Solutos orgânicos e inorgânicos em Salicornia neei Lag. sob lâminas de irrigação e adubação no semiárido cearense

 

Organic and inorganic solutes in Salicornia neei Lag. under blades of irrigation and fertilization in Ceara semiarid, Brazil

 

Solutos orgánicos e inorgánicos en Salicornia neei Lag. bajo cuchillas de riego y fertilización en la región semiárida de Ceará, Brasil

 

Paulo Ricardo Alves1; Eliseu Marlônio Pereira de Lucena2; Oriel Herrera Bonilla3; Elton Camelo Marques4; Enéas Gomes-Filho5; Cesar Serra Bonifácio Costa6

 

1Mestre em Recursos Naturais, Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, pa9910@gmail.com; 2Pós-Doutor em Botânica Aplicada, Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, eliseu.lucena@uece.br; 3Pós-Doutor em Engenharia Agrícola, Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, oriel.herrera@uece.br; 4Doutor em Bioquímica, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, eltoncmarques@gmail.com; 5Doutor em Biologia Vegetal, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, egomesf@ufc.br; 6Doutor em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, costacsb@gmail.com

 

Recebido: 06/05/2020; Aprovado: 27/09/2020

 

Resumo: A halófita Salicornia neei Lag. pode ser utilizada como fitorremediador nas áreas degradadas por sais. Este trabalho objetivou avaliar os teores dos solutos orgânicos (carboidratos e N-aminossolúveis) e inorgânicos (Na+, K+ e Cl-) em S. neei submetidas a diferentes lâminas de irrigação e adubação no semiárido cearense. As amostras foram obtidas em cultivo realizado em Ocara-CE. Foram preparadas quatro áreas de 100 m2 com diferentes tratamentos (denominados T1, T2, T3, T4) de irrigação: uma vez ao dia (0,15 m3/dia) em T1 e T2, e duas irrigações ao dia (0,30 m3/dia) em T3 e T4, por 30 minutos, cada, e adubação somente nos tratamentos T2 e T4 com NPK (10:28:20). Foram coletadas duas amostras por tratamento aos 60, 90 e 120 dias após o plantio (DAP). Os teores de carboidratos solúveis totais das plantas adubadas não diferiram significativamente entre os dias de coleta. Os maiores teores de N-aminossolúveis ocorreram aos 120 DAP nas plantas com uma irrigação e sem adubo. As plantas com uma irrigação e sem adubo tiveram os maiores teores de Na+ e K+. Os teores de Cl- não diferiram entre as datas de coleta nas plantas com duas irrigações. Conclui-se que os maiores teores dos solutos orgânicos e inorgânicos ocorreram nos tratamentos com uma irrigação e sem adubo.

 

Palavras-chave: Salinização; Aspargo-marinho; Halófitas.

 

Abstract: The halophyte Salicornia neei Lag. can be used as a phytoremediation agent in salt degraded areas. The objective of this work was to evaluate the organic (carbohydrate and N-aminosoluble) and inorganic (Na+, K+ and Cl-) solutes contents in S. neei submitted to different blades of irrigation and fertilization in Ceara semiarid. The samples were obtained in culture carried out in Ocara-CE. Four areas of 100 m2 were prepared with different treatments (denominated T1, T2, T3, T4) of irrigation: once a day (0.15 m3 / day) in T1 and T2, and two irrigations a day (0.30 m3 / day) in T3 and T4, for 30 minutes each, and fertilization only in treatments T2 and T4 with NPK (10:28:20). Two samples were collected per treatment at 60, 90 and 120 days after planting (DAP). The total soluble carbohydrate content of the fertilized plants did not differ between the days of collection. The largest concentrations of N-aminossoluveis occurred to 120 DAP in plants with one irrigation and without fertilizer. Plants with one irrigation and without fertilizer had the greatest levels of Na+ and K+. The Cl- levels did not differ between the dates in the collection with two plants irrigation. It is concluded that the highest levels of organic and inorganic solutes occurred in the treatments with and without irrigation.

 

Key words: Salinization; Marine-asparagus; Halophytes.

