Dinâmica de nidificação de Apis mellifera na Caatinga pernambucana: Chuvas e floradas apícolas influenciam no processo?

 

Nesting dynamics of Apis mellifera in the Caatinga of Pernambuco: Rains and apicultural flowers influence the process?

 

Dinámica de anidación de Apis mellifera en la Caatinga de Pernambuco: ¿Lluvias y flores apícolas influyen en el proceso?

 

 

Pedro de Assis de Oliveira1, Marileide de Souza Sá2, Hélio Fernandes de Melo3,

André Laurênio de Melo3; Marcelo Casimiro Cavalcante4

 

1Doutorando do Programa de Doutorado Integrado em Zootecnia, Universidade Federal do Ceará, Departamento de Zootecnia. Fortaleza, Ceará; E-mail: pedromanari@gmail.com; 2Mestranda em Zootecnia, Universidade Federal da Paraíba, Areia, Paraíba, E-mail: marileidezootecnista@hotmail.com; 3Professor Adjunto, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Serra Talhada, Pernambuco; E-mail: heliofm63@gmail.com; andrelaurenio@yahoo.com.br; 4Professor Adjunto, Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Redenção, Ceará. E-mail: marcelufc@yahoo.com.br.

 

Recebido: 04/05/2020; Aprovado: 26/12/2020

 

Resumo: O comportamento de Apis mellifera em áreas urbanas tem causado acidentes com seres humanos e animais domésticos. Ações que visem minimizar o problema, como a captura, são essenciais. Assim, o presente trabalho buscou compreender a dinâmica de nidificação e a variação anual das ocorrências de enxames e colônias, as suas relações com a precipitação pluviométrica e a floração apícola. O trabalho foi realizado no Sertão Pernambucano, em Serra Talhada, principalmente, e em cidades vizinhas. As ocorrências foram registradas no período de 2014 a 2015. Colônias e enxames foram capturados e levados para o apiário da Unidade Acadêmica de Serra Talhada, ou doados para uma comunidade de assentados. Dados pluviométricos foram coletados, e o levantamento do pasto apícola em Serra Talhada, através de transectos aleatórios de 1.500m a partir do referido apiário.  Foram registradas 115 ocorrências, sendo 65% em áreas urbanas e 35% em áreas rurais. Desse total, 76% foram de colônias nidificadas e 24% de enxames provisórios. Em relação ao tamanho, 62% foram considerados grandes, 22% de porte médio e 16% pequeno. O maior número de ocorrências foi verificado entre os meses de março e abril, coincidindo com o período de maior precipitação acumulada e as floradas. Desta forma, as abelhas capturadas possibilitaram uma redução de riscos à sociedade, contribuíram para uma renda extra dos assentados e aulas práticas universitárias. A dinâmica de nidificação de A. mellifera, na área de estudo, mostrou estar relacionada ao período com maior volume de chuvas e também de maior disponibilidade de recursos florais.

 

Palavras-chave: Apicultura; Capturas; Enxameação; Preservação; Semiárido do Brasil.

 

Abstract: The behavior of Apis mellifera in urban areas has caused accidents with humans and domestic animals. Actions that aim to minimize the problem, such as capture, are essential. Thus, the present work sought to understand the nesting dynamics and the annual variation of the occurrences of swarms and colonies, their relationship with rainfall and bee flowering. The work was carried out in the Sertão Pernambucano, in Serra Talhada, mainly, and in neighboring cities. The occurrences were registered in the period from 2014 to 2015. Colonies and swarms were captured and taken to the apiary of the Serra Talhada Academic Unit, or donated to a settlement community. Rainfall data were collected, and the survey of bee pasture in Serra Talhada, through random transects of 1,500m from the said apiary. 115 occurrences were recorded, 65% in urban areas and 35% in rural areas. Of this total, 76% were from nesting colonies and 24% from provisional swarms. Regarding size, 62% were considered large, 22% medium and 16% small. The highest number of occurrences was observed between the months of March and April, coinciding with the period of greatest accumulated precipitation and flowering. In this way, the captured bees enabled a reduction of risks to society, contributed to an extra income for settlers and practical university classes. The nesting dynamics of A. mellifera, in the study area, proved to be related to the period with the highest rainfall volume and also the greatest availability of floral resources.

