Educação Ambiental: composição química de águas minerais relacionados aos elementos da tabela periódica
Environmental education: the chemical composition of mineral water related to the elements of the periodic table
Adriana Tavares dos Santos1*, Priscila Tamiasso-Martinhon2, Angela Sanches Rocha3, Célia Sousa4
1Mestranda do Mestrado Profissional em Química em Rede Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Especialista em Ensino de Química e em Educação Ambiental, Licenciada em Química, Professora da Secretaria de Educação do Estado de Santa Catarina. drivares@yahoo.com.br; 2Doutora e Mestre em Físico-Química, Especialista em Educação de Jovens e Adultos na Diversidade e Inclusão Social e em Metodologia do Ensino na Educação Superior, Bacharel e Licenciada em Química, Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. pris-martinhon@hotmail.com; 3Doutora em Físico-Química, Mestre em Química, Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior, Bacharel e Licenciada em Química, Professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. angela.sanches.rocha@gmail.com; 4Doutora em Engenharia Metalúrgica e de Materiais, Mestre em Físico-Química, Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior, Química Industrial, Médica Veterinária, Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. sousa@iq.ufrj.br.
Recebido para publicação em 10/10/2018; aprovado em 02/11/2018
Resumo: A educação ambiental está entre os temas transversais que devem ser contemplados durante a escolarização. Uma maneira de abordar a educação ambiental é a interdisciplinaridade, relacionando os diferentes temas propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais aos conteúdos formais de cada disciplina. No presente trabalho, foram realizadas atividades pedagógicas em aulas de química, com objetivo de relacionar a composição química de águas minerais comerciais, de diferentes marcas, aos elementos da tabela periódica, de modo a promover o ensino de química integrado à educação ambiental. O público alvo foram alunos do nono ano do ensino fundamental, com idades entre 13 e 15 anos de uma escola da rede particular do Rio de Janeiro. A metodologia consistiu na apresentação das características da água potável, seguida da análise de rótulos de águas minerais comerciais, sendo que os alunos deveriam identificar os elementos e substâncias presentes, com as respectivas concentrações. Os argumentos que embasaram a análise discente dialogaram com referenciais teóricos epistemológicos previamente selecionados, com base na transversalidade e interdisciplinaridade. Os alunos relataram que nunca tinham observado anteriormente o rótulo de uma garrafa de água mineral, e, após a prática, perceberam a quantidade de informações presentes no mesmo, que remetiam ao assunto estudado na aula sobre a tabela periódica. O professor norteou uma discussão na qual foi feita uma correlação entre o local da fonte de água e sua composição química, dando ênfase à importância da preservação das fontes naturais e da variedade de diferentes águas minerais existentes, inerentes ao local no qual elas se encontram.
Palavras-chave: água potável; análise de rótulos; ensino de química.
Abstract: Among the transversal themes, environmental education is one that should be worked during scholar period. One way to address such matters is interdisciplinarity, relating the different themes proposed by the National Curricular Parameters to the formal contents of each discipline. In the present work, educational activities were carried out in chemistry class, in which the objective was relating the chemical composition of commercial mineral waters, of different producers, to the elements of the periodic table, in order to promote the teaching of chemistry integrated environmental education. The target audience were students of the ninth grade of elementary school, aged 13 to 15 years old of a school in the private network. The methodology consisted of the presentation of the characteristics of drinking water, then the analysis of commercial mineral waters labels, and the students should identify the elements and substances present, with their concentrations. The arguments that have supported the student analysis were talked to epistemological theoretical frameworks previously selected, based on cross-cutting and interdisciplinary. The students reported that they had never previously observed the label of a bottle of mineral water, and, after practice, they might perceive the amount of information present in it, that they referred to the subject studied in class about the periodic table. The professor has guided a discussion in which a correlation between the location of water source and your chemical composition was performed. The importance of preserving the natural sources was emphasized as well as the variety of mineral waters inherent to the site of the source.
Key words: drinking water; label analysis; chemistry teaching.
