ARTIGO CIENTÍFICO
Cultivo de milho crioulo para silagem em sistemas
tradicional e agroflorestal
Cultivation of landrace corn
for silage in traditional and agroforestry systems
Cultivo de maíz criollo
para ensilaje en sistemas tradicionales y agroforestales
Davi Moreira Matos1;
Silas Primola Gomes2; Amanda Cardoso Rocha3;
Andrezza Araújo de França 4; Maria Ivanilda de Aguiar5; Fred Denilson
Barbosa da Silva6
Recebido:
14/06/2019; Aprovado: 23/12/2019
Resumo: Avaliou-se a produção e a qualidade da silagem de
milho crioulo produzida no sistema no sistema agroflorestal (SAF) em comparação
ao produzido no tradicional (ST). O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com dois tratamentos e seis repetições. A
ensilagem foi feita em silos experimentais de laboratório. Foram realizadas
avaliações físicas e organolépticas (proporção de grãos, odor, cor, umidade e
tamanho de partícula), determinação dos parâmetros agronômicos (estádio dos
grãos, altura, número de folhas seca e peso das frações das plantas) e do teor
de matéria seca (MS). A altura das plantas variou nos sistemas ST e SAF, sendo 15,55%
superior no ST. No ST o componente colmo teve maior participação na massa da
planta (49,41%), seguido das folhas (25,96%) , superando
os valores obtidos no SAF. Os valores de MS no colmo (23,48%), folha (40,65%),
palha (37,73%), sabugo (31,63%) e grãos (32,28%) das plantas colhidas no ST
foram inferiores aos verificados no SAF, que apresentou, respectivamente para essas
frações 26,72, 59,37, 66,09, 44,30 e 43,04%. Os teores de MS das silagens de
milho (planta inteira) não diferiram entre os dois sistemas, sendo de 31,35%
para o ST e de 33,06% para o SAF, com teor médio de 32,2%. O cultivo de milho
no SAF apresenta menor potencial de produção da fração fibrosa (colmo e folhas)
do que no ST, porém verificou-se maior produção de grãos no SAF. A silagem
produzida apresentou teor de MS adequado em ambos os sistemas.
Palavras-chave: Ensilagem; Forragem; Zea mays.
Key
words: Ensilage; Forage; Zea mays
Resumen: La producción y calidad del ensilaje de maíz
criollo producido en el sistema agroforestal (SAF) se evaluó en comparación con
el sistema tradicional (ST). El diseño experimental fue completamente al azar,
con dos tratamientos y seis repeticiones. El ensilado se realizó en silos de
laboratorio. Se realizaron evaluaciones físicas y organolépticas, determinación
de parámetros agronómicos (etapa de granos, altura, número de hojas secas y
peso de fracciones de plantas) y del contenido de materia seca. (MS). La altura
de la planta varió en los sistemas ST y SAF, siendo 15,55% mayor en el ST. En
el ST, el componente del tallo tuvo una mayor participación en la masa de la
planta (49,41%), seguido de las hojas (25,96%), superando los valores obtenidos
en el SAF. Los valores de MS en el tallo (23,48%), hoja (40,65%), paja
(37,73%), mazorca de maíz (31,63%) y granos (32,28%) de las plantas cosechadas
en el ST fueron inferiores a los verificados en el SAF, que presentó, respectivamente
para estas fracciones, 26,72, 59,37, 66,09, 44,30 y 43,04%. El contenido de MS
de los ensilajes de maíz (planta completa) no difirió entre los dos sistemas,
siendo 31,35% para ST y 33,06% para SAF, con un contenido promedio de 32,2%. El
cultivo de maíz en el SAF tiene menos potencial para producir la fracción
fibrosa (tallo y hojas) del que en el ST, sin embargo,
hubo una mayor producción de grano en el SAF. El ensilaje producido mostró un
contenido adecuado de MS en ambos los sistemas.