 

Resumen: Halophyte Salicornia neei Lag. puede usarse como fitorremediación en áreas degradadas por sales. Este trabajo tuvo como objetivo evaluar los niveles de solutos orgánicos (carbohidratos y N-aminosolubles) e inorgánicos (Na+, K+ y Cl-) en S. neei sometido a diferentes cuchillas de riego y fertilización en la región semiárida de Ceará. Las muestras se obtuvieron en un cultivo realizado en Ocara-CE. Se prepararon cuatro áreas de 100 m2 con diferentes tratamientos (denominado T1, T2, T3, T4) de riego: una vez al día (0.15 m3/día) en T1 y T2, y dos riegos al día (0.30 m3/día) en T3 y T4, durante 30 minutos cada uno, y fertilización solo en tratamientos T2 y T4 con NPK (10:28:20). Se recogieron dos muestras por tratamiento a los 60, 90 y 120 días después de la siembra (DAP). El contenido total de carbohidratos solubles de las plantas fertilizadas no difirió entre los días de recolección. Los niveles más altos de N-aminosoluble ocurrieron a 120 DAP en plantas con riego y sin fertilizante. Las plantas con riego y sin fertilizante tuvieron los mayores contenidos de Na+ y K+. El contenido de Cl- no difirió entre las fechas de recolección en las plantas con dos riegos. Se concluye que los niveles más altos de solutos orgánicos e inorgánicos ocurrieron en tratamientos con riego y sin fertilizante.

 

Palabras Clave: Salinización; Espárragos de mar; Halófitos.

 

INTRODUÇÃO

 

As plantas halófitas são consideradas promissoras para diferentes tipos de aplicações em virtude das suas características fisiológicas especiais, além de sua composição química, que possibilitam o crescimento em ambientes salinos (BUHMANN; PAPENBROCK, 2013). Apresentam capacidade de acumulação de metais pesados, o que as tornam propícias para fitoextração e fitoestabilização em solos contaminados (VAN OOSTEN; MAGGIO, 2015).

Pesquisas voltadas às análises dos componentes químicos das espécies halófitas dos gêneros Sarcocornia e Salicornia, e trabalhos têm demonstrado a ocorrência de variações influenciadas por fatores como espécie, sua sazonalidade, a localização geográfica onde haja ocorrência, o clima, o tipo de solo e agentes causadores de estresse como luz e frequência e/ou duração de inundação por água salgada (VENTURA et al., 2011; VENTURA; SAGI, 2013). Estas plantas oferecem uma grande variedade de produtos derivados, além de diversas utilizações, como forragem para animais, produção de fármacos, fitorremediação de áreas salinizadas e extração de óleo das sementes para uso industrial (DÍAZ et al., 2013; VENTURA; SAGI, 2013). Consequentemente, o cultivo dessas halófitas em solos salinizados e/ou utilizando águas salinas pode aumentar a segurança hídrica e alimentar de regiões desérticas ou semiáridas, como parte do Nordeste do Brasil, onde a água doce é um recurso escasso.

A utilização de plantas halófitas dos gêneros Sarcocornia e Salicornia vem se destacando também no tratamento de efluentes da aquicultura marinha, por apresentarem tolerância a salinidades elevadas como da água do mar, bem como, por apresentarem elevada produtividade e absorção de nutrientes (BUHMANN et al., 2015; GLENN et al., 2013; ROZEMA; SCHAT, 2013; SHPIGEL et al., 2013; WEBB et al., 2012).

A halófita costeira Salicornia neei Lag., anteriormente chamada Sarcocornia ambigua (Michx.) M.A. Alonso & M.B. Crespo (COSTA et al., 2018; COSTA et al., 2019), cresce em solos costeiros, inclusive alagados pela água do mar, onde a salinidade do solo pode variar de 16 a 55 dS.m-1, e até mesmo hipersalinas (FREITAS; COSTA, 2014). Esta halófita possui uma morfologia simples, uma vez que produz somente brotos suculentos aparentemente sem folhas, possui ciclo de vida perene e as flores são alinhadas horizontalmente nos brotos (VENTURA et al., 2011; VENTURA; SAGI, 2013). Os caules de S. neei apresentam elevado teor mineral (DONCATO; COSTA, 2018a; 2018b) e propriedades bioativas (COSTA et al., 2018; SOUZA et al., 2018).