 

Key words: Beekeeping; Brazilian semiarid; Catching; Preservation; Swarming.

 

Resumen: El comportamiento de Apis mellifera en zonas urbanas ha provocado accidentes con humanos y animales domésticos. Las acciones que tienen como objetivo minimizar el problema, como la captura de enjambres/colonias, son fundamentales. Así, el presente trabajo buscó comprender la dinámica de anidación y la variación anual de la ocurrencia de enjambres y colonias, su relación con las lluvias y la flora apícola. El trabajo se llevó a cabo en el Sertão Pernambucano, en Serra Talhada principalmente, y en ciudades vecinas. Los hechos se registraron en el período de 2014 a 2015. Se capturaron colonias y enjambres y se llevaron al apiario de la Unidad Académica de Serra Talhada o se donaron a una comunidad de asentamiento rural. Se recogieron los datos de precipitaciones y de la flora apícola en Serra Talhada, a través de transectos aleatorios de 1.500m desde el colmenar. Se registraron 115 ocurrencias, siendo 65% en áreas urbanas y 35% en áreas rurales. De este total, el 76% fueron de colonias de anidación y el 24% de enjambres provisionales. En cuanto al tamaño, el 62% se consideró grande, el 22% mediano y el 16% pequeño. El mayor número de ocurrencias se observó entre los meses de marzo y abril, coincidiendo con el período de mayor precipitación acumulada y floración. De esta forma, las abejas capturadas permitieron una reducción de riesgos para la sociedad, contribuyeron a un ingreso extra para los colonos y a clases prácticas universitarias. La dinámica de anidación de A. mellifera, en el área de estudio, demostró estar relacionada con el período con mayor volumen de lluvia y también con mayor disponibilidad de recursos florales.

 

Palabras Clave: Apicultura; Capturas; Enjambre; Preservación; Semiárida de Brasil.

 

INTRODUÇÃO

 

Apis mellifera L. compreende abelhas exóticas no Brasil, introduzidas no país por imigrantes europeus na década de 1850 (A. m. mellifera, A. m. ligustica, A. m. carnica e A. m. caucásica) e que se miscigenaram com abelhas africanas (A. m. scutellata e A. m. adansonii) trazidas pelo governo brasileiro na década de 1950, para fins de melhoramento genético. Desse cruzamento, surgiu o poli híbrido conhecido como abelha africanizada (RAMOS; CARVALHO, 2007; SANTOS; MENDES, 2016; GOMES et al., 2019; SILVA et al., 2020).

Esse híbrido apresenta comportamento reprodutivo muito peculiar, em condições de fluxo contínuo de alimento (néctar e pólen) na colmeia, aumenta o número de indivíduos das colônias deixando-as superpopulosas em curto espaço de tempo, e, frequentemente, ocasionando uma divisão natural da colônia pelo processo de enxameação reprodutiva (WINSTON, 2003; SMITH et al., 2014). Outros fatores podem também promover ou contribuir para a enxameação ou abandono forçado do ninho como, a baixa disponibilidade de recursos (água e alimento), elevadas temperaturas, ataques dos predadores, parasitas, ectoparasitas, principalmente de formigas e da abelha arapuá (Trigona spinipes), falta de sombreamento e o manejo inadequado por parte de apicultores (TOLEDO et al., 2006; LOPES et al., 2011; PEREIRA et al., 2014; HOLANDA-NETO et al., 2015; SILVEIRA et al., 2015).Conforme descrito por Freitas et al. (2007), no semiárido do Nordeste do Brasil, essa estratégia de abandono ou migração natural tem sido fundamental para a sobrevivência das abelhas africanizadas na região e esse comportamento é perceptível porque as rotas de voo são bem conhecidas pelos apicultores em função da época do ano.

