ARTIGO
CIENTÍFICO
Trabalho Premiado no II Encontro Regional de Estudos Agroambientais,
realizado em Rio Largo, Alagoas, Brasil
Bactérias psicrotróficas e enzimas termorresistentes em leite cru
Psychrothrophic bacteria and thermosist
resistant enzymes in raw milk
Kleber Barros Nunes1, Lívia Ribeiro
da Silva2, Sybelle Georgia Mesquita da
Silva3, Cícero Cerqueira Cavalcanti Neto4, Tania Marta
Carvalho dos Santos5, Yamina Coentro
Montaldo6
1Secretaria
de Estado da Saúde de Alagoas, Maceió, +5582999120404, klebernunes09@yahoo.com.br; 2Campus de Engenharias e Ciências Agrárias
da Universidade Federal de Alagoas, Rio largo, livia.silva@ceca.ufal.br; 3Mestre pelo Campus de Engenharias e Ciências Agrárias
da Universidade Federal de Alagoas, Rio largo, belle_mesquita21@hotmail.com;
Professores do Campus de Engenharias e Ciências
Agrárias da Universidade Federal de Alagoas, Rio largo, 4cicerodurao@ig.com.br; 5taniamarta2@gmail.com; 6ycmzte11@gmail.com
Recebido: 15/12/2019; Aprovado: 20/12/2019
RESUMO: Objetivou-se
com o presente trabalho isolar e caracterizar bioquimicamente a microbiota psicrotrófica, bem como avaliar seu poder deteriorador no
leite cru refrigerado, armazenado em tanques de expansão, individuais e
coletivos, de propriedades das regiões Agreste e Sertão do Estado de Alagoas.
Foram analisadas amostras de leite coletadas em 23 tanques individuais e 13
coletivos, onde se verificou a presença de bactérias psicrotróficas
nos dois tipos de tanques de refrigeração, sendo um total de 105 isolados
bacterianos. Foi detectada a predominância de bactérias psicrotróficas
gram-negativas 78,09% (82/105), dos gêneros Pseudomonas, Enterobacter,
Aeromonas, Burkholderia, Acinetobacter e Shigella, enquanto que as
bactérias gram-positivas foram da ordem de 21,90% dos gêneros Streptococcus, Corynebacterium,
Enterococcus, Micrococcus e
Bacillus. Pseudomonas foi o gênero predominante com 43,81%. A grande maioria
dos isolados bacterianos demonstrou alto poder de produção de enzimas
extracelulares – protease, lipase e/ou lecitinase,
evidenciando assim potencial deteriorador do leite e derivados. Estatisticamente
não foi significativa a diferença de produção enzimática pelos isolados entre tanques
individuais e coletivos, não havendo dependência entre o número de isolados
bacterianos produtores de enzimas e o tipo de tanque.
Palavras-chave: Gram-negativas; Proteases; Lipases; Pseudomonas;
Termodúricos.
ABSTRACT: The goal
of this study was the isolation and biochemical characterization of psychotrophic microbiota, evaluating its deteriorating
potential on refrigerated raw milk stored in both individual and collective expansion
tanks located in farms from Agreste and Sertão regions of Alagoas State. Milk samples from 23
(individual) and 13 (collective) tanks were analyzed, and the presence of
psychotropic bacteria was diagnosed in both types of refrigeration tanks, totalizing
105 bacterial isolates. There was a predominance of gram-negative psychotropic
bacteria 78,09% (82/105) from genus Pseudomonas,
Enterobacter, Aeromonas, Burkholderia, Acinetobacter e Shigella, whereas gram-positive
bacteria represented 21,90% (23/105) of total isolates, from genus Streptococcus, Corynebacterium,
Enterococcus, Micrococcus and Bacillus.
In general, Pseudomonas was the most
prevalent genus isolated 43,81% (46/82). The majority of
bacterial isolates had high extracellular enzymes production – protease, lipase
and/or lecithinase, which evidenced elevate
deteriorating potential for milk and its derivatives. There was no significant
difference on enzymatic production among isolates or between individual and
collective tanks, as well as no dependency between total number of enzymatic
producer bacterial isolates and tank type.
