ARTIGO CIENTÍFICO
Influência do efluente tratado sobre o
fitoplâncton em trecho urbanizado de rio em Juazeiro do Norte, Ceará
Influence of treated effluent
on phytoplankton in an urbanized stretch of river in Juazeiro do Norte, Ceará, Brazil
Influencia del efluente tratado sobre el fitoplancton en un tramo urbanizado del río en Juazeiro do Norte, Ceará,
Brasil
Marise
Daniele Maciel Lima1;
Maria Aparecida Pereira Santos2;
Adjuto Rangel Junior3;
Yannice Tatiane da Costa Santos4
1Mestranda em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos
Hídricos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, +5588999461538,
marisedaniele@ufmg.br; 2Mestranda
em Desenvolvimento Regional Sustentável, Universidade Federal do Cariri, Crato,
Ceará, adriellypereyra@gmail.com;
3Doutorando em Meio Ambiente, Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, Natal, Rio Grande do Norte, jr_arangel@hotmail.com;
4 Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Ceará, Doutoranda em Química Biológica pela Universidade Regional do Cariri,
Juazeiro do Norte, Ceará, yannice@ifce.edu.br.
Recebido:
13/03/2019; Aprovado: 03/11/2019
Resumo: O estudo objetivou avaliar a influência do lançamento do efluente
tratado por lagoa de maturação (ETE Malvas) sobre o fitoplâncton em uma seção
parcialmente urbanizado do rio Salgadinho (Juazeiro do Norte, Ceará) e sua
relação com as características limnológicas, sendo para
tal selecionados quatro pontos: (P1) a montante do emissário ETE Malvas, (P2)
no emissário, (P3) 50m a jusante do emissário e (P4) 1100m a jusante do
emissário. As coletas foram realizadas em época de estiagem correspondente aos meses
de junho, julho e agosto de 2017, tendo como variáveis físico-químicas: pH,
temperatura da água, turbidez, alcalinidade total, clorofila a, DQO, OD e frações
nitrogenadas; e para avaliação qualitativa de fitoplâncton: densidade relativa,
índice de ocorrência e concentração de organismos. O efluente lançado pelo emissário da ETE influencia de forma desfavorável no trecho de 1100m do rio,
por promover um ambiente com baixa diversidade fitoplanctônica
nos pontos a jusante, em função da contribuição numerosa da espécie Planktothrix isothrix
(divisão Cyanobacteria), quando se compara com as
condições do trecho a montante (P1) do emissário, que insinuou um estado de
poluição, pela presença mais expressiva de amônia total. Ademais, o efluente
ainda interfere nos aspectos limnológicos de forma
positiva ao elevar imediatamente o oxigênio dissolvido a jusante e,
negativamente com a decomposição da biomassa algal,
seja pela elevação da turbidez e conversão do abundante nitrogênio orgânico algal em amônia total.
Palavras-chave: Estação de Tratamento de Esgoto; Microalgas;
Cianobactérias.
Resumen: El estudio tuvo como objetivo evaluar la influencia
de la liberación de
efluentes tratados por el estanque de maduración (ETE Malvas) sobre el fitoplancton en una sección parcialmente urbanizada del
río Salgadinho (Juazeiro do Norte, Ceará) y su relación con
las características limnológicas,
con cuatro seleccionados puntos: (P1) aguas
arriba del emisario ETE
Malvas, (P2) del emisario,
(P3) 50m aguas abajo del emisario y (P4) 1100m aguas abajo
del emisario. Las recolecciones se realizaron durante la estación seca correspondiente a los meses de junio, julio y agosto de 2017, con variables físicas y químicas: pH, temperatura del agua, turbidez, alcalinidad
total, clorofila a, DQO, OD y fracciones nitrogenadas; y para la evaluación cualitativa
del fitoplancton: densidad relativa, índice de ocurrencia
y concentración de organismos. El efluente liberado
por el emisario ETE tiene una influencia desfavorable
en el tramo de 1100m del río, ya
que promueve un ambiente con baja diversidad de fitoplancton en los puntos aguas abajo, debido a la gran contribución
de la especie Planktothrix isothrix (división de Cyanobacteria), en comparación con Las condiciones de la sección aguas arriba (P1) del emisario, que insinuó un estado de contaminación, debido a la presencia más significativa de amoníaco total. Además, el efluente todavía interfiere positivamente con los aspectos limnológicos al elevar inmediatamente
el oxígeno disuelto aguas abajo
y, negativamente con la descomposición de la biomasa de algas, al aumentar la
turbidez y convertir el nitrógeno orgánico de algas abundante
en amoníaco total.
Palabras claves:
Planta de Tratamiento de Aguas
Residuales; Microalgas; Cianobacterias.
INTRODUÇÃO
Os rios constituem um ambiente ecológico caracterizado, especialmente,
pela presença de correnteza. São ecossistemas complexos, principalmente porque
apresentam grandes alterações espaciais, desde suas nascentes até às grandes
áreas de várzea, já nas planícies fluviais. Em muitos continentes, em regiões
áridas e semiáridas, ocorrem rios intermitentes nos quais, durante períodos de
precipitação, há um fluxo de correntes de água considerável, que desaparece
durante períodos de seca (TUNDISI; TUNDISI, 2008). Nesses ecossistemas, a água,
quando reunida em certo volume constituindo massa d’água apresenta muitas
características físicas e químicas importantes no estabelecimento e na ecologia
dos organismos aquáticos (BRANCO, 1978).
