Geleias de melão com casca e enriquecida com sementes de mandacaru

 

Melon jellies in shell and enriched with mandacaru seeds

 

Gelatinas de melón con cáscara y enriquecidas con semillas de mandacaru

 

Carolaine Gomes dos Reis1; Rossana Maria Feitosa de Figueirêdo2; Alexandre José de Melo Queiroz3; Lumara Tatiely Santos Amadeu4; Thalis Leandro Bezerra de Lima5; Patrícia da Silva Costa6

 

1Mestranda em Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, carolainetecalimentos@gmail.com; 2Professora no Centro de Tecnologia e Recursos Naturais, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, rossanamff@gmail.com; 3Professor no Centro de Tecnologia e Recursos Naturais, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, alexandrejmq@gmail.com; 4Mestranda em Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, lumaratatiely1993@gmail.com; 5Mestrando em Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, tthallisma@gmail.com; 6Doutoranda em Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, Paraíba, patriciagroambiental@gmail.com.

 

Recebido: 02/03/2020; Aprovado: 26/09/2020

 

Resumo: A elaboração de geleias com a adição de resíduos do processamento de frutas, como cascas e sementes, pode proporcionar a redução de impactos ambientais e o enriquecimento nutricional dos produtos. Com vistas ao aproveitamento dos resíduos do processamento do melão e do mandacaru, assim como minimizar as perdas pós-colheita dessas frutas, objetivou-se a elaboração e caracterização de três formulações de geleias de melão cv. ‘Orange Flesh’, acrescidas da casca do melão e de sementes de mandacaru. As geleias foram caracterizadas quanto aos parâmetros físico-químicos (pH, acidez total titulável, açúcares totais, açúcares redutores e não redutores, sólidos solúveis totais, teor de água, atividade de água e cinzas) e compostos bioativos (ácido ascórbico, compostos fenólicos totais, antocianinas totais e flavonoides totais). Das geleias elaboradas observou-se que a formulação com adição das cascas do melão cozidas (F3), foi a que obteve os maiores teores dos compostos bioativos, como os compostos fenólicos 39,98 mg 100-1 g-1, contudo as formulações F2 (geleia de melão com 1% de sementes de mandacaru) e F1 (geleia de melão) obtiveram bons resultados. A polpa de melão, suas cascas e as sementes de mandacaru mostraram-se como alternativas viáveis na produção de geleias. A incorporação das sementes de mandacaru e das cascas do melão contribuiu para a funcionalidade e atratividade das geleias e serve como alternativa de aproveitamento de resíduos.

 

Palavras-chave: Processamento; compostos bioativos; aproveitamento integral; co-produtos.

 

Abstract: The production of jams with the addition of residues from fruit processing, such as peels and seeds, can reduce environmental impacts and nutritionally enrich the products. With a view to using the residues from the melon and mandacaru processing, as well as minimizing the post-harvest losses of these fruits, the objective was to develop and characterize three formulations of cv. ‘Orange Flesh’, plus melon peel and mandacaru seeds. The jellies were characterized according to the physical-chemical parameters (pH, total titratable acidity, total sugars, reducing and non-reducing sugars, total soluble solids, water content, water and ash activity) and bioactive compounds (ascorbic acid, total phenolic compounds, total anthocyanins and total flavonoids). From the elaborated jellies it was observed that the formulation with the addition of the cooked melon peels (F3), was the one that obtained the highest levels of bioactive compounds, such as phenolic compounds 39.98 mg 100-1 g-1, however the formulations F2 (melon jelly with 1% mandacaru seeds) and F1 (melon jelly) obtained good results. The melon pulp, its peels and mandacaru seeds proved to be viable alternatives in the production of jams. The incorporation of mandacaru seeds and melon peels contributed to the functionality and attractiveness of the jellies and serves as an alternative for using waste.

 

Key words: Processing; bioactive compounds; full use; co-products.