Durante o processo de reprodução da colônia, quando parte deste sai em busca de novo local para nidificar, em média de 10.000 a 15.000 abelhas deixam a colônia juntamente com a rainha velha (D'AVILA, 2004). Nesse sistema, as abelhas podem nidificar em diversos locais (árvores, telhados, lajes, pneus e/ou outros locais), tanto em áreas urbanas, quanto rurais (TOLEDO et al., 2006; ZALUSKI et al., 2014). Porém, o aumento da destruição de áreas verdes em torno das cidades tem provocado uma migração frequente desses insetos sociais para as áreas urbanas (sinantropia) (PEREIRA et al., 2010).

O comportamento de defensa e de ataque contra invasores e a grande capacidade de recrutamento de indivíduos, faz com que A. mellifera tenha potencial para ocasionar sérios problemas aos humanos e animais domésticos, por onde transita (SOUZA et al., 2012), sendo nesse sentido, constantemente reportados diversos acidentes (SANTOS; MENDE, 2016). No Brasil, dos 11.982 acidentes ocorridos no ano de 2016, 983 foram registrados em Pernambuco (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018), No Estado, o extermínio de abelhas através de fogo e veneno são frequentes na tentativa de eliminar o enxame ou a colônia e evitar acidentes.

Tais práticas podem ocasionar graves problemas ecológicos relacionados à polinização que, mesmo se tratando de abelhas exóticas, desempenham importante papel na polinização de plantas cultivadas e silvestres, seja complementando ou, em situações específicas, substituindo as abelhas nativas. Além do mais, a prática inadequada durante o extermínio das mesmas incorre em risco de acidentes, tanto pela população quanto pelos militares do grupamento do corpo de bombeiros, uma vez que, esses não possuem treinamento especifico para captura e remoção de enxames e colônias (SANTOS; MENDES, 2016).

Diante do exposto, este trabalho teve como objetivo compreender a dinâmica de nidificação de abelhas A. mellifera através do monitoramento dos locais de nidificação e da remoção e/ou captura de seus enxames e colônias em função da precipitação pluviométrica e da floração de plantas apícolas no Sertão Pernambucano, estado de Pernambuco.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

O trabalho foi realizado na Mesorregião do Sertão Pernambucano, situada no centro-norte do estado de Pernambuco (Figura 1). O clima da região, de acordo com a classificação de Köppen, é do tipo BSh, a temperatura média anual é de 26 ºC, com período chuvoso entre os meses de janeiro e abril, e a precipitação média anual de 642 mm (ALVARES et al., 2013; SILVA et al., 2015; JARDIM et al., 2019). O estudo foi desenvolvido pela Universidade Federal Rural de Pernambuco/Unidade Acadêmica de Serra Talhada (UFRPE/UAST) em parceria com o 3º Grupamento de Corpo de Bombeiros de Serra Talhada (3o GCB), órgão responsável pelas ocorrências com abelhas na região.

 

Figura 1.  Mapa do Estado de Pernambuco, com os municípios onde ouve ocorrência de enxames e colônias e destaque para o município de Serra Talhada e para a UFRPE/UAST com seu Apiário.

 

As ocorrências foram registradas durante o período de janeiro de 2014 a dezembro de 2015, por intermédio da população que acionava o 3o GCB e a localização repassada à equipe do setor de abelhas da UAST, ou pelo contato direto da população com a equipe da Universidade. O Corpo de Bombeiros registrava os dados do solicitante e o local onde as abelhas haviam nidificado, e a equipe da Universidade fazia o registro dos dados de altura e tamanho das colônias (com até três favos de cria e alimentos - colônia pequena, quatro a seis favos - colônia de tamanho médio, acima de sete favos - colônia grande) (SILVA; BARRETO, 2016). Para os enxames, adotou-se a metodologia de Winston (2003), que os classifica pelo número de indivíduos em: 1) grandes (ou primário) – enxames com 16.000 abelhas ou mais; 2) médios (ou primeiro secundário) - enxames com 11.500 até 15.999 abelhas, 3) pequenos (ou segundo, terceiro e quarto secundários) - enxames abaixo de 4.000 abelhas. Todos os enxames e colônias foram capturados e removidos por estudantes do curso de Zootecnia da UAST, utilizando-se técnicas padrão da apicultura com equipamentos, materiais e EPI’s apropriados (ZALUSKI et al., 2014), e sempre acompanhados por integrantes do corpo de bombeiros.