Nos últimos anos, estudos sobre a S. neei têm destacado a elevada qualidade nutricional e química de suas sementes e brotos, além de seu potencial para o ser humano, especialmente culinária em substituição ao sal de cozinha e as folhas são consumidas cruas (BERTIN et al., 2014; TIMM et al., 2015). Também podem ser utilizadas na dieta de animais (D'OCA et al., 2012; COSTA et al., 2014; BERTIN et al., 2014), na produção de biocombustíveis (D'OCA et al., 2012; COSTA et al., 2014) e no uso pela indústria farmacêutica (BERTIN et al., 2014).

Com base na crescente busca de trabalhos voltados para cultivos de halófitas, suas aplicações, e sua composição bioquímica, objetivou-se neste trabalho avaliar os teores de solutos orgânicos (carboidratos, N-aminossolúveis) e inorgânicos (Na+, K+, Cl-) na Salicornia neei Lag. submetidas a diferentes lâminas de irrigação com água salobra e adubação, a fim de se compreender o comportamento fisiológico desta halófita costeira cultivada em regiões semiáridas.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

Para a realização do experimento, mudas de S. neei foram obtidas a partir de fragmentos de caules vegetativos de plantas coletadas em uma marisma artificial, utilizada para tratamento de efluentes de viveiros de camarão do Centro de Estudos Ambientais Costeiros (CEAC-UFC), propagadas por estaquia e cultivadas em bandejas semeadeiras no laboratório de Ecologia da Universidade Estadual do Ceará. Foram utilizados ramos com bases lignificadas, por apresentarem melhor resposta de brotamento vegetativo.

Após estabilização, as mudas foram levadas para área de cultivo em campo aberto na Fazenda Canafístula, em Ocara-CE (04º29’27”S; 038º35’48”W). O clima da região é tropical seco (Aw), com temperatura média de 26,1 ºC.

Uma área de 400 m2 foi limpa, passou por um processo de aração, e posteriormente foi dividida em quatro unidades experimentais de 100 m2. Cada unidade era constituída de 20 linhas de plantio em sulcos, espaçadas de 0,5 m, com uma densidade de três plantas por metro linear. Para avaliação foi considerada uma linha central como área útil em cada parcela.

Cada unidade experimental recebeu diferentes tratamentos (T) de irrigação e adubação, denominados T1, T2, T3 e T4. A vazão da água para irrigação para os sulcos foi de 300 L.h-1, e cada sulco recebeu um emissor. As áreas T1 e T2 tiveram uma irrigação diária de 30 minutos (0,15 m3/dia) (1), e as áreas T3 e T4, foram irrigadas duas vezes ao dia, por 30 minutos cada (0,30 m3/dia) (2). Os tratamentos T2 e T4 foram adubados com 30g de NPK (10:28:20) por planta, sendo realizada adubação de fundação em sulco com formato semilunar e profundidade de 5 cm. Tendo em vista as médias de temperaturas elevadas da região, houve aplicação de apenas uma dose de adubação no período de acompanhamento do experimento.

Foram realizadas coletas de ramos vegetativos já estabelecidos nas quatro áreas de cultivo (T1, T2, T3 e T4), num total duas amostras por área, coletadas aos 60, 90 e 120 dias após o plantio (DAP).

O plantio foi realizado no início do verão e adentrando na quadra chuvosa no Ceará. Observou-se a ocorrência de precipitação acumulada de 337,9 mm no município de Ocara durante o período de coleta do experimento (Tabela 1).

 

Tabela 1. Dados de precipitação acumulada (mm) em Ocara, CE, durante o período de coleta de dados.

Período (DAE)

Precipitação (mm)

0 – 60

24,2 mm

60 – 90

90,4 mm

90 - 120

223,3 mm

 

O delineamento experimental adotado foi o de blocos casualizados, cujos tratamentos foram arranjados em esquema fatorial, consistindo de 2 níveis de adubação (adubação com NPK 10:28:20 e sem adubação) e 2 lâminas de irrigação (0,15m3/dia x 0,30m3/dia) com 3 repetições.

As plantas foram irrigadas com água salobra classificada como C4Sx obtida em poço profundo na fazenda Canafístula, cujas características químicas foram: condutividade elétrica 4,45 dS.m-1, com salinidade alta (C4), seu teor de Na+ se apresentava elevado (9,9 mmol.L-1) (S1).(Tabela 2).