INTRODUÇÃO
A interdisciplinaridade proporciona ao discente a capacidade de atuar em resoluções de situações problemas do cotidiano, com temas transversais que contextualizam, por exemplo, saúde, meio ambiente, consumo e ética (BRASIL, 1997). Freire et al. (2011) destacam que no processo de ensino e aprendizagem o estudante deve ser levado a mobilizar constantemente seu conhecimento, realizando uma inter-relação contínua entre teoria e aplicação prática. Os temas transversais são caracterizados por não pertencerem especificamente a uma disciplina, mas sim por permearem diferentes áreas do conhecimento. Alguns temas são propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), desenvolvidos a partir do Plano Nacional de Educação (PNE), como uma alternativa para o desenvolvimento de planos de aula docente (BRASIL, 1998a; BRASIL, 1998b). Esses temas buscam desenvolver no corpo discente determinadas habilidades e competências. Os eixos temáticos, por outro lado, foram propostos de modo que o conhecimento científico seja vinculado à tecnologia e às questões socioambientais presentes na vida cotidiana, e que relacionam domínios convencionais da ciência com questões da atualidade, se aproximando desta forma da realidade do aluno. Para as ciências naturais, os eixos temáticos propostos são: vida e ambiente, ser humano e saúde, tecnologia e sociedade, terra e universo (BRASIL, 1998c). Assim, a ideia é incorporar as temáticas transversais ao conteúdo específico de química das aulas ministradas (GONÇALVES, 2016).
A proposta de transversalidade ainda provoca alguns debates do ponto de vista conceitual, principalmente em relação à concepção de interdisciplinaridade. Sob o ponto de vista de Augusto et al. (2004), a interdisciplinaridade envolve troca e cooperação na escola, de modo que exista uma real integração entre as disciplinas, tornando invisíveis as fronteiras existentes entre elas. Sob este ponto de vista interdisciplinar, o assunto é abordado independentemente dos domínios disciplinares. Por outro lado, a transversalidade envolve os assuntos que devem ser abordados de forma a desenvolver a capacidade de criticar dos alunos, sobretudo aqueles temas acerca da realidade social (MORAES, 2005).
Os PCN incluem os textos que são utilizados como referência por profissionais da área de ensino e eles indicam que existe diferença entre estes dois termos. Enquanto a transversalidade está envolvida com a dimensão didática, a interdisciplinaridade faz referência a uma abordagem epistemológica dos objetos de conhecimento. Entretanto, ambas pontuam a complexidade do real e a necessidade de se considerar a teia de relações entre os diferentes e contraditórios aspectos inerentes à vida. É responsabilidade do professor avaliar a melhor estratégia para que o aluno posso alcançar o desenvolvimento de habilidades e competências requeridas pelos PCN (BRASIL, 1998a).
No caso específico do ensino de química, para se alcançar uma melhor compreensão sobre os processos químicos que ocorrem na natureza, é relevante que se faça uma contextualização no âmbito da educação ambiental. Outra estratégia que também pode ser utilizada no âmbito tanto da interdisciplinaridade e da transversalidade, quanto da Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA), é o desenvolvimento de projetos temáticos, nos quais os alunos assumem uma postura ativa e crítica. Silva et al. (2013) apresentaram o resultado de uma experiência muito interessante usando projetos temáticos interdisciplinares no Ensino Médio, ligado a aulas de Química, e os autores verificaram ser possível romper com o ensino fragmentado e descontextualizado.
Esta vertente de educação ambiental se apresenta como sendo de extrema importância, pois se encontra muito presente no cotidiano discente, e contempla um olhar sobre a saúde de todos os seres vivos. Essa área de estudo engloba várias disciplinas, sendo, portanto, um tema que pode ser abordado de forma interdisciplinar, com o objetivo de compreender os fenômenos que ocorrem no meio físico e natural.
Nessa perspectiva compreender as informações presentes em rótulos de diferentes produtos de marcas diferentes, como por exemplo a água mineral, pode ser relevante, uma vez que a água é essencial para a vida do ser humano, devido à sua composição química, que inclui minerais, e características físico-químicas diferenciadas. Existem definições específicas para água, do ponto de vista do consumo. Segundo a resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), RDC n° 182, de 13 de Outubro de 2017, são adotadas as seguintes definições: (i) água captada: água superficial ou subterrânea (água bruta), que será submetida a processos físicos, químicos ou a uma combinação destes, visando à obtenção de água para consumo humano; (ii) água mineral natural: é a água obtida diretamente de fontes naturais ou por extração de águas subterrâneas, e é caracterizada pelo conteúdo definido e constante de determinados sais minerais, oligoelementos e outros constituintes, considerando as flutuações naturais; (iii) água natural: é a água obtida diretamente de fontes naturais ou por extração de águas subterrâneas, e é caracterizada pelo conteúdo definido e constante de determinados sais minerais, oligoelementos e outros constituintes, em níveis inferiores aos mínimos estabelecidos para água mineral natural, sendo que o conteúdo dos constituintes pode ter flutuações naturais; (iv) água para consumo humano: água potável destinada à ingestão, preparação e produção de alimentos e à higiene pessoal, independentemente da sua origem (ANVISA, 2017). Além dessas definições, as águas minerais possuem uma variada classificação, por exemplo, quanto a composição química tem-se as oligominerais (contém diferentes sais com concentração baixa), as radíferas (contém substâncias radioativas), e as radioativas (contém radônio dissolvido), outra classificação seria quanto as fontes radioativas, as toriativas e as sulfurosas, e quanto a temperatura temos as fontes frias, hipotermas, mesotermas e as isotermas.