Os dados de floração das espécies de plantas apícolas foram coletados para entender melhor a relação do processo de migração/enxameação com a disponibilidade de recursos alimentares. Para o levantamento do pasto apícola optou-se pelo município de Serra Talhada, devido ao maior número de ocorrências ter ocorrido nessa cidade e à vegetação predominante das outras localidades também ser de Caatinga Hiperxerófila. Para o levantamento realizou-se transectos de 1.500 m traçados em direção aos quatros pontos cardeais a partir do apiário da UFRPE/UAST (Figura 1), percorridos entre o período de 7:00 e 11:00 h da manhã. As espécies de plantas nas quais foram observadas abelhas em suas flores, bem como aquelas reconhecidamente apícolas, foram coletadas segundo métodos usuais em Taxonomia Vegetal (MORI et al., 1989), em seguida, foram depositadas e identificadas por taxonomista no Herbário do Semiárido do Brasil (HESBRA). Os dados meteorológicos foram coletados no site da Agência Pernambucana de Águas e Clima (APAC).

Os resultados quantitativos foram analisados por estatística descritiva com auxílio do programa Microsoft Excel 2010.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Foram atendidas 115 ocorrências de enxames e colônias, durante 24 meses em sete municípios da Mesorregião do Sertão Pernambucano (Serra Talhada, Santa Cruz da Baixa Verde, Calumbi, São José do Belmonte, Flores, Afogados da Ingazeira e Triunfo), totalizando, em média, uma enxameação ou migração a cada seis dias. A grande maioria das ocorrências (65%) foi em áreas urbanas, enquanto que 35% na zona rural.

Dessas ocorrências, 76% foram de colônias nidificadas e 24% de enxames provisórios demonstrando que as populações locais só buscaram ajuda quando as abelhas haviam se estabelecido no local, corroborando observações descritas por Toledo et al. (2006). Possivelmente, na maioria dos casos, a tomada de providências por parte das pessoas ocorreu depois de ter acontecido um ataque ou ferroadas por importunação às abelhas (MELLO et al., 2003). Nesse sentido, os dados evidenciaram a necessidade de uma melhor comunicação da população com órgãos responsáveis, como grupamento de bombeiros, universidades, associações/cooperativas de apicultores ou apicultores individuais, ou mesmo centros de controle de zoonoses, prevenindo assim acidentes (TOLEDO et al., 2006; LIMA et al., 2015).

De todas as ocorrências, sessenta (60) enxames/colônias foram capturados pela equipe da UAST, evidenciando o compromisso da equipe durante os dois anos de coleta; doze ainda não tinham sido capturadas; treze foram consideradas de difícil acesso, impossibilitando o procedimento de captura e remoção; doze tinham abandonado o local antes da chega do Grupamento de Corpo de Bombeiros e alunos; sete haviam sido exterminados pela população; três eram muito pequenas, inviabilizando a captura para criação, sendo então removidas para evitar acidentes, tendo como destino o apiário da UFRPE/UAST; e três foram indicadas aos apicultores e cooperativas para as devidas remoções. Cinco enxames foram nidificados através de caixas-isca onde foram abrigados diretamente em caixas previamente preparadas. Essa é a prática mais indicada para evitar instalação/nidificação de abelhas em locais indesejados, bem como, uma boa alternativa de programa de controle, de acordo com Diniz et al. (1994).

Entre as cidades com maior número de exames capturados, Serra Talhada se destacou com noventa e nove (86% do total), seguida por Calumbi com cinco, Afogados da Ingazeira e Triunfo com três cada um, São José do Belmonte e Flores com dois e Santa Cruz da Baixa Verde com um (Figura 2).

 

Figura 2.  Cidades das ocorrências de enxames/colônias de abelhas Apis mellifera no Sertão Pernambucano, no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2015

 

O maior número de chamados em Serra Talhada (Figura 2) pode estar relacionado à existência de um Grupamento de Corpo de Bombeiros (3° GCB) nesse município e, consequentemente, maior solicitação dos serviços prestados pela corporação por parte da população.