Key words: Gram-negative; Proteases; Lipases; Pseudomonas; Thermoduric
INTRODUÇÃO
O
leite é constituído de proteínas, vitaminas, gorduras, carboidratos e sais minerais,
tornando-se um alimento bastante rico em nutrientes. Dessa forma, sua qualidade
é foco de várias discussões dentro da produção leiteira em nosso país. O Brasil
em 2015 ocupou o sexto lugar na produção mundial (IBGE, 2015), com cerca de 35
bilhões de litros, tendo um consumo per capita da ordem de 173,6 litros (CONAB,
2016).
O
isolamento e a identificação de microrganismos em leite cru se tornam
interessantes do ponto de vista de saúde pública, pois dependendo das espécies
isoladas, ações direcionadas podem ser tomadas visando à melhoria de sua
qualidade. A deterioração do leite é consequência, sobretudo do crescimento de
microrganismos psicrotróficos (TEBALDI et al., 2008).
As
bactérias psicrotróficas são aquelas que têm a
habilidade de se desenvolverem em baixas temperaturas – abaixo de 7°C.
Encontram-se amplamente distribuídas na natureza, podendo estar presentes nos
mais diversos ambientes, independente do clima ou da estação do ano. A
quantidade de bactérias psicrotróficas necessárias em
um determinado produto para que possa haver alterações e causar problemas está
em torno de 106 UFCml-1 (PINTO et al., 2006).
No
leite, os principais gêneros de bactérias psicrotróficas
são: Achromobacter, Acinetobacter, Alcaligenes, Flavobacterium, Yersínia
e Pseudomonas, gram-negativos; Bacillus,
Listeria e Clostridium, gram-positivos (HORST, 2006).
Destacam-se como termorresistentes os gêneros Micrococcus, Microbacterium,
Lactobacillus e Streptococcus, enquanto que Clostridium e Bacillus são formadores de esporos (WALSTRA,
2001). Destes, o gênero Pseudomonas spp, é o mais frequente (HORST, 2006).
Os
micro-organismos são as principais responsáveis pelo deterioramento do leite
cru refrigerado e de seus derivados ao produzirem proteases, lipases e lecitinases, as quais hidrolisam a proteína e a gordura do leite.
Apesar de a maior parte das bactérias psicrotróficas
não resistirem ao processo da pasteurização, muitas de suas enzimas hidrolíticas são termorresistentes,
persistindo mesmo ao tratamento UHT, continuando assim em atividade, trazendo
grandes prejuízos através de suas ações, destacando variações no sabor e cheiro
em diferentes produtos (ARCURI et al., 2008). Estas bactérias também estão
relacionadas com intoxicações alimentares após o consumo do leite ou seus
derivados.
Objetivou-se
com esse trabalho isolar e caracterizar bioquimicamente a microbiota psicrotrófica, bem como seu poder de produção de enzimas
extracelulares no leite cru refrigerado, armazenado em tanques de expansão,
individuais e coletivos, de propriedades das regiões Agreste e Sertão do Estado
de Alagoas.
MATERIAL E MÉTODOS
As
amostras foram coletadas em 23 tanques individuais e 13 tanques coletivos, após
homogeneização mecânica programada, em propriedades das regiões do agreste e
sertão alagoano, no período de outubro a novembro de 2016. Foram coletadas 72
amostras de leite, duas por tanque, em tubos estéreis de 50 ml, identificadas,
acondicionadas e mantidas sob refrigeração em caixas isotérmicas com gelo,
sendo transportadas até o Laboratório de Microbiologia do Centro de Ciências
Agrárias da Universidade Federal de Alagoas.
Para
a contagem e o isolamento, diluições das amostras foram plaqueadas
em Plate Count Agar (PCA) e incubadas a 7°C por 10
dias. Após a contagem, foram isoladas cinco colônias de cada placa em ágar
Nutriente que foram incubadas a 21ºC por 24 horas para identificação. Os
resultados foram expressos como logarítimo de
unidades formadoras de colônia por grama de amostra (log10 UFCml-1).