No presente trabalho, o ensino de química e a educação ambiental nortearam atividades pedagógicas que foram realizadas para estimular nos alunos a capacidade de analisar e relacionar a composição química de águas minerais, de diferentes marcas comerciais, às suas propriedades físico-químicas e aos elementos da tabela periódica. O objetivo geral do trabalho foi contribuir para a construção do conhecimento de alunos do ensino médio de uma escola do Rio de Janeiro sobre os elementos da tabela periódica, estimulando a compreensão de que os elementos químicos estão presentes em diferentes substâncias de seu cotidiano, como a água mineral. Também se almejou estimular a capacidade destes alunos em analisar informações às quais eles estão expostos na vida diária, promovendo o desenvolvimento de seu senso crítico, por meio de uma atividade simples da leitura de rótulos de garrafas de água mineral e identificação de suas composições, de modo que eles tivessem um papel ativo na construção do conhecimento. Esta atividade também incluiu uma discussão sobre a relação entre o meio ambiente e a qualidade das águas de fontes naturais, sob um viés de promoção da educação ambiental no meio escolar.
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho é classificado como descritivo de cunho qualitativo, pois busca apresentar e analisar as práticas de ensino sobre tabela periódica, relacionadas à Educação Ambiental, em uma turma específica de alunos, no qual se preocupou com o processo e com a compreensão do assunto e sua relação com os aspectos ambientais sob o ponto de vista dos alunos. A pesquisa também é caracterizada como sendo um estudo de caso associado a um relato de experiência, pois visa à descoberta e à interpretação no contexto ambiental, além de mostrar a mudança de visão deste grupo específico de alunos sobre a importância da leitura de rótulos de produtos presentes em seu cotidiano.
As atividades didáticas foram realizadas com um público alvo composto por 18 alunos do nono ano do Ensino Fundamental, com idades entre 13 e 15 anos, de uma instituição privada, localizada no município do Rio de Janeiro. O trabalho foi desenvolvido com a anuência e apoio da escola. Neste sentido, vale ressaltar que o projeto político pedagógico da escola inclui a realização de atividades pedagógicas diversas facilitadoras do processo de ensino-aprendizagem, além de aulas expositivas, por este motivo os professores da instituição buscam incluir ferramentas didáticas em suas práticas docentes, como a utilizada neste trabalho.
As atividades pedagógicas foram aplicadas no âmbito de uma sequência didática composta na primeira etapa por quatro aulas expositivas dialógicas sobre os elementos químicos e a distribuição periódica dos elementos. Na última aula expositiva, os alunos foram convidados a se dividirem em grupos, sendo que cada aluno ficou responsável por levar para a aula uma garrafa de água mineral.
Na etapa seguinte, no dia da intervenção didática diferenciada, as garrafas de água levadas foram separadas por marcas e a professora apresentou aos alunos uma tabela contendo as especificações permitidas para as águas minerais potáveis, segundo a legislação brasileira (Tabela 1). Esta tabela foi impressa e distribuída para os alunos, antes que fosse realizada a análise de rótulos em sala de aula, de forma que todos pudessem acompanhar a discussão sobre as especificações básicas da água mineral.
Na sequência, os alunos foram instruídos a lerem os rótulos e anotar a composição química presente em cada um. Na própria aula, os alunos utilizaram os smartphones para pesquisarem na internet sobre o local da fonte de cada água comercial, sobre os componentes apresentados em cada rótulo, e sobre o significado das propriedades físico-químicas também informadas, anotando todas as informações coletadas.