 

Resumen: La producción de mermeladas con la adición de residuos del procesamiento de frutas, como cáscaras y semillas, puede reducir los impactos ambientales y enriquecer nutricionalmente los productos. Con el fin de aprovechar los residuos del procesamiento de melón y mandacaru, así como minimizar las pérdidas poscosecha de estos frutos, el objetivo fue desarrollar y caracterizar tres formulaciones del cv. "Carne de naranja", más piel de melón y semillas de mandacaru. Las jaleas se caracterizaron en términos de parámetros físico-químicos (pH, acidez total titulable, azúcares totales, azúcares reductores y no reductores, sólidos solubles totales, contenido de agua, actividad de agua y cenizas) y compuestos bioactivos (ácido ascórbico, compuestos fenólicos totales , antocianinas totales y flavonoides totales). De las jaleas elaboradas se observó que la formulación con la adición de las cáscaras de melón cocidas (F3), fue la que obtuvo los niveles más altos de compuestos bioactivos, como los compuestos fenólicos 39,98 mg 100-1 g-1, sin embargo las formulaciones F2 (jalea de melón con 1% de semillas de mandacaru) y F1 (jalea de melón) obtuvieron buenos resultados.La pulpa de melón, sus cáscaras y semillas de mandacaru resultaron ser alternativas viables en la producción de mermeladas. La incorporación de semillas de mandacaru y cáscaras de melón contribuyó a la funcionalidad y atractivo de las jaleas y sirve como una alternativa para el uso de desechos.

 

Palabras clave: Procesamiento; compuestos bioactivos; uso completo; coproductos.

 

INTRODUÇÃO

 

O melão (Cucumis melo L.) é dentre as cucurbitáceas, a mais cultivada no Brasil (540.229 t), exportando em 2018 197,60 mil toneladas de frutos frescos, recebendo destaque para a região Nordeste com os maiores produtores, os estados do Rio Grande do Norte (338.665 t) e Ceará (70.593 t), correspondendo juntos a mais de 75% da produção nacional (ANUÁRIO BRASILEIRO DE HORTI E FRUTI, 2018). A grande produção dessa região deve-se às condições climáticas que beneficiam o cultivo com altas temperaturas, baixa precipitação e elevada exposição solar (OLIVEIRA et al., 2019). O melão cv. ‘Orange Flesh’ possui grande potencialidade de produção, fazendo parte do grupo dos inodoros, tem formato arredondado, casca lisa de cor amarela a esbranquiçada, com polpa de cor alaranjada e de sabor doce (FIGUEIRÊDO et al., 2017).

Assim como a maioria das frutas, tem curta vida útil, devido principalmente ao seu alto teor de água, o que induz a perdas nas etapas de transporte, armazenamento e comercialização. Diante dessas características, existe a necessidade de se desenvolver produtos e processos que proporcionem a minimização dessas perdas (BESSA et al., 2018). A sua utilização na elaboração de produtos alimentícios, bem como a utilização dos resíduos gerados no processamento (sementes e cascas), são uma alternativa para redução dos impactos ambientais ocasionados pelo descarte da matéria orgânica, bem como uma possibilidade de diversificação de produtos no mercado (ALVES et al., 2019).

         Dessa forma, a produção de geleias apresenta-se como uma boa alternativa, pois atua na redução do desperdício, devido à utilização de frutas consideradas inadequadas para venda na forma in natura (SOUZA et al., 2019). A denominação geleia é atribuída ao produto preparado à base de suco de fruta, utilizando ingredientes na quantidade adequada, os quais proporcionam um produto final na forma de gel, ocasionada pelo equilíbrio entre pectina, acidez e açúcar (SANTOS; OLIVEIRA, 2015). Segundo Storckl et al. (2013) a incorporação de cascas e sementes de melão em geleias mostraram-se promissoras, principalmente quanto a fibras, proteínas e polifenóis. A utilização de tais partes em produtos alimentícios justifica-se pelo valor nutricional e baixo teor calórico, além do reaproveitamento de resíduos.