Palabras
Clave: Ensilaje; Forraje; Zea mays.
INTRODUÇÃO
O milho (Zea
mays L.) é uma espécie de grande importância para a agricultura familiar por
sua versatilidade, apresentando diferentes tipos de uso na alimentação humana e
animal. É uma cultura de grande valor para as cadeias de produtos animais e
derivados (GIUNTI, 2016). Segundo Jobim e Nussio (2014), uma das formas de
destaque na utilização da cultura do milho na alimentação animal é na forma de
silagem, sendo a espécie mais utilizada devido seu elevado teor de carboidratos
solúveis e alta capacidade de fermentação, além de ser adequado à técnica e apresentar
simplicidade de cultivo, bons resultados na produção e boa qualidade do produto
final.
A técnica de ensilagem tem o objetivo de conservar a
forragem verde para uso posterior no período de seca, com o mínimo de perdas e
sem a formação de produtos tóxicos para o animal (BERNARDES; CHIZZOTTI, 2012).
No sistema convencional de produção, as plantas de milho cultivadas para
silagem são especificas para esse fim, existindo no mercado brasileiro grande
oferta de híbridos de milho, que são renovados e avaliados constantemente
quanto ao seu desempenho para obtenção dos melhores resultados (LUPATINI et al.
2004). Nesse sistema, as sementes de milho utilizadas são em sua maioria de
cultivares de híbridos transgênicos,
sendo muitas vezes inviáveis para os pequenos agricultores que utilizam menores
quantidades de insumos, possuindo limitações de produtividade nestas condições
além do fato de que os agricultores não poderem produzir e manter as sementes
dos híbridos para os próximos cultivos (GIUNTI, 2016).
Os sistemas de cultivo sustentáveis, que provocam
menos impactos ambientais e que produzam alimentos mais saudáveis, vêm ganhando
cada vez mais destaque mundial. Como exemplo de sistemas mais sustentáveis
podemos citar o agroflorestal, que busca explorar o sinergismo e as interações entre
os componentes arbóreos, as culturas agrícolas e o solo, através do planejamento
do manejo sustentável desses componentes ao longo do tempo (BALBINOT; VEIGA, 2010;
CARVALHO et al., 2014). Segundo Balbino et al. (2011), os sistemas agroflorestais
(SAF) consistem na utilização racional dos recursos naturais, possuindo menor
dependência de recursos externos, resultando em maior segurança alimentar e
econômica, sendo interessante para agricultura familiar, que utiliza os métodos
e práticas da agricultura tradicional, com pequeno uso de insumos externos. Araújo Filho (2013)
salienta que a vegetação lenhosa da caatinga adiciona ao solo toneladas de matéria
seca de folhas e galhos, tendo um papel fundamental na reciclagem de nutrientes,
além de cerca de 70% delas, participarem da dieta de bovinos, ovinos e caprinos,
sendo, portanto, essa vegetação excelente opção para comporem os SAF. Carpentieri-Pípolo et al. (2010) e Rosset et al. (2014) citam
que existem alternativas para solucionar problemas que o pequeno agricultor
enfrenta no sistema convencional, dentre as alternativas se destacam a produção
em sistema agroflorestal e o autoconsumo de sementes crioulas.
Do âmbito cultural, os agricultores familiares que utilizam
sementes crioulas nos seus sistemas de plantio, selecionadas por eles mesmos,
onde vegetais mais vigorosos permanecem para serem propagados futuramente, formam
um banco genético de materiais locais, aumentando a diversidade biológica. Estas
variedades de sementes crioulas apresentam rusticidade, se adaptam às diferentes
condições ambientais, como solos pobres em nutrientes, a diferentes condições sanitárias
presentes no seu local de origem, além de apresentarem elevada importância na conservação
e no melhoramento genético da espécie (CATÃO et al., 2010). Araújo et al. (2013)
destacam que o milho crioulo, adaptado às condições ambientais locais, é uma alternativa
produtiva para os pequenos agricultores e/ou de agricultura agroecológica, comparado
às cultivares modernas, dependentes de insumos e pacotes tecnológicos.