Em relação ao tamanho, houve um maior predomínio dos enxames/colônias grandes, correspondendo a 62%, seguidos pelos médios com 22% e pequenos com 16% (Figura 3). Essas informações sugerem a viabilidade e o sucesso das capturas, uma vez que enxames/colônias maiores têm maior possibilidade de permanecerem nas caixas após  capturados, uma vez que suportam maior estresse em relação aos menores. Além disso, as colônias poderão ter maior quantidade de crias e de reservas de alimento, diferindo de colônias pequenas que dispõem de menor número de operárias e, consequentemente, menor reserva de alimento (RANGEL; SEELEY, 2012; WINSTON, 2003), dificultando sua permanência na nova morada.

 

Figura 3. Tamanho dos enxames/colônias de Apis mellifera no Sertão Pernambucano, no período entre janeiro de 2014 a dezembro de 2015.

 

Das 115 ocorrências, se registrou o local de parada transitória e/ou construção do ninho de 104. Árvores foram os substratos mais frequentes, correspondendo a 41% do total. Resultados diferentes foram registrados por Toledo et al. (2006) e Silva e Barreto (2016) que encontraram, com maior frequência, enxames em telhados e forros de residências. Entretanto, Mello et al. (2003), destacam que enxames migratórios preferem alojar-se temporariamente em árvores, como constatado no presente trabalho. Os demais enxames foram encontrados em diversas estruturas como objetos de madeira, vasos plásticos, pneus, paredes de alvenaria, entre outros (Figura 4). Esses dados evidenciam quão generalistas são as abelhas A. mellifera na busca por locais para construção do ninho, como citado por Pigozzo e Viana (2010), Zaluski et al. (2014) e Somavilla et al. (2018).

Das árvores que serviram de suporte, as mais utilizadas nas paradas temporárias foram Prosopis juliflora (Sw.) DC. (conhecida como algaroba) e Azadirachta indica A. Juss. (nim-indiano) (Tabela 1), ambas espécies exóticas amplamente disseminadas no semiárido de Pernambuco. Essas duas espécies possuem características comuns quanto à manutenção das folhas durante todo o ano (perenifólias), bem como floradas maciças nos períodos de estiagem, e possivelmente, proporcionam uma melhor ambiência para os ninhos e recurso alimentar no período de escassez para as abelhas. Azadirachta indica foi amplamente plantada nos centros urbanos das cidades relacionadas aqui no estudo como forma de fornecer sombra rápida, pois a árvore tem crescimento acelerado e constante. Entretanto, as flores (néctar e pólen) da espécie são tóxicas para as abelhas (MESQUITA et al., 2010; BARBOSA et al., 2015). Prosopis juliflora por sua vez, não é tóxica e está presente em grande quantidade nas zonas rurais e periurbanas, especialmente, em decorrência da resistência à estiagem e grande capacidade reprodutiva que possui, bem como para ser usada como forrageira para os animais ruminantes e equídeos. Outras onze espécies de árvores nativas e exóticas também foram utilizadas pelas abelhas para nidificação (Tabela 1).

 

Figura 4. Locais de nidificação de enxames e colônias de abelhas Apis mellifera no Sertão Pernambucano, no período entre janeiro de 2014 a dezembro de 2015.

Todas essas informações evidenciam o elevado grau de periculosidade ao qual a população urbana pode estar exposta, tanto pelo alto percentual de ocorrência, pelos locais de nidificação, pelo tamanho dos enxames. Sendo assim, as capturas e remoções de ninhos nessas áreas, é uma atividade de extrema importância.

A altura média em que os enxames/colônias estavam instalados foi de 3,6 m. Esses resultados corroboram Winston (2003), que relatou que enxames de abelhas de regiões de clima temperado preferem locais com aproximadamente 3,0 m acima do solo. Em clima tropical, foram relatados enxames em torno de 3,0 a 4,0 m de altura, podendo em alguns casos ultrapassar esses limites. Silva e Barreto (2016) encontraram resultados semelhantes nas regiões da Grande São Paulo-SP com mais ou menos 2,0 m de altura na grande maioria das ocorrências. Entretanto, esses autores, registraram uma variação maior (entre 2 e 10 m de altura), no estado do Paraná.

 

Tabela 1. Espécies vegetais utilizadas pelas abelhas Apis mellifera para construção do ninho na Região do Sertão Pernambucano, no período entre janeiro de 2014 a dezembro de 2015.