Amostras de solo de cada tratamento foram coletadas para análise uma semana após o plantio das mudas, sendo coletadas em período intermediário entre as irrigações. Os maiores níveis de Ca, Mg, Fe, Mn e capacidade de troca de cátions (CTC) ocorreram nas áreas com uma irrigação, e pouca variação de pH entre as áreas (7,12 à 7,23) (Tabela 3).

 

Tabela 2. Análise físico-química da água de irrigação na área de cultivo em Ocara, Ceará

Cátions (mmolcL-1)

Anions (mmolcL-1)

CE

SD

RAS

Classificação

Ca2+

Mg 2+

Na+

K+

Σ

Cl-

HCO3-

Σ

dS m-1

MG L-1

 

 

 

15,9

18,2

9,9

0,9

44,9

44,2

0,1

44,2

4,45

4,450

2,39

C4S1

 

CE - Condutividade elétrica; SD - Sólidos dissolvidos; RAS - Razão de adsorção de sódio.

 

Tabela 3. Análise do solo nas áreas de cultivo em Ocara, Ceará

Amostra

pH

Ca

Mg

K

Na

SB

H+Al

CTC

P2O5

Cu

Fe

Mn

Zn

CaCl2

cmolc.dm-3

mg.dm-3

T1

7,15

27,4

39,4

1,4

9,3

77,6

1,7

70,2

13,5

2,9

6,3

50,3

3,9

T2

7,17

33,2

55,7

1,6

10,7

101,2

1,7

102,8

23,9

4,4

7,3

49,4

4,9

T3

7,12

17,9

6,6

1,6

13,5

39,6

1,7

41,3

41,5

1,2

4,5

45,5

3,9

T4

7,23

22,8

30,8

1,2

9,9

55,7

1,7

57,4

37,2

3,5

4,6

45

3,4

T1 – Área com uma irrigação diária e sem adubo; T2 – Área com uma irrigação diária e com adubo; T3 – Área com duas irrigações diárias e sem adubo; T4 – Área com duas irrigações diárias e com adubo; CTC - Capacidade de troca de cátions; SB - Saturação basal.

 

Para mensurar os teores dos solutos orgânicos e inorgânicos presentes na Salicornia neei Lag., após a coleta, os ramos foram lavados com água destilada, em seguida ramos foram secos em papel toalha, embalados com papel alumínio, colocados em compartimento com gelo e transportados para o Laboratório de Fisiologia Vegetal na Universidade Federal do Ceará.

Para a preparação do extrato bruto foram pesadas 0,2 g de S. neei e colocadas em nitrogênio líquido (-169 ºC), sendo depois maceradas. Após maceração, as amostras foram homogeneizadas em água deionizada, distribuídas em eppendorfs e colocadas para centrifugação com rotação de 5.000 g durante 10 minutos a temperatura de 4 ºC. O sobrenadante formado em cada amostra foi transferido para novos eppendorfs e colocados em freezers para conservação.

Para determinação de carboidratos solúveis totais coletou-se 0,5 mL do extrato bruto, devidamente diluído, sendo acrescidos 0,5 mL de fenol (5%) e 2,5 mL de H2SO4 concentrado. Após agitação, a mistura foi colocada em repouso durante 10 minutos, para resfriamento. Posteriormente, os carboidratos solúveis das amostras foram quantificados através de leituras de absorbância em 490 nm. A obtenção da curva padrão de carboidratos se deu com o uso de D(+) glicose anidra (DUBOIS et al., 1956).

Para determinar N-aminossolúveis, foram adicionados 0,5 mL dos extratos brutos em tubos de ensaio, devidamente diluídos, 0,25 mL de tampão citrato (0,2 M, com pH 5,0), 0,5 mL de cianeto de potássio (KCN) (0,2 mM em metilcelosolve 100%), e 0,1 mL de ninhidrina (5% em metilcelosolve a 100%). Os tubos foram fechados, agitados e colocados em banho-maria a 100 ºC durante 20 minutos. A reação foi interrompida com banho de gelo (2 ºC) nos tubos de ensaio. Após resfriamento, foram adicionados 0,65 mL de etanol (60%). Através de leituras de absorbância em 570 nm, os teores de N-aminossolúveis foram estimados baseados em curva padrão preparada a partir de concentrações crescentes de glicina (YEMM; COCKING, 1955).