Existem diversos trabalhos de avaliações de cultivares
de híbridos comerciais de milho para silagem, em sistemas convencionais (LUPATANI,
et al., 2004; PAZIANI, et al., 2009; PEREIRA, et al., 2011). Porém, existem poucas
avaliações em SAF, utilizando variedades de milho crioulo para produção de
silagem, sendo encontrados trabalhos para produção de grãos e silagem em outros
tipos de sistemas alternativos de produção (MACHADO et
al., 2002; CARPENTIERI-PÍPOLO et al., 2010; GIUNTI, 2016).
O objetivo com este trabalho foi avaliar a produção e
a qualidade da silagem de milho crioulo proveniente do sistema agroflorestal em
comparação à produzida no sistema tradicional.
MATERIAL E
MÉTODOS
O experimento de campo foi conduzido na Fazenda Experimental
Piroás do Instituto de Desenvolvimento Rural da Universidade da Integração Internacional
da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), localizada na comunidade Piroás (04º14’53”S e 38º45’10” W) em Redenção – CE. As análises laboratoriais foram realizadas
nos Laboratórios de Bromatologia e de Sementes da UNILAB. A região apresenta
clima tropical quente Aw, conforme a classificação climática de Koppen, com estação
chuvosa com índices pluviométricos elevados no verão entre os meses de janeiro
a abril e estação seca no inverno, com pluviometria média de 1062 mm/ano, com
temperatura média de 26 ºC a 28 ºC . A vegetação caracteriza-se
como de transição entre a mata tropical e a vegetação da caatinga, sendo denominadas
de “Mata Úmida do Cristalino” e “Mata Seca do Cristalino” (MORO et al., 2015).
A área experimental estava anteriormente coberta por
vegetação nativa caraterizada pela presença de extrato herbáceo, subarbustos, arbustos
e vegetação arbustiva arbórea. O solo da região é classificado como Argissolo vermelho-amarelo,
bem desenvolvido e drenado, profundo, argila de atividade alta conjugada com
saturação por bases baixa (SANTOS et al., 2013). A análise do solo foi realizada antes da instalação do experimento
(Tabela1).
Tabela 1. Atributos
químicos de um Argissolo vermelho-amarelo em Piroás/Redenção, Ceará, na profundidade
de 0-20 cm |
|||||||||||
MO |
N |
P |
K+ |
Ca2+ |
Mg2+ |
Na+ |
H++Al3+ |
Al |
SB |
CTC |
V |
(g kg-1) |
(mg kg-1) |
-------------------------------------------(cmolc kg-1)------------------------------------------ |
(%) |
||||||||
16,16 |
1,15 |
11 |
0,24 |
5,40 |
1,60 |
0,35 |
1,82 |
0,05 |
7,24 |
9 |
81 |
Fonte: Departamento de ciências do solo – UFC. |
O primeiro sistema de cultivo caracterizou-se como um
sistema tradicional (ST), de baixo nível tecnológico, semelhante ao utilizado
pelos agricultores da comunidade, com uma área de 600 m². Previamente ao plantio
a área foi roçada, sendo removido o excesso de matéria orgânica, como galhos de
maior porte, sendo estes acumulados em linhas de leiras com espaçamento de 2 m entre
leiras. Já as folhas e galhos de menor porte foram mantidas cobrindo o solo de toda
áreas, sendo este manejo adotado nas duas áreas. Para o segundo sistema de
cultivo foi adotado o modelo de sistema agroflorestal (SAF) em uma área de 600 m²,
sendo a área preparada com a técnica de raleamento da vegetação nativa, seguindo
a metodologia de Araújo Filho (2013), preservando-se de 2 a 3 árvores a cada
100 m². Foram selecionadas e mantidas árvores nativas da caatinga, como exemplo
o jucá (Caesalpinia ferrea Mart. ex Tul.), sabiá (Mimosa caesalpiniifolia Benth.) e mororó (Bauhinia cheilantha Bong.). O experimento foi realizado
em delineamento experimental inteiramente casualizado, com dois tratamentos e seis
repetições cada.