Espécies

Quantidade

%

Nome científico

Nome popular

 

 

Prosopis juliflora (Sw.) DC.

Algaroba

7

16

Azadirachta indica A. Juss.

Nim

7

16

Pennisetum purpureum Schum.

Capim-elefante

5

12

Spondias tuberosa Arruda

Umbuzeiro

3

7

Ficus elástica Roxb.

Figo

2

5

Cenostigma pyramidale (Tul.) Gagnon e GP Lewis

Catingueira

2

5

Cissus simsiana Schult. & Schult. F.

Parreira

2

5

Mimosa tenuiflora (Willd.) Poir.

Jurema-preta

1

2

Sizygium jambolanum (Lam.) DC.

Oliveira

1

2

Mangifera indica EU.

Mangueira

1

2

Schinopsis brasiliensis Engl.

Baraúna

1

2

Senna spectabilis (DC.) H. S. Irwin & Barneby

Canafístula

1

2

Cocos nucifera EU.

Coqueiro

1

2

Outras espécies não anotadas

-

9

21

Total

43

100

 

O maior número de ocorrências foi verificado no primeiro semestre do ano, entre os meses de março e abril, coincidindo com o período de maior precipitação acumulada e, consequentemente, com o período de maiores floradas (abril, maio e junho) (Figura 5). É possível que esse seja o momento em que as colônias começam a investir na reprodução, após apresentarem uma quantidade mínima de 4.000 operárias como relatado por Smith et al. (2014). Tal comportamento justifica o maior número de ocorrências nas áreas urbanas do geral observado no mês de março (Figura 5), pois no processo de enxameação as abelhas fazem paradas para descanso e escolha dos locais definitivos de construção do ninho. Muitas vezes esses locais de descanso se transformam nos locais definitivos para o ninho, o que justifica o elevado percentual de colônias capturadas com cera puxada (76 % nidificados descritos anteriormente). Outro pico de nidificação, observado entre os meses de agosto e outubro, nessa mesma zona urbana foi percebido (Figura 5), podendo ser justificado pelo fato de ser o período de escassez de alimento e momento no qual acontecem os abandonos de ninhos em busca de melhores condições de temperatura (sombreamento) e disponibilidade de fontes de água ou até mesmo alimento, muitas vezes encontrados nas áreas urbanas. 

Esses dados estão de acordo com o trabalho de Freitas et al. (2007) que descreveram o comportamento migratório das abelhas A. mellifera na caatinga. Esses autores destacaram que, durante o período chuvoso (início do ano), e consequentemente, de maior abundância de recursos florais e água, as abelhas do litoral migraram para a caatinga em busca desses recursos, evidenciando-se as esperadas enxameações. De forma contrária, durante o período seco as abelhas migraram para as zonas litorâneas em busca de melhores recursos, proporcionando assim uma eficiente capacidade de sobrevivência ao longo do ano.


 

Figura 5.  Número de ocorrências nas áreas urbanas e rurais do Sertão Pernambucano no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2015.

 

Os maiores números de ocorrências aconteceram entre os meses de março e maio durante o período chuvoso, compreendido a estação de outono e entre agosto e outubro durante o período seco entre o final de inverno e início da primavera. A partir do atendimento e registros de ocorrência foi possível verificar no presente estudo, dois picos de frequências de ocorrências (Fig. 6): um entre março e abril, que corresponde ao comportamento de enxameação, e o outro entre agosto e outubro, correspondente ao comportamento de migração ou abandono do abrigo, atribuído à escassez de alimento e/ou outros recursos para manutenção da colônia. Estudos realizados por Toledo et al. (2006) na cidade de Maringá, situada na região noroeste do Estado do Paraná, registraram no ano de 1997 dois picos de ocorrência de enxames e colônias, sendo um entre abril e maio e o outro em agosto e setembro. Desta forma, verifica-se que no Brasil pode haver esses dois picos de ocorrências, mesmo considerando as grandes diferenças de fatores climáticos envolvendo a área de estudo e o local do trabalho de Toledo et al. (2006).