Nos ambientes lóticos a predominância da comunidade fitoplanctônica
está associada a variedade, abundância e sua distribuição que dependem das
características bióticas e abióticas do meio. Esses organismos constituem uma
das unidades básicas de matéria orgânica de ecossistemas aquáticos (TUNDISI,
2003). Com presença e quantidades apropriadas de nutrientes no meio, os
componentes vegetais desses seres promovem o seu crescimento e acúmulo de
energia solar luminosa na forma de compostos químicos energéticos, através da
fotossíntese. A partir desse princípio o oxigênio produzido por esse processo
representa parcela significativa do total utilizado para a respiração dos organismos
aquáticos (REYNOLDS, 2006; DI BERNARDO et al., 2010).
O estudo de organismos fitoplanctônicos em ambientes lóticos se destaca
pela grande importância na compreensão da dinâmica do funcionamento do corpo
aquático em função das diferentes influências que o mesmo
sofre, devido às atividades antrópicas durante seu percurso, destacando aqueles
presentes em ambientes urbanizados. Gentil et al. (2008)
ressaltam que sua presença na água doce constitui um elemento importante
para avaliação das condições ambientais. A composição taxonômica e a
diversidade da comunidade fitoplanctônica são utilizadas para avaliar a saúde
do ambiente e inferir as prováveis causas de danos ecológicos.
Dentre essas atividades, pontua-se o lançamento de efluentes tratados
por processos biológicos naturais otimizados, caso das lagoas de estabilização,
cuja características típicas demonstra riqueza de biomassa algal representada
por um grupo de cianobactérias, majoritariamente ocupada por Planktothrix
spp., já reconhecidos por alguns estudos específicos nesses sistemas como o de
Aquino et al. (2011); Von Sperling e Oliveira (2010)
e Albuquerque et al. (2016). Essa cianobactéria ocorre em maior densidade e
concentração nos corpos aquáticos na estação do verão e em ambientes de clima
quente comuns da região Nordeste (DANTAS et al. 2008; ANDRADE; GIROLDO, 2014).
A associação entre o levantamento taxonômico e ecológico da comunidade
fitoplanctônica com as condições físicas e químicas do ambiente ao longo das
zonas de autodepuração revelam o estágio de equilíbrio da comunidade aquática
primária, e amparo dos demais grupos pertencentes. Faria (2010) destaca a
importância dessa relação, pois a dominância e abundância de divisões e gêneros
específicos indicam as condições ou influências que o meio possa estar sofrendo
quanto ao seu equilíbrio.
Tais fenômenos são tipicamente percebidos no percurso do Rio Salgado,
localizado na sub-bacia do Salgado ao sul do Estado do Ceará. Principalmente
relacionado ao trecho que perpassa a cidade de Juazeiro do Norte, destacando-se
por sua aglomeração populacional predominantemente urbanizada e geradora de
efluentes brutos que são dispostos no solo ou ambientes aquáticos, e efluentes
tratados, como ocorre com o lançamento da ETE Malvas que é responsável por
receber e tratar 37,42% dos efluentes gerados pela cidade lançando-os no Rio
Salgadinho, que mais à frente dá início ao de fato Rio Salgado (FREIRE, 2017).
Há discussões frequentes quanto à influência desse lançamento na
qualidade da água do Rio Salgadinho, seja pela população juazeirense ou pelos
órgãos ambientais, e quando se trata de autodepuração, as variáveis de matéria
orgânica e oxigênio dissolvido lideram a condução desses estudos por serem os
parâmetros mais requisitados e comumente explorados para a verificação do poder
de recuperação que o corpo aquático tem ao receber um despejo orgânico.
Contudo, os efluentes de lagoa de maturação são diferenciados pelo aporte
microbiológico robusto com potencial de modificação da comunidade aquática do
rio (VON SPERLING, 2017).
Sendo assim, o presente estudo objetivou avaliar a influência do
lançamento do efluente tratado por lagoa de maturação (ETE Malvas) sobre a
comunidade fitoplanctônica em uma seção parcialmente urbanizada do rio
Salgadinho (Juazeiro do Norte, Ceará) e sua relação com as características
limnológicas.
MATERIAL E
MÉTODOS
O presente estudo segue o modelo clássico e é caracterizado como pesquisa
descritiva-explicativa e exploratória. Prestes (2008) descreve pesquisa
descritiva como aquela em que se observam, registram, analisam, classificam e
interpretam os fatos sem que o pesquisador lhe faça qualquer
interferência. Assim, o pesquisador estuda os fenômenos do mundo físico
e humano, mas não os manipula. A pesquisa descritiva tem como objetivo
principal a descrição das características de determinada população ou
fenômeno ou então o estabelecimento de relações entre variantes (GIL,
2009), abrangendo ainda um enfoque exploratório, pois o seu
desenvolvimento se configura com o objetivo de proporcionar maiores
informações sobre o assunto estudado (PRESTES 2008). Desta forma, o trecho de 1100
metros do rio Salgadinho selecionado para o estudo fica localizado no município
de Juazeiro do Norte, o qual recebe o efluente tratado da ETE Malvas. A mesma é constituída por lagoas de estabilização em série,
contemplando dois módulos em paralelo, formados cada um, por uma lagoa
anaeróbia mais uma lagoa facultativa, ambos encaminhando os efluentes para uma
única lagoa de maturação, totalizando cinco lagoas (FREIRE, 2017).