Os
isolados bacterianos foram avaliados quanto à morfologia celular, coloração e
reação de Gram, coloração de esporos, metabolismo oxidativo e/ou fermentativo
da glicose (OF), à produção de oxidase e catalase, ao crescimento em Agar MacConkey, hidrólise da arginina, motilidade, produção de H2S
e indol em meio SIM, Ágar de ferro e Açúcar tríplice
(TSI), teste de Vermelho de metila (VM), teste de Vogues-Proskauer
(VP), teste de Citrato, hidrólise da Urease e formação de ácidos a partir de carboidratos.
As
características culturais e morfológicas dos isolados foram convertidas em uma
matriz binária de presença e ausência. Deste modo, agruparam-se os
isolados em um dendrograma de similaridade, gerado
por meio do aplicativo computacional PAST (Paleontological
Statistics Software Package
for Education and Data Analysis), utilizando o Coeficiente de Similaridade de Jaccard.
Foi
realizada a identificação das bactérias psicrotróficas
presentes no leite cru refrigerado em nível de gênero conforme o Manual Bergey de Identificação Bacteriana (1994).
Todos
os isolados obtidos foram avaliados quanto a sua capacidade de produção de
proteases, lipases, e lecitinases.
A produção destas enzimas foi avaliada pela formação de halo em torno da
colônia e o diâmetro deste foi medido para uma estimativa quantitativa. A
produção de enzimas extracelulares foi avaliada pelo teste de difusão em ágar.
A produção de proteases foi determinada em meio ágar leite (Difco,
França), suplementado com 5% de leite em pó com incubação a 21 ºC por 3 dias. A
atividade da lipase extracelular foi avaliada em meio ágar base, suplementado
com tributyrin, adicionado de solução de púrpura de bromocresol 1,5%. As placas foram incubadas a 21°C por 3
dias. A detecção de lecitinases foi determinada em
ágar TSA, suplementado com 10% de emulsão de gema de ovo, incubado a 21ºC por 3
dias.
Os
resultados obtidos no presente trabalho foram submetidos à análise estatística
descritiva (média, desvio padrão e coeficiente de variação). Para análise
estatística de contagem padrão em placas de psicotrófiocos,
foi feita a transformação logarítimica (LOG10)
a fim de normalizar a distribuição de frequência. Para avaliação da atividade
enzimática foi utilizado o delineamento inteiramente casualizado
(DIC). Os testes foram efetuados em triplicata e os dados foram analisados por
meio de análise de co-variância (ancova)
e regressão, utilizando o teste F e comparações das médias utilizando o teste
de Fischer, (p=0,01). As análises estatísticas foram realizadas com uso do
programa XLSTAT e o Excel 2007 (ADDINSOFT, 2008).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A contagem de bactérias psicrotróficas
nas amostras de leite foi similar para os dois tipos de tanques, variando entre
2,60 a 7,48 log10UFCml-1e 2,00 a 7,84 log10UFCml-1 (tanques
individuais e coletivos respectivamente). Pinto et al. (2015) encontrou
variações semelhantes, indo de 2,3 a 7,00 log10UFCml-1 em tanques
individuais, ao passo que em tanques comunitários, o intervalo de contagem
variou de 3,95 a 6,50 log10UFCml-1.
Silva
(2003) também encontrou contagens altas de bactérias psicrotróficas
em amostras de leite cru coletadas em silos industriais de processadores de
leite UHT dos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás. Nessas amostras,
as contagens de bactérias psicrotróficas variaram
entre 6,15 e 7,94 log10UFCml-1, e diferenças
significativas foram detectadas em função do Estado e da estação do ano.
Não
existem limites estabelecidos por legislação para microrganismos psicrotróficos, porém, alguns autores verificaram que
alterações bioquímicas se tornam significativas na matéria-prima com contagens
superiores a 6,00 log10 UFCml-1 (Pinto et al., 2006). No entanto, outros
relatos indicam que estas alterações podem ser percebidas com contagens
menores, a partir de 5,00 log10UFCml-1.
Apenas
a faixa de contagem de psicrotróficos não é suficiente
para se ter um panorama da condição dos tanques analisados, desse modo,
considerando os índices mostrados por Thomas e Thomas (1973), os tanques
individuais e comunitários foram separados em intervalos de contagens. O número
de isolados dentro de cada uma das faixas está expresso em termos de
porcentagem do total conforme mostra a Fig. 1.