A semente utilizada no cultivo foi uma variedade
crioula local, cedida pelos agricultores da comunidade Piroás. Estas sementes
foram selecionadas em seus roçados, a partir de observações, em que as sementes
das melhores plantas, mais vigorosas e com a melhor produtividade, são
armazenadas. A variedade cultivada é conhecida pelos produtores como “Milho Alto”.
A semeadura nos dois sistemas de produção foi realizada
no mês de fevereiro. No experimento foi utilizada uma linha de cultivo por repetição
e um total de seis repetições, tendo cada linha 15 m de comprimento com espaçamento
de 50 cm entre linhas e entre plantas, em ambos os sistemas.
Os parâmetros agronômicos foram avaliados quando o grão
alcançou o estádio R5, farináceo-duro, com aproximadamente 2/3 de parte sólida
e 1/3 de linha do leite, momento em que as plantas atingiram teor de MS em torno
de 30 a 35%, que estaria dentro dos valores preconizados por Jobim e Nussio
(2014), de 28 a 40% de MS, como adequados para boa fermentação da forragem no
silo.
A colheita do milho foi realizada no início do mês de junho
no ST e no meio do mês de junho no SAF. O corte das plantas foi realizado manualmente
a 10 cm de altura do solo, nas seis linhas centrais das repetições, desprezando
as linhas das bordaduras. No momento do corte foi realizada a medição da altura
das plantas, sendo escolhidas 5 plantas aleatoriamente, para estudo dos
parâmetros agronômicos. Estas tiveram suas frações separadas em colmo, folhas,
sabugo, grãos e palha, tendo cada componente sua massa determinada em balança
de precisão. A determinação do stay green
foi realizada levando em consideração a quantidade de folhas secas na planta,
sendo baixo (6-7 folhas secas), médio (4-5 folhas secas), alto (2-3 folhas secas).
Posteriormente, foi retirada uma amostra de cada componente para determinação
do teor de MS. Todo o restante do material foi picado com o auxílio de uma
forrageira picadeira estacionária, fazendo a regulagem dos discos de corte para
obter partículas com tamanho médio de 2 a 3 cm. Após a homogeneização da
forragem picada foram retiradas amostras de cada material para avaliações.
O material picado foi homogeneizado e ensilado em
silos experimentais de laboratório, feitos com tubos de PVC de 100 mm de diâmetro,
com 40 cm de comprimento, apresentando uma válvula do tipo Bunsen para o escape
dos gases. A compactação do material foi realizada manualmente com um bastão de
madeira. Quando os silos ficaram cheios foram fechados e devidamente vedados
com silicone. Os silos foram acondicionados em local fresco, arejado em temperatura
ambiente até o momento da abertura. Os tratamentos experimentais consistiam em silagem
de milho produzido no sistema tradicional (ST – 6 repetições) e no sistema
agroflorestal (SAF – 6 repetições).
A abertura dos silos ocorreu 60 dias após a ensilagem,
tendo sido a porção superficial, com 10 cm de comprimento, descartada e o
restante do conteúdo despejado em bandejas para homogeneização e divisão em 4
partes iguais, sendo que duas partes das diagonais foram coletadas em sacolas
plásticas para análise de MS e as outras duas para avaliações físicas e
organolépticas, por um avaliador treinado, com base em características físicas e
organolépticas: proporção de grãos, odor, cor, umidade e tamanho de partículas,
conforme metodologia proposta por Bernardes et al. (2012).