As coletas foram realizadas no período de junho a agosto de 2017, meses
considerados de estiagem de acordo com os dados históricos do Instituto
Nacional de Meteorologia (INMET, 2017), totalizando três coletas realizadas no período
matutino (entre 9h e 11h). Os pontos selecionados para amostragem foram
especificados de forma a contemplar a zona à montante e mistura do emissário
com rio, sendo: o (P1) (7°11'19.69"S; 39°18'34.63"O) localizado a
montante do lançamento do efluente tratado da ETE Malvas, o (P2) (7°11'20.26"S;
39°18'32.84"O) o próprio emissário da ETE, (P3) (7°11'20.60"S;
39°18'30.93"O) à 50 metros a jusante do emissário (mistura) e (P4) (7°11'29.73"S;
39°17'52.91"O) à 1100 metros a jusante do emissário, conforme Figura 1.
Essa extensão foi eleita devido à acessibilidade e condições naturais e
artificiais de mistura verificados, a exemplo da barragem após o (P1), bem
como, cerca instalada anterior ao (P3).
As amostras de água para análises físico-químicas e
clorofila a foram coletadas na porção
limnética para cada ponto selecionado, utilizando-se
recipiente de plástico com capacidade de 5 L em seguida armazenadas em frascos
de polietileno. Após a coleta as amostras foram devidamente acondicionadas em
recipiente de isopor com gelo e imediatamente encaminhadas ao Laboratório de
Engenharia Ambiental e Sanitária (LEAS) do Instituto Federal de Educação
Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE/JN) onde foram processadas de acordo com as
metodologias expressas na Tabela 1.
Figura 1: Mapa
de localização da área de estudo, trecho do Rio Salgadinho Juazeiro do Norte,
Ceará, Brasil, com os respectivos pontos de coletas; (P1) a montante, (P2) no
emissário, (P3) 50m a jusante e (P4) a 1100m de distância do emissário.
Fonte: Autor.
2017.
Tabela 1: Variáveis estudadas, métodos e referências
utilizadas para realização das análises. |
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VARIÁVEIS |
MÉTODOS |
REFERÊNCIAS |
Temperatura (°C) |
Sensor de Temperatura |
AWWA/APHA/ WEF 2012 |
pH |
Potenciométrico |
|
Clorofila “a” (µg/L) |
Espectrofotométrico – Extração a frio com acetona
90% |
|
Oxigênio Dissolvido (mg O2/L) |
Titulométrico – Método iodométrico |
|
DQO (mg O2/L) |
Titulométrico – Digestão por refluxação fechada |
|
Alcalinidade Total (mg CaCO3/L) |
Potenciométrico – Titulação com ácido sulfúrico |
|
Amônia Total (mg N/L) |
Titulométrico – Destilação com ácido bórico |
|
Nitrogênio Orgânico (mg
N/L) |
Titulométrico – Digestão ácida seguida de destilação |
|
Nitrito (mg N/L) |
Espectrofotométrico – Diazotação
com NED |
|
Nitrato (mg N/L) |
Espectrofotométrico – Salicilato
de sódio |
Silva e Oliveira (2001) |
As amostras para análise qualitativa do fitoplâncton
foram coletadas de forma manual, e para a obtenção destas efetuou-se filtragens
da água (50 L) através de copo separador de plâncton (malha de 20 µm), na qual
os organismos retidos foram removidos através de jatos d’água com auxílio de
uma pisseta (KOENING; ESKINAZI-LEÇA, 1984). As
amostras foram acondicionadas em recipientes apropriados e preservadas com
formol a 4% (NEWELL; NEWELL, 1968). Os organismos foram identificados quando possível,
em nível genérico e infragenérico, com base nas características morfológicas e
métricas das populações e apoio de fotografias, guias e chaves de identificação.
Para cada amostra, a leitura foi realizada em microscópio óptico Bioval com intervenção de lâmina/lamínula e aproximação de
1000x para identificação dos organismos e 4000x quando necessário a
visualização da estrutura corporal detalhada, adotando-se três lâminas com
volume de 0,2 mL cada. A identificação taxonômica de Cyanobacteria foi feita usando o Sistema Komárek (KOMÁREK; ANAGNOSTIDIS, 2000; 2005; KOMÁREK;
KRONBERG, 2001); Round (1971) para Chlorophyta e
Simonsen (1979) para Bacillariophyta, bem como,
Bicudo e Menezes (2006) para a comunidade em geral.
Para análise da Densidade Relativa o método utilizado
teve como base Odum (1983) que segue de acordo com a
equação: Dr = (Na/N)*100%, em
que, (Dr) é a densidade relativa, (Na) o número de
indivíduos presentes na amostra e (N) o número total de indivíduos. A
frequência de ocorrência desenvolvida por Zulkifli
(1992) e utilizada por Barthel (2007) que descreve o
Índice de Ocorrência de Espécies e suas Frequências foi adaptada nesse estudo
para os grandes grupos algais (divisões e espécies mais frequentes) com intuito
de identificar a porcentagem de constância dos táxons no total de lâminas
analisadas para cada amostra. A equação para a variável supracitada se dá da
seguinte forma: IOD = (Pi/P)*100%,
onde o (IOD) é o Índice de Ocorrência de Divisões Algais, (Pi)
o número de frequências de divisões ou espécies (i) nas amostras analisadas e
(P) o número total de amostras. Assim os grupos algais
puderam ser classificados nas seguintes categorias: Ausentes: não encontrados
nas amostras; Raras: presente em menos de 25% das amostras; Pouco Frequentes:
presentes entre 26 – 50% das amostras; Frequentes: presentes entre 51 – 90% das
amostras; Permanentes: presentes em mais de 90% das amostras.