O mandacaru (Cereus jamacaru) é uma espécie habitualmente encontrada na região Nordeste do Brasil, bastante resistente às condições climáticas, como os períodos de estiagem (DANTAS; OLIVEIRA, 2019). O fruto possui epicarpo avermelhado, polpa comestível de coloração branca e com inúmeras sementes pretas, que apesar de insípidas são comestíveis (ORTIZ; URBANO; TAKAHASHI, 2019; SANTOS NETO et al., 2019), além desementes ricas em carboidratos, com alto teor de proteínas, lipídeos, fibras e minerais (BAHIA et al., 2010; SILVA et al., 2019), o que ampara sua utilização em formulações de produtos alimentícios.

Com vistas ao aproveitamento dos resíduos do processamento do melão e do mandacaru, assim como minimizar as perdas pós-colheita dessas frutas, objetivou-se a elaboração e caracterização de três formulações de geleias de melão cv. ‘Orange Flesh’, acrescidas da casca do melão e de sementes de mandacaru.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

A pesquisa foi realizada no Laboratório de Armazenamento e Processamento de Produtos Agrícolas (LAPPA), da Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola, no Centro de Tecnologia e Recursos Naturais (CTRN) da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), campus Sede.

Os melões da variedade ‘Orange Flesh’ foram adquiridos no comércio local de Campina Grande – PB, sendo os mesmos provenientes de cultivo em Mossoró – RN e os mandacarus foram colhidos no município de Campina Grande, onde ambos foram selecionados pelo grau de maturação uniforme, tomando como critério a coloração da casca.

Após a aquisição dos frutos, os mesmos foram transportados para o laboratório, sendo sanitizadas com solução de hipoclorito de sódio a 200 ppm por 15 min (para os melões) e 5 min (para os mandacarus), sendo posteriormente cortados em pedaços para facilitar a separação da polpa, sementes e cascas. Em seguida, a polpa foi homogeneizada em liquidificador doméstico e peneirada para refinamento da polpa. As cascas também foram trituradas em liquidificador doméstico com a finalidade de reduzir o tamanho das partículas e em seguida cozidas no vapor por 30 minutos com a finalidade de amaciamento. As sementes do mandacaru foram separadas da polpa através de peneiramento e lavagem em água corrente.

Para a elaboração das formulações utilizou-se a metodologia de Krolow (2005) com adaptações. As geleias produzidas foram do tipo extra que se caracteriza por ter 50 partes de polpa e 50 partes de açúcar (50:50 m/m). Foram elaboradas três formulações com concentração dos ingredientes constantes, como apresentado na Tabela 1 e codificadas de: (F1) geleia de melão; (F2) geleia de melão com sementes de mandacaru; e (F3) geleia de melão com suas cascas cozidas.

 

Tabela 1. Ingredientes e suas concentrações utilizadas na elaboração de geleias de melão ‘Orange Fresh’ tipo extra.

Ingredientes

Concentração (%)

F1

F2

F3

Polpa de melão refinada

50

50

50

Açúcar cristal

50

50

50

Pectina

0,5

0,5

0,5

Ácido cítrico

0,760

0,654

0,713

Água

20

20

20

Cascas de melão cozida

-

-

10

Sementes de mandacaru

-

1

-

 

         Inicialmente pesou-se separadamente o equivalente a 50% da polpa e 50% do açúcar, em seguida, a partir da massa total destes dois ingredientes, pesou-se a massa equivalente a 0,5% de pectina, 20% de água, 10% de cascas de melão cozidas e 1% sementes de mandacaru (Tabela 1). A concentração do ácido cítrico foi dependente da correção do pH, uma vez que a mistura do sistema fruta, pectina e açúcar não foi capaz de suavisar o pH da amostra, a adição do acidulante faz-se necessária, visto que é necessário níveis baixos de pH para assim obter a geleificação adequada, bem como realçar o sabor da fruta, além de também possuir papel importante na conservação (RIBEIRO et al., 2016).