 

Figura 6.  Variação mensal da precipitação acumulada (mm (média de dois anos)) e Floração (Nº de espécies (média de dois anos)) e ocorrências (Nº ocorridos (média de dois anos)), no período de janeiro de 2014 a dezembro 2015 em Serra Talhada, Pernambuco.

 

Como resultado prático do presente trabalho, a parceria da UFRPE-UAST com os bombeiros permitiu o resgate de diversos enxames e colônias de abelhas, contribuindo para a conservação ambiental, redução de riscos à população, bem como permitiu a criação dentro da Universidade e em assentamento da reforma agrária (Assentamento de Carnaúba do Ajudante, Serra Talhada, Pernambuco). Na Universidade, as abelhas capturadas possibilitaram atividades de ensino, pesquisa e extensão para os alunos do curso de zootecnia. No assentamento, a oportunidade de início da apicultura como atividade produtiva, a qual possibilitou uma importante fonte de renda para quatro famílias de assentados.

É importante desenvolver um programa de treinamento de pessoal, principalmente dos integrantes do corpo de bombeiros, defesa civil e autoridades ambientais, direcionado para exercer um maior controle da dispersão de abelhas africanizadas em zonas urbanas e habitações rurais. Dessa forma, riscos de acidentes e a perda de enxames/colônias dessas abelhas, que prestam serviços indispensáveis tanto do ponto de vista ecológico (IMPERATRIZ-FONSECA, 2010; PEREIRA et al., 2014), quanto do ponto de vista da produção agrícola (BRITTAIN et al., 2013; GARIBALDI et al., 2014; GARIBALDI et al., 2016; RADER et al., 2016), podem ser minimizados.

O impacto da ação humana sobre a população de abelhas vem sendo debatido em nível mundial, com níveis alarmantes de redução e até mesmo de desaparecimento dessa espécie (Apis mellifera) em alguns países da Europa e nos Estados Unidos. Embora esse seja um fenômeno ainda sem uma causa totalmente conhecida e atribuída a um único fator, sabe-se que praticas antrópicas têm papel preponderante. No semiárido brasileiro tal fenômeno não tem sido observado, onde os maiores riscos a essa abelha, e às outras também, é relacionado ao desmatamento das áreas naturais, forçando-as deslocarem-se às zonas urbanizadas, aproximando-as das pessoas e, consequentemente, potencializando os acidentes.

 

CONCLUSÕES

 

A dinâmica de nidificação de abelhas A. mellifera no Sertão Pernambucano segue um padrão em função das chuvas e dos recursos florais disponíveis ao longo do ano.

Espécies arbóreas exóticas perenifólias, como P. juliflora (Algaroba) e A. indica (Nim-indiano), têm papel importante na atração de enxames para nidificação no sertão de Pernambuco.

O registro de chamadas do corpo de bombeiro é um instrumento eficiente para monitorar a enxameação e o comportamento de nidificação, sendo as zonas urbanas refúgios importantes para abelhas em processos migratórios e reprodutivos.

 

AGRADECIMENTO(S)

 

Aos militares do 3º Grupamento de Corpo de Bombeiros de Serra Talhada (3o GCB) pela parceria e colaboração e acompanhamento prestada em várias etapas das capturas à UFRPE-UAST pelo projeto de extensão no biênio de 2015 a 2016 e ao CNPq edital MCTI/MAPA/MDA/MEC/MPA/CNPq 81/2013 pelo projeto de Apicultura e Meliponicultura, através do NEPPAS no biênio de 2014 a 2016.

 

REFERÊNCIAS

 

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BARBOSA, W. F.; MEYER, L.; GUEDES, R. N. C.; SMAGGHE, G. Lethal and sublethal effects of azadirachtin on the bumblebee Bombus terrestris (Hymenoptera: Apidae). Ecotoxicology, v. 24, n. 1, p. 130-142, 2015. 10.1007/s10646-014-1365-9.

 

BRITTAIN, C.; WILLIAMS, N.; KREMEN, C.; KLEIN, A. M. Synergistic effects of non-Apis bees and honey bees for pollination services. Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences, v. 280, n. 1754, p. 20122767, 2013. 10.1098/rspb.2012.2767.

 

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