Na análise descritiva dos dados, as variáveis
físico-químicas e clorofila a foram
agrupadas por pontos de coletas a fim de analisar seu comportamento durante o
estudo. As estatísticas descritivas, tabelas e gráficos foram geradas no
programa Microsoft Excel 2010.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
O estudo foi realizado em meses de estiagem, sendo que, o total de
chuvas precipitadas no munícipio de Juazeiro do Norte foi de 10,8 mm em junho, 2,7
mm em julho e 0 mm em agosto (INMET, 2017). A Figura 2 apresenta a variação das
médias aritméticas dos seguintes parâmetros estudados: pH, temperatura da água, turbidez,
alcalinidade total, clorofila a,
oxigênio dissolvido (OD), demanda química de oxigênio (DQO), nitrogênio
orgânico (N-org), amônia (NH3), nitrito
(NO2-) e nitrato (NO3-) referentes
à água do rio Salgadinho. Destaca-se a distinção da qualidade do efluente final
da estação de tratamento (P2) com o demais locais
monitorados.
Figura 02: Concentração média das
variáveis (A) - pH e Alcalinidade total, (B) - Turbidez e Clorofila a, (C) –
Temperatura da Água, (D) DQO e OD, (E) Nitrogênio Orgânico e Amônia total, (F)
- Nitrito e Nitrato em relação ao OD; nos pontos a montante do lançamento do
efluente (P1), efluente do emissário ETE (P2), jusante a 50m do emissário (P3)
e jusante 1100m do emissário (P4), no Rio Salgadinho, Juazeiro do Norte, Ceará,
Brasil.
A temperatura da água não
demonstrou variações bruscas ao longo dos pontos tendo seu mínimo de 25,8 °C
(P4) e máximo de 28,3 °C (P3) (Figura 2C). Houve aumento de 1°C do (P2) para o
(P3) refletindo as alterações causada no meio pelo efluente do emissário, porém
essa variação não perturba o equilíbrio do rio nessa vertente, nem excede o
padrão exigido pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente/COEMA N° 02/2017 (CEARÁ,
2017) que estabelece sobre os padrões de lançamento de efluentes líquidos
gerados por fontes poluidoras. Não somente para a temperatura, mas para os
parâmetros de pH (5 a 9), nitrito (até 1 mgN/L),
nitrato (até 10 mgN/L) e amônia total (Conselho
Nacional do Meio Ambiente/CONAMA nº 430/2011 com padrão de até 20 mgN/L), o efluente final foi obediente.
Considerando o aspecto legal
para o rio Salgadinho, balizado pela Resolução CONAMA nº 357/2005 – Água Doce –
Classe 2, sobre o enquadramento dos corpos aquáticos brasileiros, percebe-se
que as frações de nitrito e nitrato são as únicas que respeitam o padrão máximo
estabelecido em todos os trechos estudados, diferentemente da turbidez,
inferior a 100 UT apenas no (P1) (17,0) influenciada pelo efluente nos demais
locais estudados e, clorofila a, OD e amônia total que já se encontram em
concentrações incompatíveis com a legislação logo no ponto à montante ao
lançamento, a saber: 30 µg/L, 5 mgO2/L e 2,0 mgN/L
para pH entre 7,5 a 8,0, respectivamente. Ou seja, o rio não assegura a
qualidade da água para a Classe 2, para este grupo de parâmetro (BRASIL, 2005).
Os resultados de pH e
alcalinidade total não relataram discrepância considerável ao longo dos pontos
de coleta, porém observou-se uma tendência ao aumento do pH no trecho e uma
leve redução da alcalinidade total do (P1) (254,56 mg CaCO3/L) a (P3) (246,84
mg CaCO3/L) e aumento no (P4) (263,97 mgCaCO3/L) (Figura 2A). Esse fato tem
reflexo do lançamento do efluente tratado, pois, a produção de oxigênio pelo
fitoplâncton nesse ponto consome o dióxido de carbono dissolvido do meio que
geralmente está na forma de íons bicarbonato, liberando hidroxilas e elevando
assim o pH, tornando esse intervalo mais alcalino e com maior probabilidade de
troca iônica, comportamento também observado por Esteves (2011) e Von Sperling e Oliveira (2010). Esse fato também explica as variações
da alcalinidade total ao longo dos pontos. De acordo com as médias dos pontos
estudados é possível observar que a alcalinidade total a partir do (P2) começa
a ser consumida moderadamente para disponibilizar dióxido de carbono para
respiração do fitoplâncton.