Figura 1. Distribuição em
percentagem da contagem de bactérias psicrotróficas (log10 UFCml-1) em leite cru refrigerado em tanques individuais
e coletivos
Contagens
entre 4,00 e 5,00 log10UFCml-1, indicam a necessidade de
melhorias na higiene de ordenha e/ou na higienização dos equipamentos
utilizados. Conforme se verifica nesta pesquisa, 30,34% dos tanques individuais
e 23,08% dos coletivos estão dentro dos padrões de higiene preconizados.
Contrariamente, 38,46% dos tanques coletivos e 30,43% dos individuais
apresentaram contagens iguais ou superiores 6Log10UFCml-1, sendo um
indício definitivo de condições insatisfatórias de produção ou refrigeração do
leite na fazenda.
Das
amostras de leite cru refrigerado, foram selecionados 105 isolados bacterianos,
havendo predominância de isolados caracterizados como bactérias gram-negativas,
78% (82 isolados) e 22% (23 isolados) gram-positivos. Este
resultado está de acordo com outras pesquisas, nas quais esse grupo predomina
como contaminantes mais frequentes do leite sob refrigeração (ARCURI et al.,
2008).
Considerando a
morfologia, a maior parte foi de bastonetes, representando 76,19% dos isolados,
os quais 6,25% foram gram-positivos e 93,75% gram-negativos, enquanto
que os cocos representaram 20,95% sendo, 18,18% gram-positivos e 81,82%
gram-negativos. Outras formas totalizaram 2,86% dos isolados.
A caracterização
morfológica de colônias de bactérias, embora trabalhosa e até certo ponto
subjetiva, é importante como uma primeira aproximação para avaliação da
diversidade de populações microbianas. Predominou a forma circular e borda
lisa, no entanto, as demais características apresentaram um considerável grau de
diferenciação.Todos os isolados apresentaram colônia com diâmetro maior que 1,0 mm,
caracterizando-se também por apresentar: 1) formato circular e borda lisa
86,67%; 2) formato puntiforme e borda lisa 5,71%; 3) colônia granulosa com
borda contínua 2,86%; 4) colônia rugosa com borda irregular 2,86%, e; 5)
colônia larga com borda irregular 1,90%. Quanto à coloração da colônia, foram
obtidos isolados de coloração branca leitosa (86,28%), amarela (8,00%), bege
(2,86) e cinza (2,86%). Para os parâmetros elevação e transparência da colônia,
os isolados apresentaram distribuição de 86,68% para elevação convexa, 11,42%
côncava e 1,90% para elevação achatada, ainda 54% são colônias opacas e 46% são
colônias translúcidas.
Os testes que tratam do metabolismo bacteriano
são considerados os mais importantes, visto que na maioria das vezes estão
relacionados com a presença de enzimas específicas. A pesquisa de catalase e
oxidase é indispensável na identificação bacteriana. As duas enzimas estão
relacionadas com a proteção contra as formas reativas de oxigênio. A oxidase ou
superóxido dismutase (SOD) converte o oxigênio ionizado presente em todos os
aeróbios, anaeróbios facultativos e alguns aerotolerantes.
De acordo com a resposta ao teste, as bactérias gram-negativas foram
classificadas como: aeróbios estritos (catalase+; oxidase+) 13%, anaeróbios
facultativos, que utilizam oxigênio como receptor final de elétrons (catalase+;
oxidase-), 13%; anaeróbios estritos (catalase-; oxidase-), 65%; anaeróbios
facultativos (catalase-; oxidase+)9% que fermentam e não utilizam oxigênio como
receptor final de elétrons. Enquanto que as
gram-positivas, 26% se caracterizaram como anaeróbios facultativos, que
utilizam oxigênio como receptor final de elétrons e 74% aeróbios estritos.
A frequência
e o percentual dos gêneros verificados nesta pesquisa podem ser observados na
Tab. 1. Dentre os isolados identificados, Pseudomonas sp. foi o gênero
predominante, com 46 isolados (43,81%), seguido por Enterobacter e Streptococcus,15 (14,29%) e 12 isolados
(11,43%), respectivamente.