Na sequência, foram atribuídos pontos para cada
avaliação. Proporção de grãos (0 a 40 pontos), sendo 0 a 14 pontos para baixa
proporção de grãos (< 14%), 15 a 29 pontos para média proporção de grãos (15
a 35%) e 30 a 40 pontos para alta proporção de grãos (> 35%). Odor (0 a 28 pontos),
sendo o 0 a 10 pontos para odor indesejável, 11 a 23 pontos para odor aceitável
e 24 a 28 para odor desejável. Cor (0 a 12 pontos), sendo de 0 a 4 pontos a cor
indesejável, 5 a 8 pontos cor aceitável e 9 a 12 pontos para cor desejável. Umidade
(0 a 10 pontos), sendo 0 a 4 pontos para umidade elevada, 5 a 8 pontos para presença
de água livre e 9 a 10 pontos sem presença de água livre. Partículas (0 a 10 pontos),
sendo de 0 a 4 para partículas grandes e desuniformes, 5 a 8 pontos para
presença de partículas moderadamente grandes e 9 a 10 pontos para presença de
partículas pequenas uniformes.
Terminada a aplicação dos pontos, estes foram somados
e as silagens classificadas, de acordo com a pontuação final, como: excelente –
90 pontos ou mais; satisfatória – 80 a 89 pontos; moderadamente satisfatória – 65
a 79 pontos e insatisfatória – abaixo de 65 pontos. Também, foi avaliada a
presença de fungos (presença de material mofado), sendo a silagem com presença
de fungos classificada como insatisfatória, independente da pontuação final
obtida.
Para a análise de MS as amostras foram inicialmente pré-secas
em estufa a 65 ºC com ventilação forçada de ar em bandejas de alumínio por 72 h.
Após esse período as amostras foram trituradas em moinho de facas tipo Willey
em malha de 1 mm, identificadas e acondicionadas. Posteriormente foram secas em
estufa a 105 ºC por 16 h para determinação da MS (SILVA; QUEIROZ, 2002).
Os dados foram submetidos à análise de variância e a comparação de médias
pelo teste de Fisher a 5% de significância, utilizando o software SISVAR.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
A silagem obtida no sistema tradicional (ST) apresentou
resultado insatisfatório nas avaliações físicas e organoléptica, se destacando
a baixa proporção de grãos nas amostras em relação às amostras do sistema agroflorestal
(SAF) cuja silagem obtive conceito moderadamente satisfatória (Tabela 2).
Tabela 2. Avaliações físicas e organolépticas das silagens produzidas nos sistemas
tradicional (ST) e agroflorestal (SAF) |
||
Sistema |
ST |
SAF |
Proporção
de grãos |
13 |
26 |
Odor |
23 |
19 |
Cor |
10 |
7 |
Umidade |
10 |
10 |
Tamanho
de partícula |
7 |
8 |
Pontuação
aplicada1 |
63 |
70 |
Classificação1 |
Insat. |
Mod.. |
Insat.:
insatisfatória; Mod.: moderadamente satisfatória. 1Pontuação e classificação
segundo metodologia proposta por Bernardes et al. (2012). |
A silagem de milho de boa qualidade deve apresentar
odor agradavelmente azedo (aromático, lembrando pão), sem odores de álcool,
ácido butírico ou ácido acético e sem a presença de odores estranhos (JOBIM; NUSSIO,
2014). Deve apresentar ausência de bolores (mofo) ou cheiro de mofo ou outros
produtos de fermentação e a presença de fungos caracteriza a adoção de práticas
de manejo deficientes (SILVA et al., 2015). Estas características foram
observadas nas amostras de silagem do SAF, classificadas como moderadamente satisfatória
(Mod.), sendo um fator importante a maior proporção de grãos verificada. O SAF apresenta,
conforme relatado por Rosset et al. (2014), impactos benéficos principalmente sobre
a fertilidade do solo, como aumento na ciclagem de nutrientes, redução na lixiviação
e na erosão, diminuição na emissão de carbono e nitrogênio, sobretudo em função
da utilização mais eficiente destes nutrientes no sistema. Tais fatores podem ter
aumentando a disponibilidade de nutrientes para a planta, resultando em maior produção
de grãos.