Os valores de turbidez
evidenciam um aumento do (P1) (16,97 UNT) para o (P2) (259,0 UNT), o que
reflete na influência do lançamento do efluente tratado nesse trecho do rio com
o rico aporte de biomassa fitoplanctônica que causa
ao meio uma coloração esverdeada, afirmado pela presença destacada da clorofila
a nesse ponto (Figura 2B). A clorofila a teve sua maior variação após o (P2),
como já era expectado. No decurso dos quatro pontos a variável teve média de
75,8 µg/L (P1), 939,9 µg/L (P2), 211,17 µg/L (P3), 108,28 µg/L (P4) (Figura
2B). Pôde-se observar então que no decorrer do trecho há uma diluição e
dispersão desse efluente e consequentemente a redução da concentração de
clorofila a no (P3) e (P4). A turbidez dificulta a penetração de luz na coluna
d’água, reduzindo o potencial de realização da fotossíntese. Contudo, como o
efluente tratado em questão é diferenciado por possuir concentrações de
oxigênio dissolvido (5,0 mg O2/L) mais altas, esse empecilho não
acontece no presente estudo.
O (P1) apresentou os menores
valores médios de OD e DQO, sendo respectivamente 1,52 mg O2/L e
129,9 mg O2/L (Figura 2D). Este teor de OD em um corpo aquático
retrata um cenário de aproximação a condições anaeróbias no rio, para Von Sperling (2007) nessas condições os peixes já estão mortos
ou não existem. O baixo teor de OD no rio antes do despejo insinua vestígios de
zona de degradação oriunda da influência de despejos que acontecem na passagem
do rio pela cidade. Em avaliação feita por Gonçalves et al. (2012) em um trecho
de autodepuração de um rio do estado de São Paulo, os menores teores de OD (1,7
a 3,3 mg O2/L) foram encontrados em um intervalo de área urbana.
No (P2), o efluente tratado
apresentou concentrações comuns de OD e DQO equivalentes a 5,0 mg O2/L
e 662 mg O2/L, respectivamente (Figura 2D). O lançamento desse
efluente, definitivamente atípico por apresentar elevada biomassa algal, quando comparados a efluentes brutos ou tratados por
outras tecnologias, colabora com elevada carga orgânica particulada proveniente
da biomassa fitoplanctônica e resultam na produção de
oxigênio dissolvido em virtude das atividades fotossintéticas. Estudo realizado
por Fernandes et al. (2002) apresentou teor de OD de 2,6 mg O2/L e
7,0 mg O2/L para pontos próximos a montante e a jusante do emissário
da ETE Malvas, respectivamente, o que corrobora ainda hoje com os resultados
obtidos nessa pesquisa.
Em virtude da mistura do
emissário com a água do rio, o (P3) aumentou sua concentração de OD em 57,1% em
relação a montante do lançamento (P1 – 1,5 mg O2/L e P3 – 3,5 mg
O2/L), resultante da diluição do OD e organismos fotossintetizantes presentes
no emissário. Como esperado, a DQO se elevou devido a participação maciça da
biomassa algal, apesar de não se ter certeza da
fração orgânica solúvel contribuinte não tratada pelo sistema. A partir de
então há um declínio nos teores de OD (2,0 mg O2/L) no meio,
resultante da degradação da biomassa algal morta (em
especial a Planktothrix isothrix,
espécie dominante nesse trecho, oriunda do efluente tratado), gerando
alcalinidade para o meio e consequente redução do pH (Figura 2A). Esse
entendimento prévio não inclui as interferências das contribuições existentes,
porém não investigadas, no percurso dos 1000 m após o (P3). Conquanto, sugere-se
que o (P4) seja o início de uma zona de degradação ativa.
As concentrações de
nitrogênio orgânico e amônia quando analisados ao decorrer do trecho, seguiu a
relação de assimilação e conversão já esperada das formas. As menores
concentrações de nitrogênio orgânico (2,2 mg N/L) foram obtidas no (P1) e
associado a este, as maiores concentrações de amônia (11,6 mg N/L) também
obtidas nesse ponto. Essa alta concentração de amônia refere-se ao fato das
contribuições referentes a montante desconhecidas que o rio recebe. No (P2)
houve o aumento da concentração de nitrogênio orgânico (10,1 mg N/L) devido o
aporte da biomassa fitoplanctônica despejada no rio
oriunda do emissário, tendo seu valor máximo nesse ponto para essa variável
(Figura 2E).
A alta taxa de atividade
fotossintética que acontece na lagoa de maturação de uma ETE contribui para o
aumento do pH (valores superiores a 9) o que proporciona a volatilização da
amônia nesse ambiente, que segundo Von Sperling
(2017), em condições de alta taxa de fotossíntese, a elevada produção algal contribui com o consumo direto dessa fração para o
seu crescimento. Gonçalves (2016) em estudo realizado nas lagoas de
estabilização da ETE Malvas relatou que a fração de amônia mais predominante no
meio foi a amônia ionizada, em virtude de altas temperaturas registradas e pH
encontrado relativamente neutro (7,5 – 7,7). Este cenário então, coincide com a
menor concentração de amônia (3,7 mg N/L) do trecho que foi registrada no (P2).
A redução da concentração de
nitrogênio orgânico (5,0 mg N/L) e aumento da amônia (8,2 mg N/L) no (P3) se
deu pela diluição ou degradação da biomassa algal
lançada no trecho havendo assim a conversão das frações (orgânico para amônia),
pois os teores de OD reduziram do (P2) (5,0 mg O2/L) a (P3) (3,5 mg
O2/L) evidenciando o seu consumo para degradação dessa matéria
orgânica. As concentrações de amônia encontradas nesse estudo se apresentaram
menores que os relatados em pesquisa feita por Fernandes et al. (2002) que
variaram entre 19,6 mg N/L e 23 mg N/L a montante e a jusante da ETE,
respectivamente. Avaliando o trecho de (P3) a (P4) foi notória a elevação nas
concentrações de nitrogênio orgânico (5,97 mg N/L) e amônia (10,4 mg N/L) nesse
ponto, fato que pode estar ligado ainda as condições de mistura do efluente com
a água, ou mais provável, novas contribuições de efluentes de origens
desconhecidas no rio.