Com
relação aos gêneros bacterianos, foi observado similaridade de 73,68% entre os dois
tipos de tanque (Coeficiente de Jaccard). A Fig. 2
apresenta a distribuição dos gêneros por tipo de tanque.
Arcuri et al. (2008), verificaram que de 308
isolados de microrganismos psicrotróficos, dos 250
que foram identificados como gram-negativos, a maioria foi identificada como Pseudomonas
spp., representando 43,2% (108) dos isolados e
destas, 87,0% (94) foram da espécie P.
fluorescens.
O mesmo ocorreu com experimento conduzido por Pinto et al. (2006) os quais relataram que
dos 153 isolados, 66 (43,14%) pertenciam ao gênero Pseudomonas spp.
Também
foi alta a contagem de bactérias do gênero Enterobacter sp. 15 (14,28%), verificando-se
ainda outra enterobacteriaceae, Shigella sp. 01 (0,95%),
podendo-se justificar seus isolamentos, pelo fato dos tanques de resfriamento
estarem próximos aos estábulos, já que estas bactérias já foram isoladas das
moscas de estábulo (Stomoxys calcitrans)
por Moraes et al. (2004). Ávilla e Gallo (1996), em seu estudo, também identificaram 14
(46,68%) de 30 isolados bacterianos como sendo do gênero Enterobacter sp., os quais foram
identificados também por Nörnberg et al. (2010) em
estudo no Rio Grande do Sul, com contagens da ordem de 30% dos isolados
bacterianos gram-negativos em leite cru refrigerado.
Tabela
1. Frequência e percentual de
gêneros e bactérias psicrotróficas identificadas,
isoladas de leite cru a partir de tanques de refrigeração localizados no
Agreste e Sertão de Alagoas* |
||||||
|
Gêneros |
Número de
isolados |
%de ocorrência |
Grupo * * |
||
Gram - |
Pseudomonas |
46 |
43,81 |
|
04 |
|
Enterobacter |
15 |
14,29 |
|
05 |
||
Aeromonas |
05 |
4,76 |
|
05 |
||
Burkholderia |
08 |
7,62 |
|
04 |
||
Acinetobacter |
04 |
3,81 |
|
04 |
||
Shigella |
01 |
0,95 |
|
05 |
||
Não
identificado |
03 |
2,86 |
|
- |
||
Gram + |
Streptococcus |
12 |
11,43 |
|
17 |
|
Corynebacterium |
03 |
2,86 |
|
20 |
||
Enterococcus |
03 |
2,86 |
|
17 |
||
Micrococcus |
03 |
2,86 |
|
17 |
||
Bacillus |
02 |
1,90 |
|
18 |
||
|
Total |
105 |
100 |
|
|
|
*Testes
bioquímicos, **Conforme Manual Bergey |
||||||
Figura
2.
Contagem de isolados por gêneros bacterianos psicrotróficos, presentes no leite cru refrigerado coletado
a partir de tanques de refrigeração localizados no Agreste e Sertão de Alagoas
por tipo de tanque (individual e coletivo)
Apesar
do baixo número de isolados, o gênero Shigella sp., assume grande importância por ser altamente patogênico, sendo
responsável pela shigelose ou doença bacilar,
infecção alimentar que acomete principalmente crianças entre um e 10 anos
(MARQUES, 2008). Água contaminada com material fecal e os manipuladores, são
responsáveis por sua presença em alimentos, denotando falhas nas medidas de
higiene.
A
presença de Enterococcus sp.
é comum na microbiota do leite cru, contudo, no Brasil, não são definidos
padrões quanto a sua quantificação no produto. No presente estudo obteve-se 03
(2,86%) isolados bacterianos pertencentes a este gênero, indicando falhas na
obtenção higiênica do leite por ser um microrganismo indicador de contaminação
fecal nos alimentos, multiplicando-se no ambiente, e abundantes nas fezes
animais (MENEZES et al., 2015). Enterococcus sp. também
foi demonstrado por outros autores em amostras de leite, como os relatados por
Holm et al. (2004), que verificaram contagens de 5,00 log10UFCml-1 isolados
de tanques na Dinamarca, e Tebaldi et al. (2008), que
isolaram estes microrganismos em leite cru de propriedades leiteiras no
município de Boa Esperança – MG, com contagens chegando até 7,23 log10UFCml-1.