Para o preparo da geleia F1, inicialmente adicionou-se à polpa de melão refinada, 1/2 do açúcar pesado e a água, homogeneizando-se até completa diluição. Fez-se então a medida do pH da mistura e corrigiu-se com ácido cítrico para a faixa de 3,25–3,36.

Posteriormente a mistura seguiu para cocção em panela de aço inoxidável, em chapa elétrica sob constante agitação, até atingir temperatura de 65-70 °C, onde imediatamente adicionou-se lentamente a pectina misturada com um pouco de açúcar, com a finalidade de não aglomerar a mistura, a qual permaneceu sob cocção por 3 a 4 min adicionando-se em seguida o restante do açúcar. O processo de cozimento prosseguiu até a geleia atingir o teor de sólidos solúveis na faixa de 65 a 70 °Brix.

Após a cocção as formulações foram envasadas em potes de vidro esterilizados e as embalagens invertidas por 5 min para completa esterilização e vedação das tampas. As geleias embaladas foram resfriadas em temperatura ambiente e armazenadas sob refrigeração a 5 °C (UR 80-90%) até realização das análises. 

Para a elaboração das formulações F2 (com casca cozida) e F3 (com sementes de mandacaru) seguiu-se o mesmo procedimento (F1), adicionando-se as cascas e as sementes no início, juntamente com a polpa refinada e parte do açúcar.

A polpa de melão refinada e as geleias elaboradas foram analisadas, em triplicata, quanto os seguintes parâmetros físico-químicos: pH; teor de água; sólidos totais; cinzas; acidez total titulável; e teor de sólidos solúveis totais (°Brix), determinadas de acordo com as metodologias do Instituto Adolfo Lutz (IAL, 2008). Açúcares redutores, açúcares não redutores e açúcares totais segundo Lane-Eynon (1923). A atividade de água (aw) foi determinada por leitura direta na amostra a 25 °C em analisador de atividade de água (Aqualab – modelo 3TE – Decagon).

O teor de ácido ascórbico foi determinado pela metodologia da AOAC (1997) modificada por Benassi e Antunes (1998) a qual se baseia na redução do 2,6 diclorofenolindofenol-sódio (DCFI) pelo ácido ascórbico, utilizando o ácido oxálico como solução extratora. Para a determinação dos compostos fenólicos totais utilizou-se a metodologia descrita por Waterhouse (2006) e para determinação de flavonoides e antocianinas utilizou-se metodologia de Francis (1982).

O delineamento adotado foi o inteiramente casualizado (DIC) com três repetições e na análise estatística. Empregou-se à análise de variância (ANOVA), observando a significância do teste F e para a comparação entre médias usou-se o teste de Tukey a 5% de probabilidade (p < 0,05), através do programa computacional Assistat® versão 7.7 (SILVA; AZEVEDO, 2016).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

         Os parâmetros avaliados na caracterização físico-química e compostos bioativos da polpa de melão cv. ‘Orange Flesh’ refinada, encontram-se dispostos na Tabela 2, com suas respectivas médias e desvios padrão.

         O produto apresentou elevado teor de água, atividade de água, baixa acidez (pH) e acidez total titulável, demonstrando assim ser um produto altamente perecível, propício ao desenvolvimento de micro-organismos, indicando ser necessária a adoção de algum tipo de procedimento de conservação para o ampliação da vida útil (FRANCO; LANDGRAF, 2005).

 

Tabela 2. Caracterização físico-química e compostos bioativos da polpa de melão cv. ‘Orange Flesh’ refinada.