As frações de nitrito e
nitrato (Figura 2F) expõem as baixas e já esperadas concentrações encontradas
no decurso do espaço do rio em estudo. O (P1) caracterizado por baixas
concentrações de OD (1,52 mg O2/L) e disponibilidade de matéria
orgânica, indica um ambiente de alta atividade de degradação, portanto as
bactérias nitrificantes não crescem havendo competição de O2 no meio
com as bactérias heterotróficas, que se sobressaem, além de disputarem o
carbono inorgânico com o fitoplâncton (BITTON, 2005). Esse evento é ainda mais
válido para o (P3) que detém maior concentração de matéria orgânica que o (P1)
apesar de ter OD disponível.
Tchobanoglous e Burton (1991) refere que,
em lagoas de estabilização quase não ocorre a nitrificação, pois, é necessário
elevado tempo de detenção hidráulica para desenvolvimento das mesmas, portanto
se aplica esse acontecimento para as maiores concentrações de nitrito (0,74 mg
N/L) e nitrato (0,17 mg N/L), que foram observadas no (P2). Esses baixos valores
de nitrito e nitrato corroboram também com teores encontrados por Thebaldi et al. (2011), onde as variações foram 0,07 mg N/L
a 0,18 mg N/L para nitrito e 0,61 mg N/L a 1,11 mg N/L para nitrato, sendo esta
última fração maior que a detectada neste escrito.
A comunidade fitoplanctônica do trecho em estudo (P1 a P4) teve uma
representação de 48 táxons durante o estudo, distribuídas nas seguintes
divisões Cyanobacteria (76%), Bacillariophyta
(10%), Chlorophyta (6%), Euglenophyta
(8%) e Cryptophyta (2%). As cinco divisões reportadas
no presente trabalho apresentam ocorrência comum em ambientes límnicos (SOARES et al., 2007; NASCIMENTO et al., 2010). De
acordo com Esteves (2011) em ambientes aquáticos interiores podem ser
encontrados representantes de praticamente todos os grupos algais.
A predominância de um ou outro grupo em um dado ecossistema é função,
principalmente, das características dominantes do meio. As mudanças temporais
da comunidade fitoplanctônica são dependentes de
variações climatológicas (precipitação, vento e radiação solar) e das complexas
interações entre os processos físicos, químicos e biológicos (CALIJURI, 1999).
Dentre os táxons registrados
no presente estudo, a cianobactéria filamentosa Planktothrix
isothrix destacou-se como a mais frequente e
apresentando a maior densidade relativa (70,8%), seguida pelas espécies Nitzschia sp. (9,7%,) Bacillariophyta;
Micractinium sp. (3,8%) e Chlorella sp.
(3,6%) Chlorophyta; Euglena sp. (7,4%) Euglenophyta; e Cryptomonas
sp. (1,97%) Cryptophyta. Para o índice de ocorrência
prevaleceram como dominantes quatro das cinco divisões encontradas, com
destaque para Cyanobcteria. A densidade relativa
referente as divisões algais para cada coleta
encontram-se listadas e representadas graficamente na Tabela 2.
Destaca-se que a água no ponto de amostragem antes do recebimento do
efluente (P1), representando o rio em sua condição natural, sem interferência
da ETE, pelas três coletas, apresentou a maior riqueza e diversidade fitoplanctônica em relação aos demais pontos amostrados.
Para a divisão Cyanobacteria, caracterizou-se como
frequentes as espécies Oscillatoria
sp., Phormidium
sp., Pseudoanabaena
sp. e Planktothrix isothrix
(densidade relativa média de 11,17% e concentração de 46 N°org/mL), que de acordo com a literatura tratam-se de
cianobactérias filamentosas potencialmente tóxicas (CALIJURI; ALVES: SANTOS,
2006; SANT’ANNA et al., 2008). Quanto a divisão Bacillariophyta
destacaram-se as espécies Nitzschia sp. e Navicula sp., seguidas pelas espécies Chlorella sp. e Micractinium sp. (Chlorophyta) e Euglena
sp. (Euglenophyta).
A condição natural do rio encontrada corrobora com o estudo realizado
por Rangel et al. (2017), em um trecho do Rio Salgado (a jusante do emissário)
localizado no município de Aurora/CE. Bacillariophyta,
destacou-se pela maior riqueza de espécies seguida por Cyanobacteria.
Os autores ainda relatam a presença de táxons característicos de ambientes meso/eutrófico, sugerindo
alterações de natureza antrópica, fato que pode comprometer o funcionamento e a
qualidade da água deste rio. A contínua interferência das atividades humanas
nos sistemas aquáticos tem produzido impactos como a eutrofização artificial
desses ambientes, com consequências para a qualidade da água, a biota aquática
e o funcionamento de lagos, rios e reservatórios (BARBOSA; FRANÇA, 2011).