Também
foram isolados microrganismos termodúricos, aqueles
com capacidade de sobreviverem aos tratamentos térmicos (pasteurização), dentre eles: Streptococcus
sp. 12 (11,43%), Corynebacterium sp.,
Enterococcu ssp., e Micrococcus sp., 3 (2,86%) cada,
além de bactérias do gênero Bacillus sp., 2 (1,90%), sendo de grande
importância por desenvolverem ação deteriorante do leite pasteurizado, e por
serem termorresistentes, continuando com a produção
de enzimas hidrolíticas que podem estar associadas
fortemente à diminuição da vida útil do leite e seus derivados.
Várias
espécies de Bacillus são capazes de
produzir esporos altamente resistentes ao calor. Segundo Scheldeman
et al. (2006), alguns bacilos sobrevivem ao tratamento UHT (2-5s, 140-145ºC),
desempenhando um papel na deterioração do leite, acarretado pelo seu
desenvolvimento posterior ao tratamento térmico. A deterioração do leite por
espécies de Bacillus é proporcionada
por suas enzimas proteolíticas e lipolíticas termoestáveis.
Ribeiro
Júnior et al. (2015), verificaram contagens médias de 3,54 log10UFCml-1 de
termodúricos psicrotróficos
ao analisarem 20 amostras de leite cru refrigerado no norte do Paraná. Pinto et al. (2015), também isolaram
bactérias dos gêneros Enterococcus sp. e Bacillus sp. de
amostras de leite cru refrigerado.
A
presença de bactérias do gênero Bacillus em tanques de refrigeração
desperta o interesse não só pela característica deteriorante, mas também pela
possibilidade de ocorrerem espécies patogênicas como Bacillus cereus e Bacillus subtilis
que podem produzir toxinas
responsáveis por quadros de gastroenterites em seres humanos (Jay, 2005).
Streptococcus e Corynebacterium no leite podem indicar a presença de
animais doentes no rebanho. Segundo Bizari (2002),
90% das mastites são ocasionadas por bactérias do gênero Streptococcus. Estes microrganismos podem ser encontrados em leite
proveniente de vacas com mastite.
Ainda
foram isoladas bactérias gram-negativas patogênicas dos gêneros Acinetobacter sp.
4 (3,81%), Burkholderia sp.
8 (7,61%) e Aeromonas sp. 5 (4,76%), como verificados em
estudo por Pinto et al. (2015), Nörnberg, (2009) e Arcuri et al. (2008), onde os autores demonstraram seus
altos poderes deteriorantes através das atividades lipolíticas e proteolíticas.
Carneiro
e Rossi Júnior (2006), analisando possíveis pontos de contaminação e
disseminação de bactérias do gênero Aeromonas sp. na
linha de produção, constataram ser positivas
em 90% das amostras de leite cru, 30% das de leite da saída do pasteurizador,
40% nas de leite do tanque de abastecimento da máquina de empacotar e 25% das
amostras de leite pronto para consumo. Ainda segundo os autores, este gênero
possui capacidade de sobreviver e multiplicar em alimentos mantidos sob
refrigeração, como o leite, e, várias cepas são capazes de produzir toxinas.
Sua presença em leite pasteurizado, particularmente no tipo A, pode conferir a
este produto um sério risco à saúde.
A análise estatística do número de isolados proteolíticos,
lipolíticos e lecitinolíticos, não detectou
diferenças significativas entre tanques individuais e coletivos, (teste F< 0,0001), indicando que não houve dependência entre o número
de isolados bacterianos produtores de enzimas e o tipo de tanque.