Parâmetros

Média e desvio padrão

Teor de água (%)

91,62 ± 0,06

Sólidos totais (%)

8,38 ± 0,06

Atividade de água (aw) a 25 °C

0,993 ± 0,000

Cinzas (%)

0,50 ± 0,01

pH

6,20 ± 0,01

Acidez total titulável - ATT (% ácido cítrico)

0,06 ± 0,002

Sólidos Solúveis Totais - SST (°Brix)

7,00 ± 0,00

Relação SST/ATT

116,67 ± 0,30

Açúcares totais (% glicose)

5,98 ± 0,06

Açúcares redutores (% glicose)

4,16 ± 0,00

Açúcares não redutores (% sacarose)

1,74 ± 0,06

Ácido ascórbico (mg 100-1 g-1)

0,35 ± 0,01

Compostos fenólicos totais (mg EAG.100-1 g-1)

29,16 ± 010

Flavonoides (mg 100-1 g-1)

1,10 ± 0,01

Antocianinas (mg 100-1 g-1)

0,12 ± 0,01

EAG – equivalente ácido gálico

 

O teor de água e de cinzas da polpa de melão foram semelhantes aos valores reportados na Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TACO, 2011), que menciona teores de 91,3% e 0,5%, respectivamente. O alto teor de água implica na perecibilidade do produto assim como observado por Antunes et al. (2017) e por Bramont et al. (2018) ao analisarem polpas de frutas. O teor de cinzas detectado é um indicativo de que como a maioria das frutas, o melão é pobre em minerais, assim como observado por Lima et al. (2015) para 15 amostras de polpas de frutas valores que variaram entre 0,19 a 0,60% de cinzas.

A alta atividade de água detectada na polpa refinada (0,993) implica na facilidade de deterioração do produto, demandando a utilização de processos que proporcionem a sua conservação. Comumente, são determinadas elevadas atividades de água nas polpas de frutas (> 0,95), como na polpa de araticum (0,98) (MORAIS et al., 2017) e de cupuaçu (0,99) (DIAS et al., 2019).

De acordo com o pH, a polpa de melão é classificada como um alimento pouco ácido (pH > 4,5) diferente da maioria das frutas que são classificadas como alimentos ácidos (pH entre 4,0-4,5) (FRANCO; LANDGRAF, 2005). Valores próximos para esse parâmetro foram reportados por Dalastra et al. (2016) para os melões Amarelo (6,43) e Pele de Sapo (6,49), confirmando que é uma característica desta fruta. Por outro lado, apresentaram-se superiores aos reportados por Carmo et al. (2017) para cinco variedades de melões (Valenciano Amarelo, Pele de Sapo Juazeiro, Cantaloupe Harper, Ashira Amarelo e Gália Néctar) os quais, em média, obtiveram pH de 5,30.

A acidez total titulável da polpa de melão (0,06% ácido cítrico) obteve valor inferior quando comparada a mesma espécie de melão e outras como o amarelo e o rendilhado, os quais variaram entre 0,17 a 0,24% (DALASTRA et al., 2016), além do meloeiro amarelo híbrido Gradial, o qual apresentou 0,19% (PINTO et al., 2019). Por outro lado, valores semelhantes foram reportados por Bellon et al. (2015) com 0,079% no melão-andino.

O teor dos sólidos solúveis totais (7 °Brix) da polpa de melão apresentou-se inferior ao valor padrão para as exportações de melão in natura que dependendo do cultivar varia de 9-13 oBrix (PINTO et al., 2019). Apesar disso, Guimarães et al. (2020) obtiveram valores de sólidos solúveis totais inferiores (4,5-5,0 oBrix) para o melão Sunrise utilizando diferentes tipos de adubação.

         A relação SST/ATT (116,67) revela quimicamente que o melão está no estágio de maturação maduro, com sabor adocicado (FACHINELLO et al., 2008). Valor superior desta relação foi detectado por Santos et al. (2019) para polpa de melão congelada (SST/ATT = 125), ressaltando que durante o amadurecimento das frutas os ácidos orgânicos são degradados pelo aumento da concentração das enzimas, reduzindo o sabor ácido e aumentando o valor da relação SST/ATT (COSTA et al., 2017).