As amostras do ST, classificadas como insatisfatórias (Insat.)
apresentaram baixa pontuação para proporção de grãos. Esse fato resultou em
baixa disponibilidade de carboidratos solúveis, resultando em pobre fermentação
da massa ensilada. Os carboidratos solúveis são utilizados como substrato para
a fermentação microbiana, produzindo ácidos orgânicos, principalmente o ácido
lático, que resultará na acidificação do meio, e consequentemente, na conservação
da forragem ensilada. Plantas com baixos teores de carboidratos solúveis tendem
a apresentar fermentação inadequada e produção de silagem de baixa qualidade (DEMINICIS
et al., 2014). Assim, as amostras classificadas como insatisfatórias apresentaram
fermentação inadequada em função da baixa disponibilidade de carboidratos
solúveis, resultado da baixa proporção de grãos nas plantas.
Nas amostras do SAF foram verificados, para a
característica odor, baixa pontuação, devido a presença de odor inadequado, o
que pode ser atribuído à problemas de enchimento do silo ou sua vedação, ou ao baixo
teor de carboidratos solúveis. Segundo McDonald et al. (1991) o cheiro alcoólico se dá pela existência do ácido
acético, subproduto da fermentação por Enterobactérias, podendo ser esta característica
decorrente do tempo para baixar o pH na primeira fase do processo de fermentação,
o qual é mais lento se houver baixa disponibilidade de carboidratos solúveis,
fato esse que pode ocorrer em função da baixa proporção de grãos presente na
massa. Como na silagem produzida no SAF verificou-se maior proporção de grãos, o
odor indesejável provavelmente ocorreu em função dos demais fatores relacionados
ao processo de ensilagem.
Constatou-se em algumas amostras do SAF a presença de fungos.
Segundo Silva et al. (2015), a presença de fungos na silagem pode acarretar problemas
sanitários aos animais. Estes autores destacam que a presença de fungos no material
ensilado é indesejável, em razão da produção de micotoxinas, que podem afetar a
estabilidade da silagem e degradam uma grande variedade de nutrientes,
carboidratos estruturais e lignina. A proliferação de fungos pode ser função de
pobre fermentação da silagem ou da vedação inadequada do silo (BERNARDES; CHIZZOTTI,
2012). Como a silagem produzida no SAF apresentou maior proporção de grãos e melhor
padrão de fermentação, a presença de fungos provavelmente ocorreu em função de problemas
na vedação dos silos.
No momento em que foi realizado o corte do material, média
de 120 dias após germinação, o estádio dos grãos estava farináceo no ST e farináceo
a duro no SAF (Tabela 3). Fontaneli et al. (2009) destacam que entre os
estádios de farináceo a duro os grãos de milho atingem um maior rendimento de
MS e melhor valor nutricional, alcançando de 30 a 35% de MS, o que favorece uma
boa compactação e fechamento do silo, melhorando as condições internas de
anaerobiose. Segundo Jobim e Nussio (2014) a colheita da planta do milho com
teores abaixo de 30% da MS resulta em baixa produção de MS, perdas de MS por
lixiviação e fermentação inadequada.
Tabela 3. Estádio dos grãos no momento da colheita, altura
da planta em metros, número de folhas secas e stay greenno
corte para silagem de milho no sistema tradicional
(ST) e no sistema agroflorestal (SAF) |
||||
Sistemas |
Estádio dos grãos |
Altura (m) |
Folhas secas |
Stay grenn |
ST |
Farináceo |
2,23 |
9 |
Baixo |
SAF |
Farináceo – duro |
1,93 |
13 |
Baixo |
Média |
- |
2,08 |
11,2 |
- |
CV (%) |
- |
9,17 |
33,55 |
- |
P* |
- |
0,02 |
0,15 |
- |
*Valores
de P < 0,05 diferem estatisticamente pelo teste de Fisher. |
A altura das plantas variou significativamente entre os
sistemas ST e SAF, com diferença de 15,55 % entre os dois sistemas (P<0,05).