Os teores de Na+ e K+ foram determinados em fotômetro de chama de acordo com Malavolta et al. (1989). Para a determinação dos teores de Cl-, 3,0 mL do extrato bruto, devidamente diluído, foram adicionados a 0,5 mL da mistura de reação, composta por nitrato férrico [Fe(NO3)3.9H2O] a 20,2%, em água deionizada (4:1), e tiocianato de mercúrio [Hg(SCN)2] a 13,2 mM, em metanol absoluto. Após agitados, os tubos foram colocados em repouso durante 15 minutos. A estimativa dos teores de Cl- foi realizada através de leituras de absorbância em 460 nm, sendo utilizado um tubo com água deionizada como branco, substituindo o extrato (GAINES et al., 1984). Para construir a curva padrão foram utilizadas soluções com concentrações crescentes de NaCl.

Os dados foram submetidos à Análise de Variância, sendo observada a significância pelo teste F e quando significativos, realizou-se o teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade; sendo utilizado o software ASSISTAT versão 7.7 beta (SILVA; AZEVEDO, 2016).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Os tratamentos adubados não diferiram significativamente nos teores de carboidratos solúveis totais entre os dias de coleta. Entretanto, plantas não adubadas mostraram uma redução significativa desses compostos a partir de 90 DAP, ocorrendo interação tempo (DAP) x adubação significativa e aos 120 DAP os tratamentos adubados tiveram teores superiores aos não adubados (Figura 1A).

 

Figura 1. Teores de carboidratos na interação tempo x adubação (A), teores de N-aminossolúveis nas interações irrigação x adubação (B), tempo x irrigação (C), irrigação x tempo com e sem NPK (D).

*Valores seguidos pela mesma letra maiúscula nas colunas de mesma cor nos diferentes tratamentos, e pela mesma letra minúscula nas colunas de cores diferentes no mesmo tratamento não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.

 

Koyro (2006) cita que a capacidade da halófita Plantago coronopus L. de sobreviver em ambiente salino está associada à sua manutenção de níveis elevados de carboidratos solúveis, servindo para o seu ajuste osmótico e na estabilização de estruturas celulares. Esta característica foi observada nos tratamentos adubados do cultivo de S. neei ao se verificar pouca variação dos teores de carboidratos entre os dias de coleta. O que sugere a participação do fator adubação para a manutenção dos teores de carboidratos solúveis totais ao longo do tempo.

O teor de N-aminossolúveis das plantas submetidas a uma irrigação diária sem adubo (350,5 μmol g-1MS) foi superior ao das plantas adubadas com a mesma lâmina de irrigação (193,7 μmol g-1MS) e os demais tratamentos com duas regas diárias, ocorrendo uma interação irrigação/dia x adubação significativa (Figura 1B). Este resultado mostra que os teores teciduais de nitrogênio da S. neei são aumentados sob condições estressantes de cultivo. Compostos nitrogenados quaternários de amônia (glicinabetainas) são os principais osmólitos utilizados por espécies do gênero Salicornia para protegerem suas estruturas protoplasmáticas do estresse salino (DAVY et al., 2001). Este N-amino é um soluto compatível com as atividades metabólicas celulares que pode acumular-se no citosol em situação de estresse salino, equilibrando o potencial hídrico entre os diversos compartimentos celulares (ASHRAF; HARRIS, 2013).

Miranda et al. (2013) observou reduções nos teores de N-aminossolúveis na parte aérea de plantas de sorgo (Sorghum bicolor (L.) Moench), as quais foram submetidas a dois tempos de estresse salino, independente da fonte de N utilizada (nitrato ou amônio). Esta situação é semelhante à observada nos tratamentos com duas irrigações com água salobra, que apresentaram os menores teores de N-aminossolúveis, em relação aos tratamentos com uma irrigação.

Para a interação tempo x irrigação/dia observou-se os maiores teores de N-aminossolúveis nas plantas com uma irrigação aos 120 DAP (337,9 μmol g-1MS), não diferindo significativamente nas datas anteriores. Para os tratamentos com duas irrigações os maiores teores ocorreram aos 60 DAP (325,3 μmol g-1MS), havendo uma redução nas datas de coleta posteriores (Figura 1C).