         Foram detectados teores de açúcares totais de 5,98% glicose, encontrando-se a predominância dos redutores (4,16% glicose) em relação aos não redutores (1,74% sacarose). Valores superiores foram observados por Santos e Carvalho (2016) para os AR da polpa de melão coroá (9,04%), por Santos et al. (2019) para os AT da polpa congelada de melão (10,78%) e por Véras et al. (2019) em melões gália cv. Solarnet com teores médios durante o armazenamento de 8,1% (atmosfera normal) e 8,3% (atmosfera modificada). Estas diferenças podem estar relacionadas ao estádio de maturação dos frutos, variedade e condições de processamento e armazenamento.

         Observa-se um teor de ácido ascórbico de 0,35 mg 100-1 g-1, estando abaixo do encontrado na polpa de melão caroá concentrada (1,76 mg 100-1 g-1) analisada por Jesus e seus colaboradores (2016), bem como para outras frutas como umbu (3,36 a 5,47 mg 100-1 g-1) (BASTOS et al., 2016) e da polpa de abacaxi com hortelã (1,20 mg 100-1 g-1) (LIMA et al., 2015). Assim observa-se que vários fatores podem influenciar o parâmetro como o armazenamento, diferentes variedades de frutas, propriedades, genética, entre outras variáveis.

         O teor dos compostos fenólicos totais (29,16 mg EAG 100-1 g-1) foi superior ao valor reportado por Brito (2017) para a polpa do melão Orange (22,6 mg EAG 100-1 g-1). O teor de flavonoides e antocianinas detectados (1,10 e 0,12 mg 100-1 g-1, respectivamente) foram próximos ao reportado por Oliveira (2013) para o melão Orange (1,27 mg 100-1 g-1 e 0,15 mg 100-1 g-1). Esses valores são importantes nos alimentos, pois esses compostos bioativos influenciam nas propriedades nutricionais e sensoriais, além de atuarem como antioxidantes, reduzindo os radicais livres, o que consequentemente auxilia na redução de riscos de doenças cardíacas (ABREU et al., 2019; GUIMARÃES et al., 2020).

         Dos resultados apresentados dos parâmetros físico-químicos e compostos bioativos da polpa de melão observa-se que as divergências com relação aos valores da literatura, que podem ter ocorrido em decorrência das diferenças no estádio de maturação, tipo de processamento, variedade, condições edafoclimáticas de cultivo, colheita, transporte, entre outros fatores (MARO et al., 2013).

Na Tabela 3 estão dispostos as médias e os desvios padrão dos parâmetros analisados para as geleias elaboradas. Observa-se que as formulações não diferiram estatisticamente quanto ao teor de água e sólidos totais, sendo assim, as sementes de mandacaru e as cascas do melão não foram capazes de influenciar em tais parâmetros.

Em relação ao teor de água, valores próximos aos do presente trabalho foram reportados por Miguel et al (2008) para a geleia de melão ‘Amarelo’ elaborada com resíduo de polpa, (29,78%) e dentro da faixa determinada por Maldonado et al. (2019) em várias geleias produzidas a partir de frutas e resíduos, com teores variando entre 12 e 46%.

 

Tabela 3. Caracterização físico-química e compostos bioativos de formulações de geleias de melão cv ‘Orange Flesh’.

Parâmetros

F1

F2

F3

Teor de água (%)

25,79 ± 1,11a

25,37 ± 0,11a

26,91 ± 0,80a

Sólidos totais (%)

74,21 ± 1,11a

74,63 ± 0,11a

73,09 ± 0,80a

Atividade de água (aw) a 25 °C

0,791 ± 0,001c

0,833 ± 0,001a

0,813 ± 0,00b

Sólidos solúveis totais (°Brix)

67,83 ± 0,29a

64,83 ± 0,29b

64,17 ± 0,29b

Cinzas (%)

0,340 ± 0,01b

0,360 ± 0,01ab

0,363 ± 0,01a

pH

2,96 ± 0,01c

3,09 ± 0,01b

3,12 ± 0,00a

Acidez total titulável (% ácido cítrico)