O menor porte das plantas de milho no SAF pode estar relacionado ao sombreamento
exercido pelas árvores, uma vez que o milho sendo uma planta tipo C4
cresce e se desenvolve melhor em altas intensidades luminosas e altas
temperaturas. Segundo Mendes et al. (2013) o milho não tolera o sombreamento e
a baixa luminosidade pode afetar o seu desenvolvimento e por consequência, a altura
das plantas. Estes autores também observaram redução na altura das plantas do
milho cultivadas perto das árvores.
Em relação ao número de folhas secas, as plantas dos
dois sistemas apresentaram uma quantidade elevada, resultando um baixo stay grenn em ambos (P>0,05). Plantas
de milho que apresentam um alto stay
grenn dificultam o processo de ensilagem, pela redução do teor de MS na
planta. Desta forma quando os grãos apresentarem um ponto ideal de colheita, a
planta ainda estará com muita umidade, atrapalhando o processo de ensilagem.
Por outro lado, um baixo stay grenn é
caracterizado por alta velocidade de secagem, o que pode dificultar o uso do milho
em locais com limitações operacionais para a ensilagem (LUPATINI et al., 2004).
Para a participação em gramas das partes da planta no
material ensilado do ST, o componente colmo foi o que teve maior participação na
massa da planta (Tabela 4), seguido das folhas, havendo diferença destes dois
componentes entre os sistemas ST e SAF (P<0,05). A menor massa do colmo e
folhas no SAF pode estar relacionada com a influência negativa do sombreamento
das árvores nas plantas de milho, como citado anteriormente. Porém, em função da
maior proporção de grãos produzidos pelas plantas no SAF, a silagem produzida nesse
sistema apresentou melhor qualidade, como verificado na avaliação das características
físicas e organolépticas.
Tabela 4. Participação
em gramas das frações colmo, folhas, palha, sabugo e grãos na planta de milho
cultivada no sistema tradicional (ST) e no sistema agroflorestal (SAF) |
|||||
Sistemas |
Colmo |
Folhas |
Palha |
Sabugo |
Grãos |
ST |
504,32 |
264,94 |
68,11 |
66,37 |
117,01 |
SAF |
178,13 |
69,82 |
60,25 |
50,48 |
135,43 |
Média |
341,22 |
167,38 |
64,18 |
58,42 |
126,22 |
CV (%) |
32,42 |
38,06 |
41,78 |
42,83 |
61,27 |
P * |
0,005 |
0,003 |
0,622 |
0,30 |
0,69 |
*Valores
de P < 0,05 diferem estatisticamente pelo teste de Fisher. |
Não houve diferença entre os sistemas para os componentes
palha, sabugo (P>0,05). A palha e o sabugo apresentaram as menores frações
em ambos os sistemas (Figura 1).
Figura 1. Porcentagem das frações da planta no sistema
tradicional (ST) e no sistema agroflorestal (SAF)
A massa média total das plantas no ST foi de 1.020,80
g, mais do que o dobro do valor verificado para o SAF, que foi de 494,11 g. Os
grãos tiveram maior participação nas plantas colhidas no SAF (27,4%) do que nas
plantas colhidas no ST (11,46%). As menores quantidades observadas nas demais
frações, para o SAF, resultaram sobretudo, em baixa produtividade,
principalmente da fração fibrosa da silagem.