Na interação irrigação/dia x adubação as plantas com uma irrigação e sem adubo tiveram os maiores teores de N-aminossolúveis aos 120 DAP (485,7 μmol g-1MS), enquanto as plantas com adubo não diferiram significativamente entre os dias de coleta. Os tratamentos com duas irrigações não diferiram significativamente entre as datas de coleta nas plantas sem adubo, enquanto nas plantas adubadas os maiores teores foram aos 60 DAP (360,4 μmol g-1MS) (Figura 1D).

Diversos tipos de solutos podem sofrer elevação dos seus teores em resposta à baixa disponibilidade hídrica. Esta situação foi observada nos tratamentos sem adubo e com uma irrigação, com teores de N-aminossolúveis superiores aos tratamentos com duas irrigações. Foram observados casos de aumentos nos teores de N-aminossolúveis por alguns autores que trabalharam com déficit hídrico em diversas espécies de plantas (BRAY et al., 2015).

Os teores de Na+ das plantas sem adubo foram superiores as adubadas independente da lâmina de irrigação aplicada (Figura 2A) e do dia de coleta (Figura 2B).

 

Figura 2. Teores de Na+ na Salicornia neei observando-se as interações irrigação x adubação (A), os dias de coleta e adubação (B), a variação de teores na interação irrigação x tempo (C).

*Valores seguidos pela mesma letra maiúscula nas colunas de mesma cor nos diferentes tratamentos, e pela mesma letra minúscula nas colunas de cores diferentes no mesmo tratamento não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.

 

Observa-se também que os teores de Na+ nas plantas com uma irrigação foram superiores às com duas irrigações nos tratamentos sem adubo, enquanto as adubadas esta diferença não foi significativa aos 120 DAP (Figura 2C).

Os teores de Na+ tecidual sofreram uma redução justamente nos tratamentos com maior disponibilidade de água salobra (duas regas diárias), além de um decaindo de 265,04 μmol g-1MS para 145,5 μmol g-1MS ao final do período de coleta, quando o cultivo adentrou na quadra chuvosa no Ceará. Consequentemente, a lixiviação dos sais no solo pelo maior volume de rega diária e maior frequência de chuvas parece ter sido um fator determinante das diferenças observadas em S. neei. Estes resultados são compatíveis com o aumento de Na+ tecidual em outras espécies de Salicornia a medida que a salinidade do ambiente de cultivo aumentava (DAVY et al., 2001) e o observado por Parida e Jha (2010), que avaliando o efeito de diferentes concentrações de soluções salinas com NaCl (0 a 600 mmol L-1) em cultivo da halófita Halosarcia indica (Willd.) Paul G.Wilson observaram que o conteúdo de sódio com base na matéria seca (MS) variou de 59,2 a 189,27 mg g-1, demonstrando uma relação do Na+ diretamente proporcional a concentração de NaCl na água. Sousa et al. (2010a) e Freitas et al. (2011) também observaram aumentos nos teores de Na+ em plantas de sorgo submetidas a níveis crescentes de salinidade.

Os teores mais elevados de Na+ ocorreram nas plantas irrigadas uma vez ao dia, e sem adição de adubo, apresentando teores de Na+ constantes ao longo do tempo de monitoramento. Este resultado difere dos resultados observados por Leal et al. (2008), em cultivo de Atriplex nummularia Lindl. com adição de gesso nos tratamentos, que observou que os teores de Na+ na folha tenderam a se elevar ao longo do tempo de cultivo.

Quanto aos teores teciduais de K+ das plantas de S. neei, os valores médios foram mais afetados pela data de coleta do que pela adubação com NPK. O teor de K+ nas plantas do tratamento sem adubo e com uma irrigação (51,7 μmol g-1MS) foi superior ao irrigado duas vezes também sem adubo (30,5 μmol g-1MS). Nos tratamentos adubados, o teor de K+ nas plantas com duas irrigações foi superior (33,8 μmol g-1MS) as com uma irrigação (27,9 μmol g-1MS) (Figura 3A). Os teores de K+ nas plantas sem adubo não diferiram estatisticamente entre os dias de coleta, enquanto as plantas adubadas tiveram os maiores teores aos 120 DAP (39,2 μmol g-1MS). Os teores de K+ das plantas sem adubo foram superiores às adubadas aos 60 e 90 DAP, não diferindo aos 120 DAP (Figura 3B).