1,00 ± 0,00a

0,85 ± 0,02c

0,90 ± 0,002b

Ácido ascórbico (mg.100-1 g-1)

0,71 ± 0,00b

0,70 ± 0,02b

0,85 ± 0,00a

Açúcares totais (% glicose)

60,61 ± 0,00a

59,18 ± 0,39b

51,86 ± 0,30c

Açúcares redutores (% glicose)

32,54 ± 0,37a

15,43 ± 0,18c

25,04 ± 0,27b

Açúcares não redutores (% sacarose)

26,67 ± 0,35b

41,56 ± 0,32a

25,07 ± 0,53c

Compostos fenólicos (mg.100-1 g-1)

29,06 ± 0,15c

29,55 ± 0,04b

39,98 ± 0,11a

Flavonoides (mg.100-1 g-1)

1,17 ± 0,01b

1,08 ± 0,02c

1,57 ± 0,01a

Antocianinas (mg.100-1 g-1)

0,09 ± 0,00b

0,07 ± 0,00c

0,16 ± 0,01a

F1 – geleia de melão; F2 - geleia de melão + 1% sementes de mandacaru; F3 – geleia de melão + 10% cascas de melão.

Médias seguidas pela mesma letra na mesma linha não diferem estatisticamente entre si ao nível de 5% de probabilidade pelo teste de Tukey.

 

A atividade de água (aw) foi estatisticamente superior nas formulações F2 (0,833) e F3 (0,813) em relação a F1 (0,791), portanto, diferentemente do teor de água, este parâmetro foi influenciado pela adição das sementes de mandacaru e das cascas do melão, revelando que as formulações F2 e F3 possuem maior quantidade de água livre para ser utilizada em reações, seja elas, químicas, enzimáticas ou microbiológicas (PICANÇO et al. 2018). A formulação F1 apresentou aw próxima à geleia de umbu-cajá (0,774) (OLIVEIRA et al., 2014), todas as formulações obtiveram comportamento semelhante as geleias elaboradas com a polpa do melão pele de sapo para F1 - (polpa: açúcar (1:1)), F2 - (F1 + 0,6% sementes de maracujá) e F3 (F1 + 10% cascas de melão) (AMADEU et al., 2020).

Quanto aos sólidos solúveis totais (SST) a F1 diferiu estatisticamente das demais, ao nível de 5% de probabilidade, apresentando o maior valor, estando próximo aos obtidos nas geleias de acerola (66,92 a 67,97 oBrix) (CAETANO et al., 2012). As formulações F2 e F3 apresentaram valores de SST próximos aos reportados por Barros et al. (2020) para a geleia de morango com pimenta (64,66 °Brix) e próximas a geleia de melão pele de sapo (65,00 a 67,83) (AMADEU et al., 2020). Estas diferenças provavelmente devem-se aos altos teores de sólidos insolúveis e/ou fibras que as sementes e cascas utilizadas possuem, reduzindo desta forma o teor de SST das formulações, conforme valores de fibra alimentar relatado por Mallek-Ayadi et al. (2017) para farinha das cascas de melão cv. Maazoun (41,69%) e por Vieira et al. (2017) para a farinha das cascas de melão amarelo (34,62%).

O teor de cinzas das geleias variou entre 0,340 e 0,363%, com a F3 apresentando a maior concentração, diferindo significativamente (p>0,05) em relação a F1, decorrente dos minerais contidos na casca. Baixos teores de cinzas, também foram reportados por Moura et al. (2019) (0,30 a 0,35%) em geleias de maracujá com sementes de linhaça marrom, por Lemos et al. (2019) (0,63 a 0,76%) nas geleias prebióticas mistas de jabuticaba e acerola, além de Barros et al. (2019) (0,25 a 0,46%) em geleias de abacaxi e canela com diferentes tipos de açúcar.

