do solo e o aproveitamento da radiação solar.

Dentre a características do local, pode-se ressaltar que o grão de café é beneficiado numa máquina de descascadora, inaugurada em 1945, ainda em atividade e em bom estado de conservação. Na propriedade é possível encontrar cafeeiros próximo à casa da família, o que permite vislumbrar os cafeeiros sem ter que deslocar-se. Além das árvores centenárias que ainda produzem café, o produtor está investindo em novos cultivares, através de um banco de mudas geneticamente diferenciadas, pois até então os cafeeiros nasciam de forma espontânea. Como preconizam Lopes et al. (2014), o sistema de produção de café agroecológico na Serra de Baturité está bem fundamentado num processo e desenvolvimento sustentável ambiental, tendo avançado com a sustentabilidade econômica e social.

Segundo Righi (2014), o sistema agroflorestal tem como base interações em que as condições climáticas, ambientais e fisiológicas são determinantes para o crescimento e o desenvolvimento de culturas.

Outra peculiaridade a ser evidenciada é que as colheitas são feitas de forma manual e seletiva, onde apenas os grãos maduros são colhidos. É a denominada “colheita a dedo” ou “catação”. Nessa prática, ganha-se na qualidade do produto, pois os grãos são mais uniformes e evita-se impurezas (PIMENTA et al., 2000). As etapas de secagem, torrefação, beneficiamento e embalagem nas referidas localidades seguem a mesma técnica, ou seja, com priorização da forma artesanal.

CONCLUSÕES

As três localidades em estudo produzem um café ecológico, agroflorestal 100% natural, sendo referência na região pela prática da agricultura sustentável, além de constituírem importante locais para refúgio de vários animais silvestres

No agroecossistema sob manejo agroflorestal não se pode olvidar das abelhas e pássaros que são atraídos pelas árvores e desempenham importantes serviços ambientais, como a polinização e o controle de pragas/doenças e insetos. À luz da problemática ambiental salienta-se que outro fator relevante para difundir a cultura agroflorestal foi a criação da Área de Proteção Ambiental, pois fortaleceu/aprimorou a prática produtiva que já era uma realidade na região.

A cafeicultura influencia o modo de vida da população, a paisagem e a cultura local. Tendo a possibilidade da concretização de forma harmônica da relação homem-natureza se, que se permite utilizar uma área de preservação ambiental sem agredi-la

AGRADECIMENTOS

À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FUNCAP pelo apoio financeiro e ao Grupo de Pesquisa: Polifenóis, antioxidantes e fibra dietética na saúde - POLIFIBAN/CNPq.

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