 

C

 
Figura 3. Teores de K+ na Salicornia neei observando-se as interações tempo x adubação (A) e irrigação x adubação (B); e teores de Cl- na interação irrigação x tempo (C).

*Valores seguidos pela mesma letra maiúscula nas colunas de mesma cor nos diferentes tratamentos, e pela mesma letra minúscula nas colunas de cores diferentes no mesmo tratamento não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade

 

Pereira Filho (2018) observou que no cultivo de feijão-caupi (Vigna unguiculata (L.) Walp.) em diferentes concentrações de sais e frequência de irrigação os teores mais elevados de K+ ocorreram nas folhas em condições de menor disponibilidade hídrica, sendo tal característica semelhante à observada no tratamento sem adubo e com uma irrigação nesta pesquisa.

Pode-se observar que os teores de Na+ e K+ presentes na S. neei foram maiores nos tratamentos sem adubação e submetidos a uma irrigação diária. Esta relação Na+/K+ é alta em Salicornia e cujo aumento de valor pode indicar um maior estresse salino. Vale ressaltar que os maiores valores de SB e CTC (Tabela 2) nos tratamentos de uma rega diária foram, respectivamente, 79-87% e 82-96% maiores do que nos com duas regas diárias. Sendo esta diferença possivelmente associada ao acúmulo de sais no terreno. Medina et al., (2008), verificando o halofitismo em diferentes espécies vegetais, analisou que plantas de espécies suculentas identificadas como halófitas favorecem o acúmulo de Na+ em relação ao acúmulo de K+. Deste modo, a capacidade de acumular K+ em ambientes com salinidade mais elevada neutraliza efetivamente a toxicidade citoplasmática do Na+ (BRECKLE, 2002).

Para a interação tempo (DAP) x irrigação/dia, os teores mais elevados de Cl- nas plantas irrigadas uma vez ao dia ocorreram aos 90 DAP (10,8 μmol g-1MS). As plantas com duas irrigações não diferiram significativamente entre os dias de coleta. Comparando-se as médias observa-se que somente aos 90 DAE as plantas com uma irrigação tiveram valores significativos superiores aos tratamentos com duas irrigações (Figura 3C).

Para as plantas adubadas, os teores de Cl- não diferiram significativamente entre os dias de coleta nos diferentes tratamentos com salinidade mais (T1 e T2) e menos elevadas (T3 e T4). Este resultado difere de Sousa et al. (2010b) cultivando milho com água salina, que observaram que ao aumentar a concentração salina na água de irrigação, aumentou-se os totais extraídos de cloreto, além de ferro e manganês.

Os resultados observados nos teores de Cl são semelhantes e compatíveis aos teores de Na+. Com apenas uma irrigação por dia até 90 DAP a salinidade do solo permanece mais alta, levando a mais absorção de Na+ e Cl- pelas plantas do que no tratamento de duas regas diárias. Entre 90 e 120 DAP houve maiores ocorrências de precipitações, e consequentemente os teores Na+ e Cl- permanecem mais baixos e semelhantes entre áreas irrigadas 1 e 2 vezes.

 

CONCLUSÕES

 

Os solutos orgânicos e inorgânicos presentes na S. neei aumentaram seus teores nas plantas que foram submetidas a menor lâmina de irrigação com água salobra;

A adubação e/ou maior volume de irrigação contribuiu para a redução dos teores dos referidos solutos orgânicos e inorgânicos, bem como, sua manutenção ao longo dos dias de coleta, durante as estações de estiagem e chuvas.

 

AGRADECIMENTOS

 

À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP), pela concessão da bolsa de Mestrado ao primeiro autor. Ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Salinidade – INCTsal, pelo apoio financeiro na execução do projeto. Ao Laboratório de Fisiologia Vegetal da Universidade Federal do Ceará, pelo apoio nas análises realizadas. À Universidade Estadual do Ceará, na disponibilização do transporte ao local da pesquisa. Ao Sr. Haitzen, proprietário da Fazenda Canafístula em Ocara-CE, pelo apoio e disponibilização da área para o cultivo.

 

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