A professora mediou todo o processo de análise de rótulos e de pesquisa realizados pelos alunos e, no final da aula, cada grupo apresentou seus resultados e realizou-se uma discussão sobre as diferenças das composições e as possíveis relações entre as fontes e as características das águas.
Tabela 1. Composição máxima permitida para certos elementos puros ou na forma de ânions permitida pela ANVISA para comporem água mineral (resolução - RDC Nº. 274, DE 22 DE SETEMBRO DE 2005). |
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Elemento |
Limite máximo permitido (mg/L) |
Elemento |
Limite máximo permitido (mg/L) |
Antimônio |
0,005 |
Chumbo |
0,01 |
Arsênio |
0,05 |
Manganês |
2,0 |
Bário |
1,0 |
Mercúrio |
0,001 |
Borato |
5,0 |
Níquel |
0,02 |
Cádmio |
0,003 |
Nitrato |
50 |
Cromo |
0,05 |
Nitrito |
0,02 |
Cobre |
1,0 |
Selênio |
0,05 |
Cianeto |
0,07 |
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Fonte: Portal ANVISA
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como a atividade didática diferenciada só foi realizada na aula seguinte às aulas expositivas, no primeiro momento discorreu-se sobre os elementos e íons que aparecem na referida regulamentação (Tabela 1), mostrando os elementos citados na tabela periódica exposta na sala. Esta etapa foi realizada para que os alunos identificassem que o assunto estudado na aula estava presente no cotidiano deles, ou pelo menos que tem influência em seu cotidiano, por se tratar de uma lei nacional regulamentadora. Também se discutiu que elementos ou substâncias são saudáveis se ingeridos em certas quantidades, mas que em excesso podem causar intoxicação, como sua falta pode gerar carência nutritiva. O exemplo citado foi da adição de iodo ao sal, para minimizar doenças da tireoide, e de flúor tanto à água quanto aos produtos de higiene bucal, para melhorar a saúde da boca.
A importância dos órgãos governamentais de regulamentação foi enfatizada e discutida com os alunos, pois se não existissem leis estabelecendo as substâncias que podem estar presentes em cada produto natural ou processado, bem como a devida fiscalização, compostos que causassem danos à saúde humana poderiam ser inseridos nestes livremente.
Na etapa seguinte, os alunos iniciaram a manipulação das garrafas de diferentes marcas e, portanto, com diferentes rótulos. Verificou-se que havia seis marcas diferentes de água mineral e, nos rótulos de algumas estava escrito água mineral, água mineral-natural e até mesmo água mineral com gás, e estas informações já causaram curiosidade nos estudantes.
Ao se utilizar garrafas de marcas diferentes para realizar a análise, fornece-se aos alunos a oportunidade de manipularem e criticarem a maneira como a qual as informações do produto estão expressas. Também se permite que eles observem a cidade e a região onde as fontes de água se localizam, o que também envolve geografia física e política. Verificou-se que as marcas eram dos estados de Minas Gerais, São Paulo e uma do Rio de Janeiro, o que indica que estes estados concentram as principais fontes naturais de água mineral no Brasil.
Todos os rótulos foram analisados pelos alunos e cada grupo anotou as informações de uma marca específica. A Figura 1 mostra a imagem de alunos analisando os rótulos de garrafas de águas minerais e anotando as informações coletadas, tanto individualmente quanto em grupo. Ficou claro que a atividade envolveu a colaboração entre os alunos, o que favorece para que se trabalhe a socialização e a capacidade dos indivíduos de resolverem problemas em grupo.
Figura 1. Alunos anotando as informações de alguns rótulos de água mineral.
Os alunos ficaram muito motivados para realizar a atividade, mostrando curiosidade e surpresa sobre a quantidade de informações que constavam nos rótulos, mas que eles nunca haviam percebido.
A leitura de rótulos como ferramenta didática no ensino de química é uma estratégia utilizada por alguns professores, cuja principal vantagem é abordar a química dentro de assuntos presentes no cotidiano do discente. A interpretação de rótulos de alimentos foi aplicada em aulas de química com alunos do 2° ano, demonstrando ser uma atividade motivadora e que despertou a integração entre os alunos (NEVES et al. 2009). Grochowski e Peres (2013) também utilizaram rótulos nutricionais para trabalhar conteúdos de ciências com alunos do 8° ano, mas este trabalho na verdade foi composto por várias atividades, incluindo experimentos e pesquisas, além da leitura de rótulos, e os autores concluíram que o processo de ensino-aprendizagem foi muito satisfatório, porque os alunos desempenharam um papel ativo na construção de seu conhecimento.