Em sua grande
maioria, os psicrotróficos são eliminados pelos
tratamentos térmicos de beneficiamento do leite. A relevância desses
microrganismos encontra-se na sua alta capacidade de síntese de enzimas
exógenas ou extracelulares (proteases e lipases) termoestáveis, frente aos
diferentes binômios empregados no
beneficiamento do leite. A presença de psicrotróficos
em concentrações superiores a 6,00 log10UFCml-1 é correlacionada com
a produção dessas enzimas em concentrações significativas e com os produtos
resultantes da proteólise e lipólise (VIDAL-MARTINS et al., 2005).
Quanto à produção
de enzimas, não foram detectadas diferenças significativas entre isolados
gram-positivos e gram-negativos. Os psicrotróficos
gram-positivos identificados neste trabalho apresentaram potencial para
produção de proteases e lipases, evidenciando suas características
deterioradoras, verificando-se que 15 (65,21%) isolados testados produziram
proteases e 9 (39,13%), produziram lípases. Lecitinase
foi expressa por 4 (17,39%) isolados. Quanto aos gram-negativos verificou-se
que 65 (79,27%) produziram proteases, 62 (75,61%) produziram lipases e 47
(57,32 %) lecitinase. A produção de lecitinase foi observada em menor número em ambos os
grupos.
Diversos estudos
corroboram com esses resultados, dentre eles os citados por Arcuri
(2003), que afirmam que as proteases e as lípases estão diretamente associadas
à deterioração do leite e derivados, tendo ainda a lecitinase
também relacionada, porém em menor escala.
A
Tabela 2 apresenta o percentual de isolados produtores de enzimas em cada
gênero. Dentre os isolados gram-positivos, bactérias dos gêneros Bacillus sp., Corynebacterium
sp. e Enterococcus sp., desenvolveram
atividades proteolíticas, lipolíticas e lecitinolíticas,
variando apenas suas proporções. Em contra-ponto,
isolados do gênero Streptococcus sp., apresentaram apenas atividade
proteolítica, enquanto que os Micrococcus sp., foram capazes de
ações proteolíticas e lipolíticas. Diferentemente do que foi relatado por Pinto
et al. (2015), que verificaram em sua pesquisa que as bactérias
gram-positivas foram predominantemente proteolíticas, apresentando baixas
proporções de isolados que produziram lipases e lecitinases.
Ribeiro Júnior et al. (2015),
em estudo com bactérias gram-positivas termodúricas,
utilizando 347 colônias isoladas, demonstraram que 142 (40,1%) apresentaram
atividade enzimática de proteólise.
Tabela 2. Produção de enzimas
extracelulares por bactérias psicrotróficas
isoladas de leite cru refrigerado, coletado a partir de tanques de
refrigeração localizados no Agreste e Sertão de Alagoas |
||||||||
Gram+ |
Gêneros |
% de isolados produtores de enzimas |
||||||
Protease |
Lipase |
Lectinase |
||||||
Streptococcus |
41,66 |
- |
- |
|||||
Corynebacterium |
100,00 |
100,00 |
66,67 |
|||||
Enterococcus |
100,00 |
66,67 |
66,67 |
|||||
Micrococcus |
66,67 |
66,67 |
- |
|||||
Bacillus |
100,00 |
100,00 |
100,00 |
|||||
Gram - |
Pseudomonas |
97,82 |
93,47 |
82,60 |
|
|||
Enterobacter |
33,30 |
- |
- |
|
||||
Aeromonas |
100,00 |
100,00 |
40,00 |
|
||||
Burkholderia |
87,50 |
87,50 |
75,00 |
|
||||
Acinetobacter |
- |
50,00 |
- |
|
||||
Shigella |
- |
- |
- |
|
||||
Não
identificado |
100,00 |
100,00 |
33,33 |
|
||||
Dentre
os isolados gram-negativos, os gêneros Pseudomonas
sp., Aeromonas
sp. e Burkholderia sp., apresentaram o
maior número de isolados com atividade enzimática (Tab. 2). Entretanto, Enterobacter sp.
e Acinetobacter sp.,
apresentaram apenas atividade proteolítica e lipolítica, respectivamente,
contrastando com bactérias do gênero Shigella sp., que não desenvolveu nenhuma atividade
enzimática. Wang e Jayarao (2001), em seus estudos
também observaram formação de proteases por Pseudomonas
sp. em 80,91% dos isolados
bacterianos, e 58% destes tiveram atividade lipolítica. De maneira distinta,
após analisarem 33 isolados do gênero Pseudomonas
sp., Hantsis-Zacharov e Halpern
(2007), verificaram que a lipólise foi maior entre eles, atingindo uma
proporção de 74%.