Quanto ao pH, as amostras diferiram estatisticamente entre si, variando entre 2,96 e 3,12, sendo consideradas como muito ácidas (pH < 4,0) (FRANCO; LANDGRAF, 2005). A F1 apresentou o menor pH, seguido de F2 e F3, revelando que a correção do pH com o ácido cítrico pode ter sido influenciado pelas sementes e cascas. Verifica-se que as geleias com esses valores de pH implicam em alto poder de conservação, proporcionada pela limitação de desenvolvimento de micro-organismos nesta faixa (FRANCO; LANDGRAF, 2005). Resultados próximos foram obtidos por Silva et al. (2012) em geleias de cambuci (3,02-3,10), por Paiva et al. (2015) em geleia de melão (3,07) e por Mattos et al. (2018) (3,19 e 3,35) para geleia de amora-preta com pimenta e geleia de amora-preta, respectivamente. Por outro lado, valores inferiores foram verificados em geleias mistas de umbu e mangaba com pH entre 2,30-2,63 (SOUZA et al., 2018).

As médias da acidez total titulável dos produtos diferiram estatisticamente entre si, observando-se que a acidez reduziu com adição das cascas (F3) e sementes (F2) em relação à padrão (F1). A discrepância apresentada entre a ATT da polpa de melão refinada quando comparada com as geleias pode ser explicada pela adição do ácido cítrico durante a elaboração das mesmas. Valores inferiores foram reportados por Curi et al. (2017) em geleias de pêssegos (0,19 a 0,52 g 100-1 g-1) e superiores encontrados por Teles et al. (2017) em geleias tipo extra de graviola com adição de pimenta dedo-de-moça, obtendo ATT de 1,65% ácido cítrico.

Os teores de ácido ascórbico foram baixos, o que era esperado, visto que a matéria-prima utilizada também era detentora de baixo teor (0,35 mg 100-1 g-1). Apesar disso, observa-se que todas as formulações obtiveram concentrações maiores que a apresentada para polpa utilizada, o que revela que as etapas de elaboração das geleias concentraram o ácido ascórbico, além da adição de outros ingredientes. A geleia elaborada com adição da casca do melão (F3) esteve com maior concentração, seguida das geleias F1 e F2, as quais não apresentaram diferença significativa entre as médias.

Quanto aos açúcares redutores, não redutores e totais, houve diferença estatística entre as formulações, onde a F1 apresentou maior percentual de açúcares totais (AT) e redutores (AR), o que pode ser justificado em razão de conter apenas a polpa refinada do melão, que tem em sua composição a predominância dos AR. A F2 obteve os maiores percentuais dos açúcares não redutores, influenciada pela semente de mandacaru. Viana et al. (2012) reportaram teores de açúcares totais próximos em geleias de mamão com araçá-boi com diferentes proporções (52,76 a 58,73%), assim como para as geleias de amora-preta com teores entre 59,54-61,85% (SOUZA et al., 2015), próxima as formulações F1 e F2.

A formulação com adição da casca do melão (F3) obteve maiores concentrações dos compostos fenólicos totais (39,98 g 100-1 g-1), flavonoides (1,57 g 100-1 g-1) e antocianinas (0,16 g 100-1 g-1) quando comparada com as demais e com a polpa refinada, revelando que a incorporação da casca proporcionou o aumento dos compostos bioativos. A geleia com adição das sementes de mandacaru (F2) apresentou-se com resultados superiores a formulação padrão, o que demonstra que as sementes são ricas em compostos fenólicos, que foram incorporados à geleia.

 

CONCLUSÕES

 

A polpa de melão cv. ‘Orange Flesh’, as suas cascas e as sementes de mandacaru são boas alternativas na produção de geleias, visto que todas as formulações apresentaram características satisfatórios, como conservação, atribuída as características físico-químicas (pH, teor de água, atividade de água), e compostos bioativos. Os resíduos utilizados contribuem para a funcionalidade das formulações, mediante os valores dos compostos bioativos e servem como alternativa para a inserção de novos produtos no mercado alimentício.

 

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