Os rótulos de medicamentos, alimentos e produtos de limpeza podem ser investigados no ensino de vários assuntos da química, de forma interdisciplinar envolvendo biologia e história, por exemplo, como atividade isolada ou atrelada a outras. Alves e Barbosa (2016) apresentaram o resultado de atividades envolvendo rótulos de vários produtos e embalagens com turmas do nível médio, e os alunos deveriam formular exercícios com base nas informações contidas nos rótulos. Os autores também verificaram que o interesse discente foi elevado, pois a participação foi grande e eles geraram muitas questões, que foram trocadas entre os grupos e discutidas, além de promover uma visão crítica.
Deste modo, os resultados obtidos no presente trabalho estão em acordo com vários outros encontrados na literatura aberta, principalmente no que tange ao incentivo da posição ativa do discente como ator em seu processo de aprendizagem e da colaboração com os colegas.
Retornando ao relato de experiência docente realizado neste trabalho, compilou-se os resultados da atividade envolvendo a análise de rótulos, e estes estão apresentados na Tabela 2. É possível observar que existe uma variação apreciável da composição das águas de diferentes marcas, com valores e natureza dos elementos presentes bastante diferentes. Durante a discussão destes resultados, os alunos foram estimulados a avaliarem se a composição tinha alguma relação com o local da fonte de onde a água era extraída.
A intervenção incluiu a observação de que a água de fonte mineral tem certas especificações e depende evidentemente destas fontes estarem ou não sujeitas a contaminação. Além do mais, dependendo do ambiente químico no qual estas águas se originam e também pelos quais elas passam, isto é, rochas e solos, podem ser mais ou menos ricas em determinados elementos sob diferentes formas. Por exemplo, estudos da literatura indicam que o teor mineral da água de diversas fontes brasileiras é baixo, sendo semelhantes ao de água da torneira, sendo que os íons cálcio e magnésio são os mais abundantes (REBELO, ARAUJO, 1999).
Outras características que os alunos também observaram nos rótulos foram o pH, a condutividade, o resíduo de evaporação e a radioatividade. Estas propriedades da água mineral também estão relacionadas com sua natureza físico-química e com a origem da água, sendo que estes aspectos também foram discutidos na sala com a mediação docente. Para embasar esta discussão também se utilizou os resultados de Rebelo e Araujo (1999) que indicaram que o consumo de água mineral natural não pode ser considerada nem como benéfica, para incorporação dos minerais, nem como maléfica, sendo que a maior importância da ingestão é para hidratação e estímulo do funcionamento dos rins. Levantou-se também o aspecto de que se a composição da água mineral tem correlação com o ambiente em que elas foram extraídas, isto é, a fonte natural, consequentemente, a deposição de poluentes próximo a corpos d´água pode causar contaminação destes. Sendo assim o descarte inadequado de lixo e efluentes, mesmo que sendo em ambiente sólido, como os lixões, pode contaminar lençóis subterrâneos que alimentam fontes naturais e tornar não potáveis fontes de água mineral.
A conscientização sobre a geração e descarte de lixo deve ser feita na escola, e metodologias que promovam a discussão tem um caráter de desenvolvimento de crítica mais acentuado. Desta maneira foi possível abordar em sala de aula que a química ambiental se encontra presente em alguns hábitos do nosso cotidiano, que neste caso específico foi a composição química da água mineral.
Tabela 2. Composição das águas minerais de diferentes marcas, coletadas pelos alunos em sala de aula a partir das informações dos rótulos. |
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Marca |
Local da Fonte |
Composição química (mg/L) |
Marca 1 |
Dona Euzébia (MG) |
Bicarbonato de sódio: 23,5; Sulfato de magnésio: 3,0; Cloreto de magnésio: 5,0.
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Marca 2 |
Campos de Jordão (SP) |
Bicarbonato: 105,78; Cálcio: 17,3; Magnésio: 9,78; Potássio: 1,44; Sódio: 1,16; Nitrato: 0,74; Cloreto: 0,18; Sulfato: 0,12; Fluoreto: 0,04; Bário: 0,03; Estrôncio: 0,018.
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Marca 3 |
São Paulo (SP) |
Bicarbonato: 7,27; Sódio: 1,904; Cloreto: 2,26; Cálcio: 2,69; Potássio: 0,960; Nitrato: 4,54; Sulfato: 1,12; Magnésio: 0,450; Estrôncio: 0,014; Bário: 0,018.