Ressalta-se que a colheita da área do SAF atrasou 15
dias em relação ao ST, pelo fato das plantas do SAF terem atingido o estádio de
maturação dos grãos mais tardiamente e por questões meteorológicas (ocorrência
de chuvas) no momento da colheita. Este atraso pode ter ocasionado maior
desenvolvimento das espigas neste sistema, e consequentemente, maior massa das
frações na colheita e a semelhança com a massa das espigas colhidas no ST. Tal
aspecto se comprova pelos teores mais elevados de MS encontrados nas frações da
espiga do SAF, em relação ao ST (Tabela 5).
Em relação aos teores de MS das frações e da silagem
de milho (planta inteira), o componente colmo diferiu (P<0,05), apresentando
teor de MS inferior no ST em relação ao observado para o SAF.
Tabela 5. Teor
de matéria seca (MS) do colmo, folhas, palha, sabugo, grãos e da silagem de
milho no sistema tradicional (ST) e no sistema agroflorestal (SAF) |
|||||||
Sistemas |
Colmo |
Folhas |
Palha |
Sabugo |
Grãos |
Silagem de milho1 |
|
(%) |
|
||||||
ST |
23,48 |
40,65 |
37,73 |
31,63 |
32,28 |
31,35 |
|
SAF |
26,72 |
59,37 |
66,09 |
44,30 |
43,04 |
33,06 |
|
Média |
25,10 |
50,86 |
51,91 |
37,39 |
37,66 |
32,20 |
|
CV (%) |
9,64 |
22,13 |
26,30 |
14,35 |
14,96 |
11,15 |
|
P * |
0,043 |
0,023 |
0,005 |
0,004 |
0,008 |
0,43 |
|
*Valores
de P < 0,05 diferem estatisticamente pelo teste de Fisher. 1Silagens de milho da planta
inteira, analisadas após a abertura dos silos. |
|||||||
O teor de MS no colmo contribui significativamente
para a qualidade da silagem por representar a maior fração da planta do milho (LUPATINI
et al. 2004). Assim, baixos teores de umidade nesta fração podem acarretar a colheita
da planta do milho com teores abaixo de 30% da MS, resultando em baixa produção
de MS, perdas de MS por lixiviação e fermentação inadequada (JOBIM; NUSSIO,
2014). Já o teor de MS elevado (acima de 35%) nesta fração pode indicar um
material em estágio avançado de crescimento, já com algum grau de lignificação
e menor digestibilidade da fração fibrosa.
As demais frações da planta: folha, palha, sabugo e grãos,
apresentaram diferenças (P<0,05) nos teores de MS entre os materiais
colhidos nos dois sistemas. Foram observados valores inferiores de MS da folha,
da palha, do sabugo e grãos das plantas colhidas no ST, em relação ao SAF.
Os teores de MS das silagens de milho (planta inteira)
não diferiram entre os dois sistemas. Verificou-se teor médio condizente com os
teores recomendados por Jobim e Nussio (2014), que sugerem que a silagem, para ser
considerada de boa qualidade, deva apresentar teor de MS variando de 28 a 40%,
o que garante maior produção de MS digestível por área e melhor ingestão de MS
pelos animais.
Apesar de alguns valores serem inferiores no SAF, principalmente da fração
fibrosa das silagens, segundo Balbino et al. (2011), este tipo de sistema gera
uma série de outros benefícios, tais como a maximização da quantidade de
produtos dentro da área, o desenvolvimento agrícola sustentável, a reciclagem
de macro e micronutrientes, a menor dependência de insumos externos, entre
outros. Tais benefícios poderiam justificar a opção por esse sistema e devem
ser considerados em tomadas de decisões sobre quais sistemas adotar, bem como,
em comparações entre os diferentes sistemas de cultivo.
CONCLUSÕES
O cultivo de milho crioulo da variedade Milho Alto no sistema
agroflorestal apresenta menor potencial de produção da fração fibrosa (colmo e
folhas) do que o do cultivado no sistema tradicional e maior potencial de produção
de grãos no sistema agroflorestal.
O teor de matéria seca da silagem é adequado nos dois sistemas.
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