Registrou-se a presença da divisão Cryptophyta
através da presença única da espécie Cryptomonas sp. presente no (P1) e (P3) referente a última
coleta realizada, com densidade relativa de 22,5% e 1,1% respectivamente. De
acordo com Bicudo e Menezes (2006) a espécie mencionada apresenta
características ecológicas que lhe permite sua presença em ambientes que
apresentam altas taxas de matéria orgânica em decomposição e nitrogênio
disponível. Araújo e Godinho (2008) reforçam a ocorrência de alguns táxons
dessa divisão em ambientes eutróficos, porém estes
podem perdurar no meio independente do seu estado trófico.
Tabela 2: Distribuição das divisões algais com suas
respectivas Densidades Relativas (DR), Índice de Ocorrência de Divisões (IOD)
e Concentrações de Organismos. Pontos de estudo avaliados: (P1) montante do
lançamento do efluente tratado da ETE Malvas; (P2) o próprio emissário da
ETE, (P3) à 50m a jusante do emissário (mistura) e (P4) à 1100m a jusante do
emissário. |
|||||
VARIÁVEL |
DIVISÕES |
P1 |
P2 |
P3 |
P4 |
DR (%) |
CYANOBACTERIA |
19,8 |
91,3 |
89,0 |
92,9 |
BACILLARIOPHYTA |
20,3 |
7,5 |
8,7 |
1,6 |
|
CHLOROPHYTA |
24,5 |
1,2 |
1,8 |
2,4 |
|
EUGLENOPHYTA |
26,5 |
0,05 |
1,8 |
1,3 |
|
CRYPTOPHYTA |
7,5 |
0,00 |
0,4 |
0,00 |
|
IOD (%) |
CYANOBACTERIA |
100 |
100 |
100 |
100 |
BACILLARIOPHYTA |
100 |
100 |
100 |
100 |
|
CHLOROPHYTA |
100 |
67 |
78 |
100 |
|
EUGLENOPHYTA |
100 |
78 |
100 |
100 |
|
CRYPTOPHYTA |
33 |
0 |
33 |
0 |
|
CONCENTRAÇÃO (N° org/mL) |
CYANOBACTERIA |
96,1 |
32268,3 |
6834,4 |
6245,0 |
BACILLARIOPHYTA |
87,2 |
2491,7 |
591,1 |
206,1 |
|
CHLOROPHYTA |
104,4 |
388,3 |
112,2 |
132,2 |
|
EUGLENOPHYTA |
119,4 |
15,0 |
116,8 |
90,3 |
|
CRYPTOPHYTA |
65,7 |
0,00 |
34,0 |
0,00 |
|
Maior densidade relativa, índice de
ocorrência e concentração no ponto. |
|||||
Média densidade relativa, índice de
ocorrência e concentração no ponto. |
|||||
Moderadamente baixa densidade relativa,
índice de ocorrência e concentração no ponto. |
|||||
Baixa densidade relativa, índice de
ocorrência e concentração no ponto. |
|||||
Ausência de densidade relativa, índice
de ocorrência e concentração no ponto. |
A cianobactéria filamentosa Planktothrix isothrix apresentou maior representatividade em (P2),
devido ao consequente despejo de efluente no rio oriundo da lagoa de maturação
da ETE Malvas. Esse fato pode indicar um desequilíbrio ocorrente na comunidade
fitoplanctônica, uma vez que, a partir deste ponto percebe-se o predomínio
desta cianobactéria e uma redução das demais espécies registradas a montante do
emissário. Esta espécie apresentou Índice de Ocorrência de 100% durante todo o
estudo, em todos os pontos, sendo assim, classificada como permanente e sua
concentração maior quando comparadas as demais espécies (P1 – 46 N° org/mL; P2 – 32230 N° org/mL; P3 – 6772 N° org/mL; P4 – 6229 N° org/mL). Porém, a sua distribuição,
concentração e densidade relativa se modifica, mesmo que em baixa escala, ao
longo dos pontos.
A diversidade de espécies é de crucial importância para a compreensão
dos ecossistemas aquáticos, já que os processos antrópicos resultam também em
uma diminuição da diversidade. Desta forma, o conhecimento da diversidade de
organismos em geral e do fitoplâncton em particular é de grande importância
para auxiliar o desenvolvimento de programas de conservação e uso sustentável
de recursos biológicos, desacelerando a perda de biodiversidade (NABOUT, 2006).
Aquino et al. (2010) em estudo realizado nas lagoas de estabilização da ETE
Malvas obteve resultados similares para a ocorrência de Planktothrix isothrix e baixa diversidade de
organismos na lagoa de maturação (última lagoa do tratamento da ETE). Espécies
deste gênero compõem um grupo de cianobactérias filamentosas que permanecem
homogeneamente dispersas na coluna d’água e são comumente encontradas em lagoas
de polimento e em ambientes eutrofizados, apresentam aerótopos e tricomas com
forma pouco hidrodinâmicos, permitindo assim flutuabilidade e alta razão
superfície/volume. A mesma também pode adaptar-se a
ambientes de baixa intensidade luminosa devido a turbidez que causa na água e
assim, evitar o aparecimento e crescimento de outros grupos (AQUINO et al.,
2011).