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Marca 4 |
Jacutinga (MG) e Itapecerica da Serra (SP) |
Bicarbonato: 8,33; Potássio: 1,22; Sódio: 1,42; Nitrato: 4,16; Cloreto: 0,60; Cálcio: 1,48; Magnésio: 0,66; Fosfato: 0,05; Fluoreto: 0,04.
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Marca 5 |
Carmo (RJ) |
Bário: 0,041; Estrôncio: 0,044; Cálcio: 4,613; Magnésio: 1,290; Potássio: 2,273; Sódio: 5,237; Sulfato: 0,65; Bicarbonato: 32,19; Fluoreto: 0,09; Nitrato: 2,50; Cloreto: 1,35.
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Marca 6 |
Passa Quatro (MG) |
Bicarbonato: 42,06; Cálcio: 5,336; Sódio: 10,337; Sulfato: 7,78; Potássio: 2,760; Cloreto: 1,52; Magnésio: 1,720; Fluoreto: 0,20. |
Outra observação importante, a partir das informações contidas na Tabela 2, é a forma pela qual a composição química das águas minerais é apresentada. Em todos os casos os fabricantes expressam as composições químicas como massa em mg do constituinte por volume em litro de água. No entanto, alguns constituintes aparecem como o elemento químico, como foi o caso de cálcio, magnésio e sódio, por exemplo. Estes elementos específicos se apresentam na água na forma de cátions, então são cátions Ca2+, Mg2+ e Na2+, enquanto o flúor e o cloro são apresentados como ânions cloreto e fluoreto (REBELO, ARAUJO, 1999). É importante discutir que, apesar de estar escrito sódio, na verdade o que se tem na água são íons sódio solvatados.
Alguns outros constituintes são oxoânios, como o sulfato, o nitrato e o fosfato, cujas fórmulas químicas são SO4-2, NO3- e PO43-, respectivamente, e são compostos, portanto, por mais de um elemento da tabela periódica. Este aspecto também foi abordado durante a aula. A água da Marca 1 foi a única que apresentou como composição apenas três sais diferentes, o bicarbonato de sódio, cloreto de magnésio e sulfato de magnésio, o que pode indicar que a fonte realmente gera uma água com baixo teor de sais ou que os métodos de análise química que a empresa utiliza não são suficientes para dosar outros componentes ou não tem precisão para análise de elementos de baixa concentração.
Nem toda água mineral é considerada potável, ou seja, própria para consumo e ausente de poluentes. O Governo Federal Brasileiro estabeleceu critérios de potabilidade da água em 1977, por meio de uma portaria do Ministério da Saúde, que inclui até mesmo os critérios de fluoretação da água para melhoria da saúde bucal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1977). No entanto, quando a água de fontes naturais está livre de contaminantes orgânicos, micro-organismos e não é salobra, em geral, pode ser consumida pelas pessoas.
Esta discussão mediada propiciou um momento no qual abordou-se vários conteúdos da química como os elementos químicos, íons, sais e os alunos identificaram estas informações químicas como estando presentes em suas vidas, portanto o conhecimento trabalhado foi aproximado às suas realidades.
CONCLUSÕES
A atividade pedagógica realizada foi enriquecedora e contribuiu para o aprendizado de química dos alunos que a vivenciaram, pois verificou-se que eles ao longo das discussões demonstraram ter se apropriado do assunto abordado.
Foi possível abordar e trabalhar os conhecimentos sobre os elementos químicos a partir da composição química da água mineral, e fazer os alunos reconhecerem que este conteúdo está presente na vida cotidiana de todos.
O tema “água mineral” foi satisfatório para realizar a atividade pedagógica, pois trata-se de um material presente no cotidiano dos alunos.
A atividade de leitura e discussão das informações dos rótulos contribuiu para a construção do conhecimento e compreensão dos alunos sobre a composição da água mineral e correlação com o assunto “tabela periódica”. Também se estimulou os discentes a analisarem os rótulos dos produtos que consomem de forma crítica e buscando identificar os benefícios e malefícios destes produtos.
AGRADECIMENTO
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. Ao Grupo de Pesquisa GIEESAA (Grupo Interdisciplinar de Educação, Eletroquímica, Saúde, Ambiente e Arte).
REFERÊNCIAS
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