No presente
estudo, o número de isolados bacterianos psicrotróficos
proteolíticos e lipolíticos, foi maior em tanques individuais, contrastando com
o relatado por Catanio et al. (2013), os quais
verificaram que estes haviam sido em maior número nos tanques coletivos. Os
autores ainda afirmam que um reduzido número de bactérias psicrotróficas,
é suficiente para a produção de enzimas extracelulares, maiores responsáveis
pelas alterações dos produtos lácteos.
Neste
estudo, os isolados do gênero Pseudomonas
sp. apresentaram atividades de proteólise relacionadas com atividades
lipolíticas e de lecitinase, fato também verificado
por Pinto et al. (2015).
A avaliação quantitativa da produção de proteases, lipases e lectinases, que é expressa pela hidrolise da caseína e dos
lipídios do leite através da formação do halo em volta da colônia de
crescimento, pode ser visualizada na Tab. 3. Conforme se verifica, os isolados
do gênero Bacillus apresentaram
maiores halos para as três enzimas, seguido por Pseudomonas e Corynebacterium, maiores halos e, portanto, maior potencial
deteriorador.
Tabela 3. Atividade
proteolítica, lipolítica e lecitinolítica por
bactérias psicrotróficas isoladas de leite cru
refrigerado, coletado a partir de tanques de refrigeração localizados no
Agreste e Sertão de Alagoas, incubadas a 21ºC* |
|||||||||
Gêneros |
Prot24 |
Prot48 |
Prot72 |
Lip24 |
Lip48 |
Lip 72 |
Lec24 |
Lec48 |
Lec72 |
Bacillus |
10,144 a |
18,787 a |
25,204 a |
9,644 a |
11,847 a |
16,759 a |
3,333 a |
7,778 a |
15,921 a |
Pseusomonas |
5,364 b |
13,213 b |
19,782 ab |
2,378 cd |
13,167 a |
18,762 a |
0,703 b |
1,787 bc |
3,571 bc |
Corynebacterium |
3,381 cd |
9,985 bc |
15,235 bc |
2,881 bc |
15,949 a |
15,420 a |
0,000 b |
1,926 bc |
4,196 b |
Bukholderia |
4,481 bc |
7,255 cd |
12,796 c |
3,731 bc |
4,611 bc |
4,741 bc |
0,583 b |
1,847 bc |
3,204 bc |
NI |
3,301 cd |
8,824 cd |
13,296 c |
4,023 b |
6,486 b |
7,963 b |
0,667 b |
1,000 cd |
1,079 cd |
Enterococcus |
1,285 e |
6,127 cde |
11,877 c |
1,230 de |
4,051 bc |
8,802 b |
0,667 b |
2,852 b |
4,471 b |
Aeromonas |
3,323 cd |
4,846 de |
5,896 d |
1,023 de |
2,553 bc |
4,141 bc |
0,667 b |
0,756 cd |
1,279 cd |
Micrococcus |
2,063 de |
3,127 ef |
4,210 d |
0,785 de |
3,384 bc |
3,914 bc |
- |
- |
- |
Acitenobacter |
0,190 e |
0,380 f |
0,630 d |
1,023 de |
1,403 c |
2,991 bc |
- |
- |
- |
Eenterobacter |
0,190 e |
0,491 f |
1,096 d |
0,068 e |
0,264 c |
- |
- |
- |
- |
Streptococcus |
0,190 e |
0,380 f |
0,630 d |
0,023 e |
0,153 c |
- |
0,017 b |
- |
- |
Shigella |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
- |
Pr> F |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
< 0,0001 |
*Médias
seguidas de mesma letra não diferem estatisticamente pelo teste Fischer
(P<0,01) |
CONCLUSÃO
No
leite cru refrigerado do Agreste e Sertão de Alagoas há presença de altas
contagens de bactérias psicotróficas, indicando condições
higiênico-sanitárias insatisfatórias.
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