De acordo com Di Bernardo et al. (2010) corpos aquáticos com
predominância de clima quente, radiação solar intensa na maior parte do ano, pH
neutro tendendo ao alcalino, excesso de matéria orgânica disponível e boa
relação de N/P promovem eventos de florações de cianobactérias, em especial
relacionada a Planktothrix spp. Portanto essas características
explicam a abundância desse organismo no (P2) quando associado as distribuições
e valores das variáveis físico-químicas descritas anteriormente. Benavides e Torzillo (2012) por meio de culturas relacionadas as
espécies de Planktothrix isothrix e Chlorella sp., revelou que estas algas
apresentam poder efetivo na remoção de frações nitrogenadas, em especial, a
amônia, a qual, é rapidamente associada pelas mesmas
para o seu crescimento. Desta forma tal estudo pode justificar a
representatividade desta cianobactéria no (P2) e significativa densidade
relativa (13,7%) e concentrações (47,3 N° org/mL) de Chlorella sp.
no (P1).
Observou-se também a presença de Nitzschia sp. no (P2) mesmo que
em menor densidade e concentração quando comparado a Planktothrix isothrix, evidenciando desta forma uma
certa tolerância e coexistência entre estas espécies. Albuquerque et al. (2016)
relata que as diatomáceas são comuns de ambientes turbulentos e com presença de
silício, dispondo assim de uma alta taxa de fotossíntese em ambientes com baixa
incidência solar. Portanto, conseguem coexistir no meio mesmo com a presença maciça
da Planktothrix isothrix.
De acordo com os pontos estudados, o (P3) a 50 m do emissário
considerado zona de mistura do efluente final da ETE com a água do rio Salgado
e (P4) a 1100m, constatou-se uma tímida redução de 2,76% na densidade relativa
de Planktothrix isothrix e
reaparecimento das espécies pertencentes as demais divisões (Bacillariophyta, Chlorophyta e Euglenophyta). Essa redução da densidade relativa pode
estar associada ao decaimento da matéria orgânica no (P3), bem como, ao fato de
o rio retomar características que permitem o reestabelecimento da comunidade.
Euglenophyta
e Chlorophyta agrupam espécies que apresentam
capacidade de tolerância a alta taxa de matéria orgânica disponível, grande
aporte de amônia e conseguem tolerar ambientes eutrofizados, sendo assim
encontradas em rápido crescimento nas lagoas de estabilização (ALBUQUERQUE et
al., 2016; BARTHEL, 2007; VON SPERLING; OLIVEIRA, 2010). Este fato está
atrelado as densidades relativas dessas divisões no (P1), uma vez que, ocorre
contribuições desconhecidas a montante desse ponto já evidenciadas pela alta
concentração de amônia e presença de carga orgânica em processo de degradação
nesse ponto.
Com relação a distribuição, concentração e densidade dos organismos
fitoplanctônicos encontrados ao longo dos pontos, o (P4) não caracteriza ainda
uma zona de águas limpas e sim de degradação ativa, devido à presença maciça de
Planktothrix isothrix e
baixa diversidade de espécies, ou seja, que até este ponto (1100m de distância
do emissário) o corpo aquático se encontra no processo de assimilação desse
aporte orgânico oriundo da biomassa algal.
Os cenários observados ao longo dos pontos foram semelhantes nas três
coletas. Evidenciando uma maior diversidade de espécies no (P1) e uma redução
no (P2) por consequência do lançamento do emissário rico em Planktothrix isothrix, que prevalece e domina o
ambiente nesse ponto impedindo a ocorrência dos demais táxons. Porém, ainda
nesse ponto foi observado baixa e significativa ocorrência do grupo Bacillariophyta (7,5%). Essa ocorrência destaca a capacidade
de coexistência que as espécies encontradas dessa divisão apresentam em relação
as cianobactérias, neste caso à Planktothrix isothrix.
Pode-se observar semelhanças representativas entre os pontos de coleta
(P3 e P4) onde o rio demonstra vestígios de retorno da ocorrência das demais
espécies já elencadas, seja pelo fato de ocorrer uma diluição do efluente que
recebe ao longo do percurso até a chegada do (P3), ou mesmo pela diminuição e
degradação celular de Planktothrix isothrix,
visto que nesses pontos registrou-se resquícios da lise celular destes
filamentos, podendo então estar relacionada a mudança de habitat contínua que
ocorre quando estas são lançadas ao rio. A desfragmentação desse gênero pode
comprometer a qualidade de corpos aquáticos de grande uso e importância para a
região, pois esses organismos são potencialmente tóxicos e podem vir a ameaçar
a qualidade do meio (DI BERNARDO et al., 2010).
CONCLUSÕES
O efluente lançado pelo emissário da ETE influência de forma desfavorável
o rio Salgadinho, Juazeiro do Norte, por promover um ambiente com baixa
diversidade fitoplanctônica nos pontos a jusante, em função da contribuição
numerosa da espécie Planktothrix isothrix
(divisão Cyanobacteria), tipicamente presente em
efluentes da lagoa de maturação. Ressalta-se ainda que o efluente interfere nos
aspectos limnológicos de forma positiva ao elevar imediatamente o oxigênio
dissolvido a jusante e negativamente com a decomposição da biomassa algal, seja
pela elevação da turbidez e conversão do abundante nitrogênio orgânico algal em
amônia total.
AGRADECIMENTO(S)
Os autores agradecem ao Instituto Federal de Ciência e
Tecnologia do Ceará (IFCE - Campus de Juazeiro do Norte) e a equipe do
Laboratório de Engenharia Sanitária e Ambiental (LEAS/IFCE).
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